A misericórdia, centro da geopolítica de Bergoglio, afirma Pe. Spadaro


Cidade do Vaticano (RV) – “A diplomacia de Francisco. A misericórdia como processo político”,  é o título do longo artigo de autoria do Padre Antonio Spadaro, publicado na última edição da “La Civiltà Cattolica”. Entrevistado pela Rádio Vaticano, o Diretor da revista dos jesuítas se detém precisamente no papel da misericórdia na geopolítica de Francisco:

“A primeira coisa a ser verificada é que as viagens apostólicas do Papa Francisco – como ele mesmo disse ao encontrar o Corpo Diplomático acreditado junto à Santa Sé – têm tido como fio condutor precisamente a misericórdia. Portanto, a misericórdia de Deus se insere nos acontecimentos deste mundo, nos acontecimentos da sociedade, dos grupos humanos, das famílias, dos povos, das nações. Não vive somente dentro das dinâmicas pessoais. Numa extrema síntese, poderia dizer que a misericórdia, para Francisco, no âmbito político significa nunca considerar nada como perdido. Assim, tudo permanece possível: a paz é sempre possível!”.

RV: Num momento em que são vividos grandes contrastes, também muito profundos, o senhor escreve que, olhando Papa Francisco, se vê que “a misericórdia desarma a máquina narrativa dos fundamentalistas”...

“Sim. De fato, o Papa Francisco, diante das tragédias dos atentados em Paris, mas também da Shoah como vimos em sua viagem na Terra Santa, diante de tudo isto nasce o sentimento de impotência, não a decisão de alinhar-se a isto ou aquilo. Ele quer desarmar por dentro as máquinas narrativas, certamente do assim chamado Estado Islâmico, mas certamente, também, posições que existem dentro da Igreja e que gostariam de iniciar uma “guerra santa”. O Papa nunca fala de guerra, fala de terrorismo: o fundamentalismo é um câncer da religião, não é expressão da religião, não é expressão da religião”.

RV: O senhor também tenta buscar, encontrar as raízes da visão bergogliana e aparecem também figuras. Algumas que sabemos, conhecidas na história de Francisco, como o Beato Fabro e Dostoevskij, mas também outras pessoas talvez menos conhecidas do grande público...

“É interessante e fascinante entrar no mundo begogliano das referências, das leituras e dos aprofundamentos. A visão diplomática de Bergoglio formou-se através de fontes não habituais, como escritos místicos, escritos literários e escritos de um teólogo como Przywara, que foi mestre de Hans Urs von Balthasar. Fabro certamente vê o mundo como um lugar em que é necessário rezar por todos, portanto, indiferentemente por todos aqueles que estão envolvidos também dentro da luta política. Dostoevskij desequilibra a lógica das escolhas. Para ele, como escreve em “Memória do subterrâneo”, 2 + 2 pode resultar 5 e portanto requer uma lógica muito flexível, muito dinâmica, não rígida. Certamente Przywara é uma figura talvez pouco conhecida na Itália, mas importantíssima para compreender o Papa Francisco. Ele postula o fim da época constantina, rejeitando radicalmente a ideia da atuação do Reino de Deus sobre a terra, o que foi mais tarde a base do Sacro Romano Império, e portanto todas as formas políticas e institucionais similares ou atribuíveis ao Sacro Romano Império, até mesmo em termos de partido e portanto de políticas católicas. A Igreja deve estar em saída. Esta é o código de leitura”.

RV: A misericórdia, ato político por excelência. Aqui o senhor reencontra também Padre Tonino Bello, quase um precursor, em alguns aspectos, daquilo que vemos agora com o Papa Francisco...

“Sim, porque Padre Tonino Bello, como Papa Francisco, mas também tantos outros, na realidade, não distinguem de maneira clara a sacristia ou o templo, daquilo que é o compromisso. Existe um serviço que expressa uma profunda caridade. Também o disseram os Papas e o repetiu Francisco. A sua abordagem da paz, porém, não é uma abordagem pacifista. A paz para Bergoglio significa agir nos quadrantes mais delicados da política internacional, mas em nome dos descartados, dos mais frágeis. O Papa Francisco se concentra sobre isto e se dá conta de como as tensões do mundo nascem porque existem desequilíbrios, desequilíbrios também, e sobretudo, de caráter econômico. Portanto, todas as iniciativas de paz desta dramática “terceira guerra mundial em partes” devem estar ligadas aos tempos sociais que preocupam o Papa, porque o Papa está muito atento aos descartes”. (JE)








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