Piquiá de Baixo: as parcerias e o apego à terra nativa


Cidade do Vaticano (RV) - Imaginem se fossem instalados 14 fornos de carvão vegetal para alimentar 5 siderúrgicas, bem ao lado de sua casa. Foi o que aconteceu, há alguns anos, no bairro de Piquiá de Baixo, em Açailândia, estado do Maranhão. As 300 famílias moradoras começaram a conviver em meio à fumaça tóxica, resíduos minerais, poluição sonora e poeira. Dificuldade para respirar, ardência nos olhos, problemas na pele e na saúde em geral passaram a fazer parte de seu cotidiano.   

A moradora Joselma Alves de Oliveira, uma das lideranças da comunidade na batalha para a sua sobrevivência saudável, trouxe o caso até a Europa. Depois de apresentá-lo nas Nações Unidas, em Genebra, e no Instituto de Tumores de Milão, ela esteve no Vaticano e prossegue o seu relato. Ouça:

“No Brasil, a nossa comunidade é uma das primeiras a fazer este processo de luta. Não sabemos como fazer nada, tivemos que aprender tudo. Precisamos de muitos parceiros para nos ajudar. A nossa luta iniciou assim, com 21 famílias. Tinha uma guseira que ficava bem próximo de suas casas. Elas se mobilizaram para entrar na justiça contra uma destas empresas, que ficava bem perto (10 metros, 30 metros). Elas chegaram e se colocaram atrás da gente e começaram a poluir. Estas 21 famílias olharam e ‘isto não tá certo, vamos nos mobilizar’. Entraram com a ação contra a empresa e depois viram que não eram só 21 famílias, era o bairro todo. Assim começou a Associação de Moradores de Piquiá de Baixo, na figura de nosso Presidente, Sr. Edgar Cardeal, que acabou de ser reeleito no final de fevereiro”.

“Assim começou todo este processo, começaram a se organizar. Procuraram o Centro de Defesa de Direitos Humanos de Açailândia, a paróquia Santa Luzia, os combonianos... E com o passar do tempo, fomos achando mais parceiros: Igreja e Mineração, Justiça nos trilhos, Justiça global... pessoas que nos apoiam e nos auxiliam para aprendermos a se organizar melhor como comunidade. Nunca tomam decisões por nós, mas nos orientam. As decisões são sempre da comunidade. Eles nos apoiam com meios para poder realizar as atividades. A luta é da comunidade, mas com muitos parceiros a quem a nossa comunidade só tem a agradecer: a Igreja, as entidades, todos os que têm interesse pela nossa história, pela nossa luta”.

O governo não tem interesse em ajudar a comunidade, em fazer com que as pessoas tenham laudos médicos. A empresa é mais importante, então orientam os médicos a não dar laudos, a não falar ‘você está doente por causa da poluição... é difícil conseguir provas, documentos para poder fortalecer a nossa luta”.

“Temos que lutar não só por uma moradia melhor, mas também por recompensações porque se você tem sua casa, seu modo de vida, sua cultura, depois de muitos anos no mesmo lugar, na mesma comunidade... Hoje, tenho muita vontade de sair do Piquiá, mas tem horas que paro e penso: ‘e quando eu sair daqui?’. Eu nasci neste local! Então, é toda uma história, um vínculo... de uma certa forma, queremos se reassentados porque não consegue viver mais lá, mas também tenho um certo amor por esta localidade... é complicado... mas é assim...”.  

(CM)

 








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