Editorial: A casa da humanidade


Cidade do Vaticano (RV) – É grande a expectativa pela publicação da próxima Encíclica do Papa Francisco, dedicada, como o próprio Santo Padre revelou, à ecologia. Espera-se que o texto seja publicado antes da Conferência sobre o Clima, que se realizará em Paris no mês de dezembro. Até aquela data, na capital francesa, vão se realizar uma série de eventos destinados a definir um novo acordo climático global pós-2020, centrado na redução de emissões para limitar o aumento médio de temperatura em 2º.

Quando de sua viagem ao Sir Lanka e Filipinas, no último mês de janeiro, Francisco, conversando com os jornalistas externou a sua preocupação para com o meio ambiente e sobre como o homem está agindo para preservá-lo. Deparamo-nos com uma situação que, ao invés de tutelá-lo, estamos destruindo-o, consumindo-o: “o ser humano tem responsabilidades nas alterações climáticas”, disse o Papa. “De certa forma, nos tornamos donos da natureza, da mãe terra, o homem foi longe demais”.

Mas o que é uma Encíclica ou Carta Encíclica? É um documento pontifício dirigido aos bispos do mundo inteiro e a todo o povo de Deus. É usado pelo Papa no exercício do seu magistério petrino. Trata de matéria doutrinária em variados campos: fé, culto, doutrina social, moral, etc. A matéria nela contida não é formalmente objeto de fé. Portanto, uma encíclica não define um dogma, mas atualiza a doutrina católica através de um ensinamento ou um tema da atualidade.

Em síntese é uma carta que o Papa escreve e envia a todos os bispos do mundo e ao povo de Deus sobre um determinado assunto que deseja ensinar. Segundo dados bibliográficos, a primeira encíclica que se tem conhecimento foi escrita pelo Papa São Clemente (89-98) aos cristãos de Corinto, para pacificar discórdias que havia no meio da comunidade.

Também Francisco usa esse instrumento para poder chegar às várias realidades da Igreja presente em todo o mundo, como também às várias realidades da sociedade.

A expectativa que se criou com a publicação da próxima Encíclica de Francisco, focalizada precisamente sobre a “ecologia humana”, é um interesse que amadureceu não só no seio da Igreja Católica, mas também na sociedade em geral, devido aos constantes discursos do Papa para conscientizar as pessoas sobre a situação do clima do nosso planeta e sobre a tragédia que provoca a exclusão social.

Nos dias passados o Pontifício Conselho da Justiça e da Paz publicou um documento com o título “Terra e Alimento”, no qual faz uma afirmação dura e sem meias palavras: “a humanidade não viverá em paz enquanto a fome não for derrotada, enquanto coexistirem aqueles que se banqueteiam diariamente e aqueles que, à sua porta ou do outro lado do planeta, morrem de fome". O secretário desse dicastério vaticano, Dom Mario Toso, falando à Rádio Vaticano afirmou que não obstante se produzam gêneros alimentícios suficientes para todos, continua a subsistir a fome no mundo. Depois, a urgência de enfrentar num futuro imediato o crescimento da demanda por um alimento de qualidade por um lado, e por outro, a sustentabilidade da produção no respeito pelo ambiente.

Para a Igreja e os seus pontífices, o interesse pelos temas sociais, incluído este crucial da salvaguarda do ambiente, não é comandado por razões do tipo extrínseco à identidade cristã ou por razões meramente instrumentais; a atenção aos referidos temas é expressão da dimensão social da fé. Junto com a ecologia ambiental é necessária uma ecologia humana, feita de respeito pelo indivíduo.

A Encíclica de Francisco pode ajudar a olhar os temas ecológicos e do desenvolvimento sustentável na base de um pensamento e de um humanismo que iluminam sobre a beleza, a bondade, a verdade da criação, entendida, antes de tudo, como obra de Deus, como 'casa comum' para a família dos povos presentes e futuros. Em outras palavras, pode oferecer, no atual contexto cultural, muitas vezes mercantilista, uma abordagem sapiencial, unitária, aberta à Transcendência, à fraternidade e à solidariedade, e, portanto, à justiça social.

Além disto, pode oferecer uma projeção guiada pelo princípio da destinação universal dos bens, do primado da ecologia humana sobre aquela ambiental, de uma espiritualidade focada sobre o ser e sobre a partilha, mas também sobre enfrentar os problemas com coragem, capacidade profissional, inovação, criatividade, participando da mesma obra redentora de Cristo.  

A preocupação do Papa Francisco com a salvaguarda da Criação sempre esteve presente nos seus pronunciamentos e mensagens desde o início do seu pontificado. A perspectiva de uma Encíclica sobre este tema, no entanto, ficou mais evidente em janeiro do ano passado, quando o Pontífice recebeu em audiência o Presidente francês François Hollande.

Após a audiência privada com o Papa, que durou 35 minutos, o Hollande participou de uma coletiva de imprensa, onde revelou o teor dos colóquios com o Pontífice. Em relação ao Tratado sobre o Meio ambiente, ele comentou que o Papa Francisco sentenciou: “Deus perdoa sempre, o homem às vezes, a natureza nunca, se não é cuidada”. “Trabalhemos – acrescentou – para que a Conferência sobre o Clima de 2015 tenha um bom êxito”.

A perspectiva então de uma Encíclica sobre o assunto ganhou as páginas dos jornais de todo o mundo, e cresceu a necessidade de um documento, de uma palavra do Papa, da Igreja, sobre o ambiente. Certamente a questão do planeta como casa da humanidade, sobre a ecologia centrada no ser humano, serão temas-chaves do tão esperado documento de Francisco. (Silvonei José)








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