Munib Younan: O diálogo é o futuro. Papa compreendeu isto


Amã (RV) - "Lund foi uma daquelas experiências que mudam a vida". Agora, no entanto, "é importante que este diálogo não seja vivido somente em Roma e em Genebra", mas "chegue às comunidades locais".

É o que defende o Presidente da Federação Luterana Mundial, Munib Younan, ao recordar o histórico encontro ecumênico vivido na Suécia com o Papa Francisco, "meu irmão em Cristo".

Ao participar nos dias passados, em Florença, do Simpósio "Reler a Reforma", Younan, Bispo da Igreja Luterana na Jordânia e na Terra Santa, concedeu uma entrevista ao Jornal L'Osservatore Romano.

OR: O que representa o diálogo ecumênico para a Federação Luterana Mundial?

"Para os luteranos o ecumenismo é o centro da própria vida de fé; por isto a Federação promoveu diálogos bilaterais com a Igreja Católica, a Igreja Ortodoxa, as Igrejas reformadas e os anglicanos, e das conversações com os pentecostais, os batistas, um percurso penitencial com os menonitas. O ecumenismo não é somente, porém, um debate teológico para entender como superar as divisões. Deve mudar o rosto da comunidade, deve penetrar em profundidade na experiência cotidiana de cada cristão. Uma das questões abertas é a recepção do quanto se fez do ponto de vista do diálogo teológico precisamente na vida cotidiana: o espírito de Lund pode ajudar os cristãos a descobrir que o ecumenismo é viver Cristo juntos para enfrentar conjuntamente os desafios que são os mesmos para todos os cristãos".

OR: Quais serão os temas da próxima Assembleia Geral da Federação que terá lugar em Windhoek, na Namíbia, de 10 a 16 de maio?

"A cada sete anos a Federação Luterana Mundial realiza uma Assembleia Geral onde são discutidas as linhas guias para os anos sucessivos. É um momento importante porque os luteranos de todo o mundo se encontram para compartilhar as experiências das comunidades locais. Este ano falaremos da Reforma, que constitui um patrimônio espiritual que diz respeito a todos os cristãos, não somente os luteranos, para refletir sobre o fato que fomos "libertados pela graça de Deus", tema da Assembleia. Em Windhoek serão três os pontos a serem debatidos: o primeiro é recordar a todos que a salvação é gratuita e não pode ser adquirida de nenhum modo; deve-se fugir da ideia de que a prosperidade do indivíduo é um caminho que conduz à salvação, como alguém pode ser tentado a dizer lendo alguma página das Sagradas Escrituras. O segundo aspecto diz respeito à dignidade do homem: não se pode aceitar a pobreza, a escravidão, a negação dos direitos humanos, entre os quais a liberdade religiosa; os cristãos devem colocar no centro o respeito por cada homem e por cada mulher, condenando qualquer ato de violência e de marginalização. O terceiro ponto diz respeito à salvaguarda da criação: nos encontramos em um ponto de "não retorno", como repetem tantos cientistas; depois dos acordos firmados em nível internacional, as Igrejas devem trabalhar para inverter a rota na exploração da criação de forma a interferir nas mudanças climáticas em andamento. Não se trata de algo que diz respeito somente a luteranos ou católicos, mas a todo o mundo: construir a paz e a justiça partindo da salvaguarda da criação, é uma tarefa que deve envolver a todos".

OR: Como estão as relações entre a Federação Luterana Mundial e a Igreja Católica após o encontro ecumênico em Lund?

"Lund foi uma daquelas experiências que muda a vida: foi importante vivê-la depois da redação do documento "Do conflito à comunhão", que ajudou luteranos e católicos a buscar sempre os pontos de convergência a partir daquilo que já nos une; o documento indica cinco imperativos que devem guiar o caminho ecumênico, que parte do comum reconhecimento do único batismo em Cristo. No presente do caminho ecumênico entre luteranos e católicos, adquire uma valência profética a diaconia em relação ao mundo, porque testemunha o empenho comum em favor dos últimos. Lund foi possível, porque há cinquenta anos católicos e luteranos iniciaram um diálogo ecumênico que produziu documentos, mas sobretudo fez crescer confiança e amizade; agora é importante que este diálogo não seja vivido somente em Roma ou em Genebra, mas chegue às comunidades locais. Nos próximos meses serão debatidas as questões que ainda separam luteranos e católicos; se falará da eclesiologia, da natureza do ministério e da comunhão eclesial. Neste diálogo pesa o passado de séculos de silêncio. O nosso passado não pode ser mudado, mas não deve determinar o nosso presente e o nosso futuro. Eu estou seguro de que um dia estas divisões poderão ser superadas e se poderá partilhar o pão da mesa eucarística: tal caminho não depende de nós, mas está nas mãos de Deus".

OR: A seu ver, como os cristãos estão vivendo a comemoração dos 500 anos da Reforma?

"Existem três níveis para comemorar este aniversário: dar graças a Deus, juntos, recordando-se de que isto nunca havia sido feito antes; arrepender-se de nossos pecados e de nossas divisões, sabendo assim que nós podemos ver Cristo na face do outro; viver este aniversário em um espírito ecumênico, isto é, de promover uma missão compartilhada no mundo, sobretudo no sul do mundo, onde as situações de pobreza são mais difundidas. Comemorar juntos a Reforma significa, assim, o que a Reforma diz a cada um de nós, sabendo bem que ela não se encerrou no século XVI, mas permanece viva no espírito da expressão ecclesia semper reformanda que evoca a dinamicidade de Cristo, o qual nos convida para enfrentar os desafios presentes. Concordo com o Papa Francisco quando pede de levar "o púlpito para as ruas", de modo a dirigir-se a todos: o mundo tem necessidade da Palavra de Deus em um tempo em que se difunde sempre mais a secularização e se experimenta a ausência de lideranças mundiais".

OR: Qual a sua opinião sobre a situação na Terra Santa?

"Neste momento não sou otimista, a paz parece distante, nos últimos dias a solução dos dois Estados foi colocada em discussão. Não existe outro caminho que o do diálogo: a cidade de Jerusalém não deve ser dividida, mas compartilhada, tornando-se lugar de diálogo. Temo também pelos cristãos no Oriente Médio, pela tentação de deixar tudo e partir para outro país; diante desta tentação, que já levou tantos cristãos a partir, se deve perguntar o que seria do Oriente Médio sem cristãos. Justamente para tentar inverter a rota, se deve promover a justiça com a qual reafirmar os direitos humanos e a liberdade religiosa para todos. Os cristãos de todo o mundo devem sentir-se responsáveis pela sorte dos cristãos na Terra Santa. Para isto devem apoiar espiritualmente e materialmente os fieis que com a sua presença podem ajudar à construção da paz".

OR: O que os cristãos podem fazer pela paz?

"A paz não é uma questão que diz respeito somente à Terra Santa. Em todo o mundo a paz é colocada em discussão, também pelo aparecimento de tantos políticos que atiçam as chamas das divisões em nome de um interesse pessoal e local, ignorando o bem do mundo. O egocentrismo é um dos pecados mais terríveis no mundo presente. Os cristãos devem sempre ter presente que a construção da paz é uma tarefa que foi confiada a eles por Deus. Diante de tal situação, a Igreja deve fazer alguma coisa: deve se tornar a consciência dos Estados, assumir uma liderança moral, falando de justiça em alta voz, sem ter medo. A Igreja deve e pode fazê-lo muito mais do que os cristãos fizeram até agora, mesmo porque, em 2017, a Igreja deve ser "uma" ao pedir justiça, fazendo-se ouvir pelo mundo da política com uma única voz".

OR: O que fazer pelos refugiados e migrantes?

"Considero uma vergonha a política dos países europeus que se recusam em acolher os migrantes. É uma vergonha por dois motivos: depois da II Guerra Mundial, toda a Europa viveu a tragédia dos migrantes e a Europa tem responsabilidades precisas nas crises que sacodem o mundo, forçando homens e mulheres a fugir de seus países, da Síria à Somália, ao Sudão do Sul. Nesta perspectiva é importante o documento "Dar as boas-vindas aos estrangeiros", que foi firmado por tantos líderes religiosos, que assim, quiseram dar uma resposta a um pedido do Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas, pedindo à política para fazer alguma coisa por uma acolhida diferente dos migrantes. Eu mesmo sou um refugiado e entendo bem o que significa buscar uma vida, uma dignidade de vida. No mundo, os luteranos assistem amais de dois milhões de migrantes sem pedir nada; nisto existe uma profunda sintonia. Deve-se condenar a islamofobia, o antissemitismo, a cristianofobia, a xenofobia, que não ajudam a construir uma cultura de acolhida que é uma resposta a Deus. Quem der um copo de água, não uma garrafa, terá parte no Reino de Deus".

OR: O que o senhor pensa sobre o emprenho do Papa Francisco e de seu envolvimento pessoal no movimento ecumênico?

"Antes de tudo, acredito que tenha sido importante recordar que João XXIII, com o Concílio Vaticano II, abriu uma nova estação que foi levada em frente pelos seus sucessores. Tive a alegria de encontrar João Paulo II, Bento XVI e o Papa Francisco, fazendo a experiência do quanto estava em seus corações, não somente o caminho ecumênico, mas a promoção do diálogo com todos. Papa Francisco, meu irmão em Cristo, recorda que caminhando juntos, os cristãos são mais fortes no anunciar Cristo. O diálogo é o futuro: Papa Francisco compreendeu isto, o faz e o encarna. No diálogo e com o diálogo, os cristãos são chamados a viver juntos a paz, a justiça, a salvaguarda da criação, o amor".

(L’Osservatore Romano – JE)








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