A viagem do Papa ao Egito e a de São Francisco em 1219, de Pe. Enzo Fortunato


Assis (RV) - Nos dia 28 e 29 de abril o Papa irá ao Egito, onde fortalecerá, com sua proximidade, a comunidade cristã local, que representa apenas 10% da população. Francisco também encontrará o Grão Imame de Al-Azhar, Ahmed al-Tayyeb e o Presidente do país Abd al-Fattāḥ al-Sīsī.

Neste contexto, o Diretor da Sala de Imprensa do Sacro Convento de Assis, Padre Enzo Fortunato, escreveu o artigo "A viagem do Papa ao Egito e a de São Francisco em 1219" -  publicado no "Corriere della Sera" - onde traça um paralelo entre a iminente viagem do Pontífice e aquela realizada pelo Santo de Assis há 800 anos.

"A próxima viagem do Papa ao Egito em um contexto de tensões diplomáticas, de guerras e de atos terroristas, nos traz à mente uma outra. A de São Francisco. No mês de junho de 1219, Francisco de Assis embarcou para o Oriente e, chegando em Damieta, encontrou o Sultão do Egito Melek-al-Kamel, sobrinho de Saladino, nome com o qual é conhecido no Ocidente Salh al-Din, o fundador da Dinastia Ayubbide e Sultão do Egito e da Síria nos últimos decênios do século XII. Foi ele que conquistou Jerusalém em 1187. É lembrado por ser não somente um grande líder, mas também por ter sido um hábil político, conseguindo chegar a um acordo com as forças cristãs derrotadas na Palestina.

Mas poderia surgir uma pergunta quase que espontaneamente: Francisco e o Sultão realmente encontraram-se?

Fontes franciscanas - e não só - confirmam isto: a Historia occidentalis do Bispo de São João do Acre, Giacomo da Vitry; o cronista Ernoul, que deu sequência à Crônica de Guglielmo di Tiro; o cronista Bernardo, o Tesoureiro; e por fim a epígrafe funerária de Fakhr ad-Din Muhammad ibn Ibrahim Fârîsi no cemitério de Qarâfa, no Cairo, que faz alusão à Francisco. Estes testemunhos confirmam o de Tommaso da Celano e o de Giordano da Giano e de Bonaventura, sobre os quais poderia recair a suspeita de terem criado a história do encontro por razões e fins internos à Ordem e relativas a sua imagem.

O que em seguida amadureceu em Francisco, além do claro repúdio à cruzada e às formas belicosas, está no texto da Regra não aprovada de 1221 e revista e aprovada pelo Pontífice em 1223, onde diz de que modo o franciscano deve ir entre os sarracenos: ≪Por isto, qualquer frade que tiver de ir entre os Sarracenos [...], que vá com a permissão de seu ministro e servo. O ministro, então, dê a eles a permissão e não crie onstáculos se constatar que são idôneos em serem enviados; de fato deverá prestar contas ao Senhor (Cfr. Lc 16,2), se nestas, como em outras coisas, tiver agido sem discrição. Que os frades, então, que irão entre os infiéis, possam comportar-se espiritualmente em meio a eles de dois modos. Um modo é que não provoquem brigas ou disputas, mas sejam submissos a toda criatura humana por amor a Deus (1 Pd 2,13) e confessem serem cristãos. O outro modo é que quando verem que agrada ao Senhor, anunciem a palavra de Deus≫.

Estes comportamentos ditados por Francisco indicam as duas linhas mestras de seu pensamento: a da presença e a do testemunho. Não é o caminho da imposição, mas o da contaminação. Francisco era um homem de paz: o que ele sonhava, o demonstrou com a vida e em todos os modos, chegando até o Sultão e anunciando a ele a paz de Cristo, que não é aquela que o mundo dá. Não estava ali somente pelo Sultão, mas também pelos cruzados, que tinham uma extrema necessidade de exemplos de vida cristã. Presença e testemunho: estas as límpidas linhas espirituais e históricas de um gesto que não abre caminho para mal-entendidos. Caso se saia destas concretas e claríssimas coordenadas interpretativas - observa o historiador Franco Cardini - se fará somente conversações inúteis.

E é por este caminho que se move agora o Papa Francisco. Uma viagem que desperta a máxima atenção da família franciscana. Este encontro abre simbolicamente os 800 anos de aniversário do aperto de mão, do abraço entre cristãos e muçulmanos. Um encontro que parece calar-se, infelizmente, em uma "nova Idade Média", em que se cortam cabeças e se combate em nome de Deus. Nós não queremos cair de novo na Idade Média, mas queremos abrir as portas e percorrer os caminhos ancorados no diálogo e no respeito recíproco".

(Corriere  della Sera - JE)








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