2017-07-10 17:44:00

Mali: terra de pobreza e migração, mas também de oportunidades


Não apenas terra de tensões, pobreza e migrações, mas também de novas oportunidades de crescimento. É o Mali que, após o acordo de paz de 2015, procura uma nova ordem política e social, começando com os jovens.

Muitos deixam o seu País, percorrem  milhares de quilómetros, atravessando o deserto e as fronteiras da Argélia e Líbia, antes de tentar a via para a Europa em barcos improvisados, quase sempre controlados pelo crime organizado, que atravessam o mar no Mediterrâneo. E não sabem se vão chegar. São os jovens do Mali, um dos Países mais pobres do mundo, com mais de 43% da população – segundo os dados do Banco Mundial, citados pela Organização Internacional para as Migrações (OIM) - abaixo da linha de pobreza, sobretudo nas zonas rurais. Os últimos anos foram marcados pela violência e tensões, sobretudo no norte do País, com uma forte presença Tuaregue. Em janeiro de 2013, uma força multinacional guiada pela França interveio para restaurar a soberania de Bamaco nos territórios do Sahara setentrional. Mas a instabilidade, devido também aos últimos e sangrentos actos de grupos jihadistas, não foi ultrapassada: na última quinta-feira foram três as vítimas assinaladas no nordeste. Disso nos fala Vincenzo Giardina, enviado da agência de imprensa 'Dire' no Mali:

"O Mali é um País que tem uma história de desequilíbrios e revoltas. O conflito civil que eclodiu e foi retomado em 2012 também assumiu a forma do avanço de grupos islâmicos, aqueles que nas últimas semanas têm reivindicaram ataques contra a missão dos Capacetes Azuis das Nações Unidas e emboscadas como a do Campement Kangaba de 18 de junho, às portas de Bamaco, um Hotel de luxo frequentado por franceses ou ricos malianos. Estes grupos ganharam força em regiões onde há um forte componente Tuaregue e árabe, minorias a nível nacional: naquelas regiões – penso nas zonas de Timbuktu, Kidal e Gao – o relacionamento com o poder central de Bamaco sempre foi complexo e, portanto, trata-se de contextos que, entre 2012 e 2013, favoreceram a entrada de elementos estrangeiros que, em seguida, se identificaram com movimentos internacionais como  al Qaeda”.

Este País da África Ocidental tenta agora aplicar o disposto no acordo de paz entre as autoridades em Bamaco e os Tuaregue, alcançado em 2015 em Argel. Mas nas últimas semanas, milhares de malianos foram às ruas contra o projecto de revisão da Constituição, aliás previsto nos acordos, para em seguida ser submetido a um referendo. Ultimamente o Tribunal Constitucional pediu uma mudança para o tal projecto de reforma. Ainda Vincenzo Giardina:

"Procura-se garantir o espaço necessário para a aplicação dos acordos de paz de Argel. A criação do Senado - até à data no Mali existe apenas a Câmara Baixa - deveria, de facto, garantir aquelas posições que permitiriam a integração, a nível nacional, nas estruturas políticas do País, dos representantes da ex-rebelião tuaregue. Evidentemente, porém, existe parte da sociedade civil, bem como partidos da oposição, que contestam as modalidades desta reforma, em particular o direito que o presidente teria de nomear os membros do Senado, interpretando esta passagem como um fortalecimento indevido do poder do presidente. Note-se que aos 17 de junho, em Bamaco, realizaram-se importantes manifestações que levaram o presidente Ibrahim Boubacar Keïta a adiar sine die, para uma data a designar, a consultação do referendo, precisamente porque muito contestada”.

Neste contexto, ao lado da população, trabalham várias ONGs, da 'Terra Nova' à 'Iscos', com projectos de desenvolvimento rural, para a segurança alimentar e a criação de rendimento, possíveis alternativas às migrações. O Maliano Abdoulaye Diarra é mediador cultural de Terra Nova em Bamaco:

“Nós nos ocupamos principalmente de duas actividades. A criação de actividades para permitir aos jovens, potenciais candidatos à emigração, de encontrar um pequeno trabalho e criar assim um rendimento. E também nos ocupamos de cursos de formação sobre tudo o que está relacionado com as migrações, o que acontece na Europa, no Mali e ao longo das rotas migratórias”.

Existe uma nova lei no Mali que empenha a confiar a cultivadoras e a cooperativas para mulheres entre 10 e 15 por cento dos terrenos do Estado. Isto está já a acontecer? Poderia ser uma alternativa às migrações?

Poderia, sim, ser uma alternativa. Mas sabemos que muitas mulheres que se encontram longe das grandes cidades não conhecem esta lei e, portanto, corre o risco de ser uma lei que não passa do papel, difícil de implementar na prática.

Falando precisamente com jovens, rapazes e raparigas, o que emerge? Porque decidem de emigrar?

Existem várias causas. A principal delas é a segurança: a maior parte dos rapazes parte porque vê que no lugar onde vive já não existe segurança para a própria vida, existem conflitos armados. Uma outra coisa importante que leva os rapazes a tentar a via da migração é a falta de perspectivas, porque uma pessoa pode estudar, chegar ao liceu, ir à universidade e, no fim, não consegue encontrar trabalho. Mas depois estão os rapazes que não foram à escola, não têm nenhuma perspectiva para o futuro, porque os políticos, por vezes, não prevêem medidas sobretudo para estes jovens que vivem longe das grandes cidades.

Pode dar-nos um exemplo? Um projecto vosso que ajudou um jovem, um rapaz a não partir?

O nosso projecto ajudou vários rapazes a não partir. Por exemplo, eu rodei pelas cidades: ajudámos os rapazes a criar actividades. Uma particular actividade foi financiada através de projectos de microcrédito. Um rapaz desta forma conseguiu comprar algumas vacas, animais para a reprodução: e assim renunciou de partir. Um outro exemplo: ajudámos um outro rapaz a levantar o seu próprio negócio de jardinagem: conseguiu comprar um pequeno motor para extracção de água, de modo a irrigar a sua pequena horta. E assim ele pôde cuidar da sua família e decidiu não partir. São pequenas coisas, mas que ajudam muito. É realmente importante que as pessoas percebam que, em todo caso, no Mali há muitas oportunidades, porque aquilo que a gente considera pouco - cem euros, duzentos euros – aqui não é pouco! Portanto, pode-se fazer muito para ajudar estes jovens a não tentar a aventura. (BS)








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