Rio de Janeiro (RV) - Neste ano “C” iremos ouvir aos domingos, principalmente,
o Evangelho de Lucas. E ele começa a ser proclamado neste Terceiro Domingo do Tempo
Comum. Por isso, neste domingo nos é apresentado o início da obra de Lucas. Aí se
tem uma dedicatória e uma apresentação da obra a um certo “Teófilo”. E Lucas afirma
expressamente que, “após um estudo cuidadoso de tudo o que aconteceu desde o princípio,
também eu decidi escrever de modo ordenado para ti... Deste modo poderás verificar
a solidez dos ensinamentos que recebeste”. Estas palavras nos revelam a seriedade
do testemunho dos evangelhos. Não são fábulas, não são delírios! São, isto sim, um
testemunho de fé! Testemunho de quem crê, de quem tem razões para crer e quer fazer
com que outros creiam e creiam com razão profunda.
Esta perícope nos apresenta Jesus na sinagoga de Nazaré: “O Espírito do Senhor está
sobre mim, porque ele me consagrou com a unção”. Há quinze dias meditávamos sobre
esse mistério: o Pai, o Senhor, ungiu Jesus com o Espírito Santo como Messias de Israel.
Isso foi no batismo às margens do rio Jordão. “Consagrou-me com a unção para anunciar
a Boa Nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos cativos e aos cegos
a recuperação da vista, para libertar os oprimidos e para proclamar um ano da graça
do Senhor”. Naquele domingo falávamos sobre mais uma manifestação do Senhor: a proclamação
da sua missão: o Messias: acolher, consolar, perdoar, libertar, fazer viver.
Durante os dias da trezena de São Sebastião refletimos também essa versão de Isaías
acolhida por Jesus do ano santo: ano da graça do Senhor. O Senhor é a grande boa nova
que vem para trazer vida para todos, vem proclamar a libertação, a cura, a salvação
gratuita. Eis a inserção desse texto com a grande novidade do Ano da Misericórdia!
Mas, para que experimentemos essa alegria é necessário que acolhamos esta notícia!
Por isso é importante que nós mesmos descubramos que somos pobres, carentes, limitados,
pequenos, pecadores necessitados de misericórdia. Quando descobrimos isso, quando
vemos que o mundo é assim, então experimentamos também que, em Jesus, Deus veio a
nós, Deus deu-se a nós, Deus estendeu-nos as mãos, abriu-nos os braços e aconchegou-nos
no coração. Experimentados o amor misericordioso do Senhor.
Os atos e as palavras de Jesus são Boa Nova, Boa Notícia, ou, em grego, Evangelho!
E a Boa Nova é precisamente esta: Deus nos ama, está conosco em Jesus; veio para ficar,
para permanecer para sempre na nossa vida e no coração do mundo! Este Jesus permanece
conosco na potência sempre presente e atuante do seu Espírito Santo, presente de modo
potente e soberano na Igreja que Jesus fundou. Já no domingo passado, vimos que a
Igreja é a Esposa do Cristo, cheia do vinho abundante do Espírito Santo, que nela
suscitava tantos dons, tantos carismas, tantos ministérios, tanta vida. Pois bem,
a segunda leitura (1Cor 12) da missa deste domingo insiste nesta ideia e aprofunda-a
ainda mais. A unidade na diversidade é o que ressalta da carta de Paulo: “como o corpo
é um, embora tenha muitos membros...”. Somos introduzidos também à escuta de uma palavra
abundante, que foi acolhida durante uma manhã inteira, e que tocou o coração do povo
(Neemias 8): “Amém, Amém” respondeu o povo que “chorava ao ouvir as palavras da Lei”.
Diz Santo Agostinho: “Devemos ouvir o Evangelho como se o Senhor estivesse presente
e nos falasse. Não devemos dizer: “Felizes aqueles que puderam vê-Lo”. Porque muitos
dos que O viram crucificaram-no; e muitos dos que não O viram creram Nele. As mesmas
palavras que saíam da boca do Senhor foram escritas, guardadas e conservadas para
nós”.
Lemos no começo do Evangelho deste domingo: “Muitas pessoas já tentaram escrever a
história dos acontecimentos que se realizaram entre nós, como nos foram transmitidos
por aqueles que, desde o princípio, foram testemunhas oculares e ministros da Palavra.
Assim sendo, após fazer um estudo cuidadoso de tudo o que aconteceu desde o princípio,
também eu decidi escrever de modo ordenado para ti, excelentíssimo Teófilo”.
Só se ama o que se conhece! Por isso, deveríamos reservar todos os dias alguns minutos
para lermos e meditarmos o Evangelho, e assim chegar espontaneamente a um conhecimento
profundo e à contemplação de Jesus Cristo. É a “Lectio Divina” ou leitura orante da
Bíblia. É o pedido constante do Papa Francisco para levarmos no bolso um exemplar
do Evangelho para lermos sempre. Seria muito difícil amar a Cristo, conhecê-Lo de
verdade, se não se escutasse frequentemente a Palavra de Deus; se não se lesse o Evangelho
com atenção, todos os dias.
Iniciamos a leitura de Lucas com esse contexto de proclamação da Palavra abundantemente
e o grande anúncio da Boa Notícia, que deve nos levar a viver a diversidade na unidade.
Caminhemos confiantes neste ano do Jubileu da Misericórdia fazendo experiência do
amor gratuito do Senhor por nós. Por isso, faço o convite a todos a aprofundarem na
fé, através da leitura da Sagrada Escritura (lectio divina), no estudo da História
da Igreja e do Catecismo da Igreja Católica. Que Deus assim abençoe a todos em sua
vida, sua caminhada de comunidade, em seus estudos e, consequentemente, no anúncio
com a palavra e a vida através do testemunho misericordioso. Assim possamos concluir
também nós com Cristo: “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de
ouvir”.
Orani João, Cardeal Tempesta, O.Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ
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