Núncio na Ucrânia: difícil a situação humanitária


Kiev (RV) – No leste da Ucrânia, não obstante o cessar-fogo alcançado em 2015 com o Acordo de Minsk, continuam os combates.  Torna-se cada vez mais difícil a situação humanitária, sobretudo para as faixas mais vulneráveis da população.

Desde o início do conflito, são cerca de 9.500 as vítimas, enquanto outras 800 mil necessitam de assistência nas zonas onde ainda se combate e nas vizinhanças imediatas. Difícil também o acesso das ajudas humanitárias nestas áreas.

Há poucos dias, pela primeira vez em cinco meses, os comboios da UNHCR – a Agência da ONU para os refugiados – conseguiu chegar às populações nas zonas não controladas pelo governo, na região de Luhansk. Foram distribuídos materiais de construção de vital importância para as milhares de pessoas cujas habitações foram danificadas ou destruídas durante o conflito.

Sobre a situação no leste do país, nós conversamos por telefone com o Núncio Apostólico na Ucrânia, Dom Claudio Gugerotti:

“Infelizmente, a situação nos últimos dias piorou. Foram retomados os conflitos armados e também as vítimas”.

RV: Em relação à situação humanitária, quais são as maiores necessidades?

“A assistência àqueles que vivem na zona onde se confrontam os dois contingentes: o dos separatistas e o do exército ucraniano. É uma zona minada, o que torna muito difícil levar as ajudas, pois se corre o risco de pisar numa mina. Depois, naquela zona, continuam os bombardeios, muitas casas foram destelhadas e as pessoas estão substancialmente isoladas. As outras duas faixas mais atingidas são aquelas que vivem na zona sob o controle dos separatistas, porque são sobretudo idosos. A terceira faixa é a dos refugiados que estão na Ucrânia, certamente mais de 1 milhão”.

RV: Como em toda a guerra, as vítimas mais indefesas são as mulheres, as crianças, os idosos. O que se poderia fazer por eles?

“Isto, de fato, é também o objeto principal da atenção da Comissão que o Santo Padre instituiu para distribuir a grande ajuda humanitária para a Ucrânia. Existem muitas mães que permaneceram sozinhas com as crianças, porque o marido ou está na guerra ou porque deixou a família. Estas mães, naturalmente, tendo crianças pequenas, não podem normalmente ter um trabalho, e disto depende a sobrevivência do núcleo familiar. A outra categoria que corre um grande risco é a dos idosos, que praticamente não são assistidos: geralmente têm a casa destruída ou gravemente danificada, têm dificuldades em receber alimento e sobretudo uma enorme dificuldade em ter acesso aos remédios. Em relação ao envio de ajudas nas várias zonas, isto é particularmente difícil”.

RV: O quanto é difícil a chegada das ajudas nas zonas de fronteira ou do conflito por parte das ONGs, da Igreja?

“É muito difícil. A parte sob controle ucraniano tem um acesso relativamente mais fácil, mas na parte da chamada “zona cinza” – aquela ao redor da linha de demarcação – e sobretudo na zona sob o controle das “autoridades de fato”, a coisa é muito difícil, mesmo porque foi mudada a moeda. Depois, existe um mecanismo muito rigoroso para o reconhecimento das organizações que têm a permissão para acessar e distribuir. Nesta zona as dificuldades são particularmente graves também para nós: conseguimos, de qualquer maneira, programar as ajudas, que deveriam partir no final de agosto, somente por meio das Nações Unidas”.

RV: O conflito ucraniano que teve início em 2014, provocou mais de 9.500 mortos. Dois milhões de pessoas tiveram que abandonar as suas casa. Não obstante isto, parece ter se tornado um conflito esquecido, porque a atenção da mídia se voltou para outras latitudes. Mas, certamente o apelo do Papa em abril e a coleta promovida para Ucrânia, chamaram a atenção novamente para esta país....

“Certamente. A operação desejada pelo Papa Francisco é antes de tudo uma operação humanitária e as pessoas estão muito sensíveis a esta intervenção do Papa, que fez também uma grande oferta pessoal. E devo dizer que também a Europa contribuiu com uma certa generosidade. Sem sombra de dúvida, houve um aumento da atenção para esta área. É preciso também dizer que, por razões políticas, não está na moda falar da Ucrânia, porque esta é uma terra que piorou, digamos, as dificuldades existentes entre Estados Unidos e Europa, por um lado, e Rússia, por outro, colocando ambos em xeque. E portanto falar disto, é como falar dos próprios fracassos. E eu não acredito que este silêncio seja totalmente espontâneo: no sentido de que a Ucrânia, que evidentemente orbitava na área da Federação Russa, decidiu, também por pressão - sem sombra de dúvida da comunidade internacional - de voltar-se para a Europa e Estados Unidos. Houve o fenômeno Maidan, houve portanto “de fato” uma separação da Rússia com toda a recaída do ponto de vista econômico. Mas por outro lado, por várias razões - o que seria demorado explicar - o Ocidente não ocupou o lugar da Rússia para tentar tornar ágil a vida das pessoas daqui. Por isto, neste momento, a Ucrânia perdeu em todos os fronts. Um elemento que dá uma ideia é que o salário, que antes de Maidan era de 100, hoje é de 25 como valor. Portanto, ao problema da guerra, se soma um aumento da pobreza geral da população em toda a Ucrânia. E o risco é que, se esta situação não desbloquear, possa nascer uma guerra entre os pobres”.

 

(JE/ER)








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