2016-12-22 18:53:00

Bispos da RDC procuram amplo consenso socio-politico para o país


Depois do apelo lançado domingo a favor duma transição pacífica na RDC (República Democrática do Congo), o Papa Francisco voltou, nesta quarta-feira, a convidar à reconciliação todos aqueles que têm responsabilidades políticas no país. Convidou-os a ouvirem a voz da própria consciência e a verem os cruéis sofrimentos dos seus compatriotas e a terem a peito o bem comum.

Este novo apelo do Papa veio na sequência das notícias, segundo as quais as violências desencadeadas em Kinshasa, Lumbumbashi e outras cidades do país nos dias 19 e 20 de dezembro, levaram à morte de pelos menos 26 pessoas. No entanto, o porta-voz do Governo Lambert Mende, fala de “9 mortos em Kinshasa e nenhum mais”.

Na base das desordens na RDC está o facto de a 19 de dezembro ter terminado o mandado presidencial de Joseph Kabila, no poder há 15 anos, e de ele não ter feito nada para organizar as eleições no tempo devido. Antes pelo contrário, procura adiá-las - segundo a oposição - para ter tempo de modificar a Constituição e voltar a candidatar-se. De momento as eleições foram adiadas para 2018, alegadamente por problemas financeiros e logísticos.

Segundo a ANGOP o país está mergulhado numa crise politica desde a questionada reeleição de Kabila em 2011, numa votação que terá sido marcada por fraudes.

Desta vez oposição e população estavam decididas a embargar a recandidatura de Kabila e vinham já desde há algum tempo a manifestar este desejo. Previam-se, portanto, manifestações de protesto na quadra do fim do mandato, o que levou aos mortos destes dois dias.

Os bispos católicos estão empenhados desde o passado dia 8 numa mesa de negociações, procurando levar as diversas partes a chegar a um amplo consenso para a saída da crise. Colóquios que foram retomados quarta-feira 21, como aliás referia em entrevista, realizada pelo P. Jean-Pierre Bodjoko da nossa Emissora RV, D. Marcel Utembi Tapa, Presidente da CENCO, Conferência Episcopal Nacional do Congo. Ele foi recebido segunda-feira 19, juntamente com o vice-presidente, D. Fridolin Ambongo Besengu, em audiência pelo Papa Francisco.

“Viemos ao Vaticano para encontrar o Papa e partilhar com ele as preocupações da Igreja católica na RDC e que são também as preocupações do povo congolês acerca da crise sócio-política que o país atravessa actualmente. Tivemos ocasião de trocar ideias com o Santo Padre sobre esta questão”.

- O que é que o Papa vos disse? , se não é um segredo!

“Devo dizer que depois das informações que lhe demos e que ele ouviu com atenção, o Santo Padre manifestou a sua grande preocupação em relação à situação política do país e encorajou-nos na missão dos bons ofícios que a CENCO está a levar a cabo desde há algum tempo, quer dizer reunir, à volta duma mesa para negociar directamente, os actores políticos e as forças vivas da sociedade congolesa, a fim de que juntos possam chegar a um amplo consenso em volta das principais questões que dividem hoje o país e que estão na base desta crise sócio-política.”

- O Papa está atento e domingo 18 lançou um apelo e pediu orações  para que o diálogo político se desenvolva com serenidade de modo a evitar violências. Qual é a situação real no país?

“Apreciamos muito a solicitude pastoral do Papa sobre a RDC e ele segue pessoalmente e de perto o que se passa no país, não só em Kinshasa, mas também nas diferentes partes do país. E consideramos que este apelo chega num bom momento e recomendamos ardentemente aos congoleses que abram os corações para fazer ressoar este apelo do Papa que convida a agir  a favor da paz e aos diversos delegados a unirem os esforços para agarrar esta última oportunidade que oferece a CENCO na procura de soluções com vista num amplo consenso e sair da crise politica, quer dizer, organizar as eleições de forma tranquila, democrática e transparente num prazo razoável, e, em princípio consideramos que no espaço de um ano, daqui até fins de dezembro de 2017 as eleições possam ser organizadas. É só questão de  reunir todos os esforços e pôr à disposição  os meios necessários para se chegar a isso.

Convidamos os diferentes delegados que participam nesta negociação directa pilotada pela CENCO a dar provas de muita boa vontade, como têm feito até agora, mas também a dar-se conta de que em questões de negociação tem-se a ver com concessões mútuas no interesse superior da Nação. É este o apelo que lançamos a todos os que participam neste encontro que relançaremos no nosso regresso ao país, quer dizer a partir de quarta-feira, 21 de dezembro, continuamos as negociações com os actores políticos”.

- Estas negociações que inicialmente deveriam durar três dias, prolongaram-se, houve pausas e, agora, esta quarta-feira, 21. E  como já teve ocasião de dizer, as coisas sérias do país não se discutem em pouco tempo. Como vê a continuação desse diálogo, pode ainda durar muito tempo? Há ainda muitas controvérsias que exigem muito tempo – quanto - para serem resolvidas?

“Há claramente temas que opõem uns aos outros, mas consideramos que se pensarmos nos interesses superiores da Nação, se pusermos isto no centro das preocupações, em princípio, em poucos dias poderemos chegar a uma boa aterragem, quer dizer, chegar ao consenso para estancar a crise que, na realidade, já durou demasiado”.

- Quando foi começado o diálogo, havia ainda um pouco de tempo antes do fim do mandato do Presidente Joseph Kabila mas, agora, é o fim do mandato e a situação que se vive é uma situação de medo da parte da população que vê polícia e exército por todo o lado, sente-se sem liberdade de manifestar, as redes sociais são cortadas, a situação é tensa na capital; no leste verificaram-se mesmo tiros, detenções em Goma e chegam-nos mensagens de jovens que dizem estar prontos a tudo e não sentem que estas negociações políticas lhe dizem respeito porque não podem fazer ouvir a sua voz... Como vê tudo isto, excelência?

“Não podemos senão deplorar e mesmo condenar as várias atrocidades e as restrições dos direitos humanos, das liberdades fundamentais que parecem residir no nosso país, especialmente neste período. Os direitos humanos são invioláveis e todos devemos respeitá-los, um país democrático deve respeitar os direitos humanos. Isto é muito importante; isto duma parte e doutra, mas a responsabilidade maior recai sobre aqueles que são chamados a gerir a coisa pública, isto é: os governantes são chamados a assumir plenamente a sua responsabilidade, sabendo que o povo congolês é o património mais inviolável que devemos proteger. Então aproveitamos esta ocasião para convidar os actores políticos, de modo particular os governantes, a promoverem os direitos humanos, os direitos do povo congolês. Se se está no poder ou se se procura aceder ao poder, é para estar ao serviço desse povo que sofre actualmente.

Lamentamos esta situação e convidamos todos à esperança e se todos nós nos empenharmos com boa vontade, podemos encontrar soluções. Nada é impossível a Deus para quem reza, para quem dá provas de boa vontade; acho que há maneira de encontrar boas soluções para essa crise que afecta o país. Convidamos, portanto, todos a empenhar-se na procura de soluções pacíficas”.

- Pois, precisamente, como pastor, como arcebispo de Kisangani, como Presidente da CENCO quer dizer algo a respeito dessa confiança posta nos bispos católicos do país para a saída desta crise? É uma grande responsabilidade conduzir com êxito estas negociações?

“Efectivamente, é uma grande responsabilidade que aceitamos no espírito da Igreja, da fé, com humildade, contando sempre com graça e a bênção divina. E gostaria de convidar o povo congolês a fazer desse tempo que estamos a viver, a festa do Natal, em que o Deus feito homem vem para nos salvar e o Menino que nasceu nos traz alegria, paz - tal como um nascimento em qualquer família humana traz reconciliação se há divisões, traz paz e alegria - que este tempo de Natal que se aproxima possa ser para nós um momento favorável para nos questionarmos, favorável para se reconciliar, favorável para a conversão dos corações. Que este tempo seja, então valorizado no sentido de promover mais aquilo que enobrece o homem, isto é a paz, a concórdia, a esperança. Se há problemas, que uns e outros se reconciliem.

Recomendamos o nosso país a rezar… não só os congoleses e congolesas, mas todos os amigos do Congo, da Igreja universal. Tal como o Papa nos fez compreender, ele não só está preocupado pelos que se passa no Congo, mas tem também toda esta situação no seu coração. Ele reza pelo Congo para que a paz volte e para que os congoleses e congolesas possam viver esta alegria do Natal que se aproxima.”

(DA) 








All the contents on this site are copyrighted ©.