Artigo: Família - para onde vais?


Porto Alegre (RV*) - A família, em todas as culturas, possui um senso de grandeza. Há a convicção de que a salvação da pessoa e da sociedade humana está estreitamente ligada ao bem-estar da comunidade conjugal e familiar. Isso porque é promotora de vida.

No entanto, não se pode negar que a comunidade conjugal e familiar atravessa uma crise cultural profunda, como todas as comunidades e vínculos sociais. No caso da família, a fragilidade dos vínculos reveste-se de especial gravidade, porque se trata da célula básica da sociedade, o espaço onde se aprende a conviver na diferença e a pertencer aos outros e onde os pais transmitem a fé aos seus filhos. O matrimônio tende a ser visto como mera forma de gratificação afetiva, que se pode constituir de qualquer maneira e modificar-se de acordo com a sensibilidade de cada um. Mas a contribuição indispensável do matrimônio à sociedade supera o nível da afetividade e o das necessidades ocasionais do casal (Papa Francisco).

Em nome, por vezes, de uma pseudodefesa do direito de minorias, alimenta-se e propaga-se a confusão de termos essenciais relativos à instituição familiar. Subjaz a essa situação o vazio antropológico, além do querer impor "seletivos" e "caprichosos" conceitos estranhos ao "tema família", por parte de grupos ou ideologias. Tal situação produz equívocos que não só dificultam o debate e o diálogo sobre questões importantes para toda a sociedade, como também negam sua necessidade.

Nesse contexto, a Igreja é apresentada como retrógrada, como empecilho para a liberdade, pois seria intolerante, impositiva, ultrapassada. Vale a pena, neste contexto, recordar Hegel: que o homem seja livre em si e por si, por virtude da própria substância, e que tenha nascido livre como homem, isto não souberam nem Platão, nem Aristóteles, nem Cícero, nem os juristas romanos, ainda que somente neste conceito de ser humano esteja a nascente do direito. Somente no princípio cristão o espírito individual pessoal assume essencialmente valor infinito, absoluto; Deus quer que seja dada ajuda a todos os homens. Na religião cristã, desenvolveu-se a doutrina segundo a qual todos os homens são iguais perante Deus, porque Cristo os chamou para a liberdade Cristã... Estas afirmações fizeram com que a liberdade se tornasse independente, seja do nascimento, seja da condição social, da educação etc. O sentimento de tal princípio fermentou por séculos, por milênios, produzindo as mais gigantescas revoluções.

Para a Igreja, há um modelo originário de família: comunidade de amor entre homem e mulher, nascida do matrimônio, marcada pela fidelidade, perseverança e fecundidade. Esta compreensão encontra dificuldades de aceitação por parte de alguns. Não seria demais afirmar que são poucos os que a acolhem e entendem!

Na base desta situação, está latente uma mudança cultural na compreensão do que seja o ser humano, sua origem, vocação, missão e meta. Tal mudança traz no seu bojo aspectos positivos, como o reconhecimento dos direitos da mulher, da criança e dos adolescentes; uma maior liberdade de expressão; o desejo de aproximar, integrar e promover o respeito pelas diferenças. Soma-se, porém, a isso o receio, senão medo difuso, de assumir compromissos definitivos, um individualismo exacerbado que põe no centro a própria satisfação e desejos que não levam à plena realização da pessoa.

Estamos, na segunda semana de agosto, celebrando a Semana da Família. Este é um tempo privilegiado para buscar resgatar aspectos fundamentais da identidade dessa instituição. A família e a vida são como polos inseparáveis de uma mesma realidade. Por isso, procurando refletir aspectos essenciais da família, estamos promovendo o que possuímos de mais sagrado: a vida!

+ Dom Jaime Spengler

Arcebispo de Porto Alegre








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