Editorial: Vertigem da indiferença


Cidade do Vaticano (RV) – Todos os anos o Santo Padre nos oferece, por ocasião do período da Quaresma, uma mensagem na qual ele propõe a reflexão de um tema específico. Este ano o tema é “Fortalecei os vossos corações” foi extraído de Tiago, capítulo 5, versículo 8. A mensagem foi apresentada ao mundo na última terça-feira, na Sala de Imprensa da Santa Sé, aqui em Roma.

Nos pensamentos que frequentemente o Papa Francisco compartilha com os fiéis, seja nas suas breves homilias improvisadas na capela da Casa Santa Marta todas as manhãs, seja nos textos de encontros com personalidades ou líderes religiosos, ele sempre puxa nossa atenção para o real valor do ser humano, diante de uma sociedade que se centraliza cada vez mais, deixando de lado a pessoa, o homem, a mulher. Palavras suas que já são nossas, como descarte, globalização da indiferença, e que refletem o pensamento do Papa sobre o mundo em que vivemos no que diz respeito à negação do outro, do irmão.

Na sua mensagem para a Quaresma deste ano de 2015, Francisco toca a tecla do esquecimento do outro, do nosso egoísmo em relação ao próximo quando, comodamente isolados, nos esquecemos deles; “não nos interessam o seus problemas, suas tribulações, injustiças, assim nosso coração cai na indiferença”. Esse é um mal que, como cristãos, somos obrigados a enfrentar.

Na sua mensagem o Santo Padre recorda que a Quaresma é um tempo propício para mostrar este interesse pelo próximo, “através de um sinal – mesmo pequeno, mas concreto – da nossa participação na humanidade que temos em comum.”

A quaresma é o tempo litúrgico de conversão, um tempo para nos prepararmos para a grande festa da Páscoa. É tempo para nos arrependermos dos nossos pecados e de mudar algo em nós, para sermos melhores e assim poder viver mais próximos a Cristo. São 40 dias, que começa na Quarta-feira de Cinzas, 18, e termina no Domingo de Ramos. Na Quaresma, Cristo nos convida a mudar de vida, a viver este período como um caminho, ouvindo a Palavra, rezando, - conversa íntima com Deus – e partilhando com o próximo através de ações concretas.

E Francisco na sua mensagem para a Quaresma deste ano nos recorda que o sofrimento do próximo constitui um apelo a essa conversão, “porque a necessidade do irmão recorda-me a fragilidade da minha vida, a minha dependência de Deus e dos irmãos”. Nós temos a tentação à indiferença. Estamos saturados de notícias e imagens impressionantes que nos relatam o sofrimento humano, sentindo ao mesmo tempo toda a nossa incapacidade de intervir, escreve o Pontífice, que pergunta: o que fazer para não nos deixarmos absorver por esta espiral de terror e impotência?

Ele mesmo nos indica um caminho: em primeiro lugar rezar juntos. Não subestimemos a força da oração de muitos! Em segundo lugar, levar ajuda, com gestos de caridade a quem vive próximo de nós ou a quem está longe. A Quaresma é um tempo propício para mostrar este interesse pelo outro. E, em terceiro lugar, o sofrimento do próximo constitui um apelo à conversão, porque a necessidade do irmão recorda-me a fragilidade da minha vida, a minha dependência de Deus e dos irmãos.

Ai está outra chave de leitura indicada pelo Papa na sua mensagem a de pedirmos a Deus a graça de aceitar os nossos limites e confiar no amor de Deus. Vamos tomar consciência de que não podemos nos salvar sozinho e salvar o mundo. Para superar essas pretensões podemos viver o tempo da Quaresma como um percurso de formação do coração. Um coração forte, firme, aberto a Deus, impregnado do Espírito, mas ao mesmo tempo um coração pobre que conhece as suas limitações e que se doa totalmente ao outro. Teremos assim um coração forte e misericordioso, vigilante e generoso, que não se deixa fechar em si mesmo nem cai na “vertigem da globalização da indiferença”.

O Papa Francisco na sua mensagem nos convida a lutar contra a atitude egoísta que hoje assumiu uma dimensão mundial e que nos leva a esquecer, ou pior, a ignorar as pessoas que sofrem, as injustiças que padecem, e mais em geral, os seus problemas; mas também a ignorar Deus mesmo, que “não é indiferente ao mundo, mas o ama até o ponto de dar o Seu Filho para a salvação do homem”.

O tempo da Quaresma é um tempo no qual diante das tentações reais de indiferença para com o próximo e para com Deus, temos necessidade de ouvir, o brado dos profetas que levantam a voz para nos despertar, “Fortalecei os vossos corações”. (Silvonei José)








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