Editorial: sangue de quem?


Cidade do Vaticano (RV) – A força da fé em Deus poderá um dia também transformar aqueles que agem em nome do ódio e da intolerância?

Ou o sangue dos mártires de hoje continuará a escorrer inexoravelmente?

Perguntas que surgem diante do último “execrável, vil e insensato” atentado em Lahore, no Paquistão, como o definiu Francisco na última segunda-feira.

A dor do Papa silenciou a Praça São Pedro que, junto com o Pontífice, rezou pelas vítimas e pelas famílias dilaceradas.

Paremos para imaginar a cena: depois do almoço do Domingo de Páscoa – para aqueles que tiveram o privilégio de uma refeição digna no faminto Paquistão – famílias inteiras se reúnem em um parque de diversões para celebrar com alegria a Ressurreição do nosso Redentor.

Se fizermos um esforço, poderemos até mesmo ouvir a felicidade que emana da algazarra típica das crianças, talvez perceber o sorriso de uma mãe ao ver que o filho já caminha sozinho, ou sentir a preocupação do pai que tenta proteger a filha que se aventura em um brinquedo “perigoso”.

Cenas normais, pode pensar. Abençoada normalidade, deve ter certeza. Porque se o mesmo parquinho do bairro no Brasil reúne indiscriminadamente filhos de católicos, evangélicos, muçulmanos, espíritas ou umbandistas, no Paquistão não é assim.

O Paquistão é o segundo país mais islâmico do mundo. É uma democracia parlamentarista com 200 milhões de habitantes. Somente 4 milhões são cristãos e o nível de perseguição dos extremistas islâmicos à minoria cristã é altíssimo.

Ser cristão no Paquistão é arriscar a vida todos os dias, é ser excluído pela fé na ressurreição de Cristo! Ser cristão no Paquistão é poder ser assassinado acusado de blasfêmia contra o Alcorão por rezar a Jesus, a Nossa Senhora, aos santos. Ser cristão no Paquistão é ser marginalizado por ter um nome bíblico, por rezar antes de uma refeição. Ser cristão no Paquistão é ser isolado e descartado por carregar uma cruz no peito.

Ser cristão no Paquistão é ser preda dos extremistas que vão à caça dos “heréticos”. Ser cristão no Paquistão é ser aliado político do Ocidente. Ser cristão no Paquistão é lutar todos os dias para professar – mesmo que seja escondido – a fé em Cristo. Ser cristão no Paquistão é ser martirizado com suas crianças no Domingo de Páscoa!

Quem acompanha o Magistério de Francisco sabe que o Papa já afirmou mais de uma vez que os mártires cristãos hoje são muito mais numerosos do que eram no início do cristianismo. O rio de lágrimas de sangue corre sem cessar, sem secar.

Áridos são os corações dos fundamentalistas a quem Francisco reza pela conversão para que, porventura, possam ter a chance de receberem o dom da fé que arderá ao peito, transmutando ira em ternura.

“Repito, mais uma vez, que a violência e o ódio homicida conduzem somente à dor e à destruição; o respeito e a fraternidade são a única estrada para se chegar à paz”, disse Francisco após o atentado.

Possam o respeito e a fraternidade ser também revestidos pelo amor de Cristo, que transforma o sangue dos mártires de hoje no Paquistão em esperança para todos os que ainda são impedidos de professar livremente a sua fé. (rb)








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