Bispos brasileiros levam temática social à sala conciliar


Cidade do Vaticano (RV) - No espaço Memória Histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a tratar, na edição de hoje, da participação do episcopado brasileiro no Concílio.

Como não poderia deixar de ser, os bispos brasileiros levaram para as sessões do Concílio temas que adquiriam uma particular  relevância no contexto da Igreja no Brasil. Neste sentido, estavam presentes nas reuniões e pronunciamentos do Concílio os debates que ocorriam no país sobre subdesenvolvimento, miséria,  desnutrição, analfabetismo e o próprio engajamento da Igreja na superação destas situações. Esta temática, fez com que o episcopado brasileiro fosse o mais numeroso no grupo Igreja dos Pobres.

O diálogo-norte sul também representava uma preocupação para círculos minoritários, porém influentes do Episcopado Brasileiro. Assim, por iniciativa de Dom Helder Câmara e do CELAM, foi realizado em 1959 um encontro na Georgetown University (2 a 3 de novembro de 1959), reunindo seis bispos da América Latina, seis do Canadá e seis dos Estados Unidos, além de Monsenhor Antonio Samorè, como representante da Santa Sé. Da iniciativa, brotou um programa de cinco pontos de cooperação entre a Igreja dos Estados Unidos e as Igrejas da América Latina e do Caribe que previa o envolvimento de padres diocesanos dos Estados Unidos no trabalho missionário na América Latina; o estabelecimento de missões diocesanas na América Latina, a criação de um grupo de missionários leigos; o recrutamento de missionários para a América Latina entre as comunidades religiosas dos Estados Unidos e  o estabelecimento de um fundo nacional em favor da Igreja na América Latina.

O Concílio criou o ambiente para ampliar este diálogo, envolvendo num primeiro momento a Europa do lado dos países desenvolvidos e a África e a Ásia ao lado dos subdesenvolvidos. Já na primeira sessão do Concílio, este diálogo passou a fazer parte do grupo Igreja dos Pobres, desdobrando-se em iniciativas mais amplas, como bem descreveu Dom Helder:

"Às 19h30min do dia 29 de novembro de 1962 houve o início do diálogo entre os dois Mundos. Foi emocionante. Ali estava, na presidência, o sucessor de Mercier - Cardeal Leo Suenens, sucessor do Cardeal Mercier no Arcebispado de Malines-Bruxelles -, que se mostrou absolutamente à altura da missão que a Providência lhe confia..., ali estava um resumo altamente representativo do Mundo subdesenvolvido e do Mundo desenvolvido. O Padre Houtart correspondeu de todo às nossas esperanças. Abri o diálogo de que participaram, interessadíssimos, os dois mundos. Mas grande mesmo foi Suenens, ao encerrar o encontro. Disse verdades fortes e de maneira admirável. Eis algumas amostras:

- afirmou, de público, o que já dissera ao Papa: precisamos atualizar a Mater et Magistra, tornando-a três vezes mais forte, pois o capítulo sobre supérfluo, segundo o Papa foi muito alterado.

- falando de educação de base - que revelou conhecer por dentro - salientou que há um trabalho educacional pelo menos tão urgente a realizar no mundo desenvolvido, e a começar, por vezes, de Bispos, Padres e Religiosos. É urgente arrancar os cristãos do egoísmo, do comodismo e acordá-los para os grandes problemas da hora atual....

- lembrou - a propósito das riquezas espirituais que o mundo desenvolvido descobre, com espanto, no mundo subdesenvolvido - que o importante não é levar riquezas, aos outros, mas despertar as riquezas que neles estão adormecidas.

Acabou declarando que amanhã se baterá na Comissão de Assuntos Extraordinários pela criação do Secretariado, ao qual deseja dedicar o melhor de sua inteligência e coração. O querido Georges Mercier, Bispo de Laghouat no Saara argelino, teve uma entrada magnífica sobre os pobres. Fizemos o pacto entre o Sahara e o Ceará. Terminada a palestra e finda a discussão, fiquei ainda meia hora com o Cardeal, soprando-lhe a ideia de unir a Igreja europeia (a união econômica foi possível. Como não seria a religiosa e cristã?".

Estes temas encontraram seu percurso natural, caindo no esquema XVII, que deveria englobar toda a questão do diálogo entre "a Igreja e o Mundo de hoje". Este esquema acabou transformando-se no Esquema XIII, que ganhou sua forma final na Constituição Pastoral Gaudium et Spes. 

 

Fonte: “Padres Conciliares Brasileiros no Concílio Vaticano II Participação e Prosopografia 1959 – 1965”. Pe José Oscar Beozzo

 








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