"Francisco prega um Evangelho puro", diz Pe. Spadaro


Cidade do Vaticano (RV) – Segundo uma pesquisa realizada por um jornal italiano, o Papa Francisco é o personagem público em quem os italianos depositam maior confiança. Em entrevista à Rádio Vaticano, o Diretor de ‘La Civiltà Cattolica’, Padre Antonio Spadaro, partiu deste dado para traçar um quadro do magistério do Papa no ano de 2014.

“Hoje existe a necessidade difundida de uma confiança e raramente outras instituições – vejamos, por exemplo, a política – conseguem dar esta confiança. O Papa certamente estabeleceu uma relação de respeitabilidade muito particular. Foi capaz, isto é, de estabelecer uma relação direta com as pessoas, portanto, de proximidade, e tanto mais é próximo, tanto mais tem autoridade; enquanto nós sabemos que no geral, as formas de autoridade se distinguem pela sua capacidade de distância e portanto de divisão – como dizer – divisão geral e distante dos casos particulares. Assim eu diria que o Papa recebe tanta confiança, porque existe a necessidade da espiritualidade e o Papa responde a esta necessidade de uma maneira direta, imediata, próxima. Esta, na minha opinião, é a chave de fundo”.

RV: Também o Natal 2014 foi caracterizado, a nível jornalístico, por um artigo de um dos mais conhecidos escritores católicos, Vittorio Messori, que manifestou dúvidas quando à reviravolta de Papa Francisco...

“As dúvidas, as dificuldades e eu diria, as resistências em relação ao Papa, na realidade existem, mas eu não veria um problema nestas resistências. Ao contrário, diria que talvez sejam a evidência da eficácia da ação de Francisco. Sobretudo um aspecto, que me parece o mais significativo: o apelo de Francisco para se viver um cristianismo maduro, livre, que não tem problemas em confrontar-se também de maneira conflitiva com as dificuldades diante deste modelo de cristianismo fechado em si mesmo, medroso, obsequioso. Assim, estas formas de cristianismo reagem, mas sem dúvida a estrada indicada - eu diria – não somente pelo Papa, mas por todo o processo que a Igreja viveu nestes anos, desde o Concílio Vaticano II, leva na direção para a qual Francisco está andando”.

RV: Alguns repovam as contantes “batidas” que Francisco dá nos católicos e destacam como, pelo contrário, o fato de o Papa ser muito apreciado em ambientes distantes da Igreja e seja muito apreciado e considerado também por muitos ateus. Na sua opinião, o que significa tudo isto?

“São duas coisas diferentes. A primeira: eu diria que o Papa não “bate” nos fiéis, quando muito dirige a eles um apelo, um exame de consciência e um exercício espiritual. Também o famoso discurso à Cúria, para as felicitações de Natal, foi um discurso muito denso, muito forte, que teve o seu núcleo num apelo para se recordar da relação com Cristo: evitar o Alzheimer espiritual”, como ele o definiu. Portanto, fazer memória do encontro com Cristo para seguir em frente. Claramente, fazendo memória, nos damos conta de como é a vida que nós vivemos. É uma vida marcada por misérias, por pecados. E assim, o Papa faz um apelo para uma consciência nova, sobretudo para que o pecado não acabe se transformando em corrupção. Portanto, o Papa se torna muito duro, muito forte, porque quer que a Igreja testemunhe Cristo e não testemunhe uma série de práticas, de idéias que coloquem em risco o cristianismo. Por outro lado, esta mensagem é muito acolhida em ambientes também distantes, porque no fundo, a mensagem que prega Francisco é um Evangelho puro: não é tanto o Papa que toca, mas a mensagem que ele consegue comunicar com a sua pessoa, com absoluta simplicidade e coerência. Portanto, chega diretamente: se uma vez existia a necessidade de grandes interpretações – às vezes a mensagem do Papa na sua pureza foi depois fechada e engaiolada em interpretações e visões – aqui o Papa comunica diretamente. A mensagem chega no momento em que parte, poderíamos assim dizer...Esta é uma grande força: é o fascínio do Evangelho, no final das contas”.

RV: Enzo Bianchi, Prior da Comunidade de Bose, escreveu que “quanto mais o Papa prosseguir no caminho da adesão ao Evangelho, sine glossa, mais desencadeará as forças demoníacas”. O que significa, na sua opinião, esta leitura?

“Às vezes se quer o Papa Francisco como um Papa doce, bom, e ele, efetivamente, é assim, é muito bom, é muito doce; mas é a doçura evangélica, que frequentemente depois se torna luta, se torna conflito. Nos seus textos, também nos textos que escreveu antes de se tornar Papa, a palavra “luta” é recorrente. Eu diria que o Evangelho – na realidade – une, mas também divide, porque desvela os corações. Certamente – o estamos vivendo e mesmo assistindo o que acontece em certos círculos – a palavra do Papa é instrumentalizada, abusada; o próprio Papa é criticado e atacado. Tudo isto faz parte do processo, o Papa tem consciência disto e portanto o conflito, de qualquer modo, é inevitável. É verdade, existe esta potência do mal que emerge e que torna conflitiva em relação, digamos assim, a um bem, que porém é muito difundido, capilar e que avança”. (JE)

 








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