"Nascidos para morrer" - Relatório da organização "Save the Children" sobre mortalidade
materno/infantil no mundo
O Vírus do
Ébola veio agravar a situação materno-infantil nos três países africanos mais atingidos
por esta epidemia.
É quanto releva a organização internacional “Save the Children”
num relatório intitulado “Nascidos para Morrer”, em que põe em realce o grande número
de crianças destinadas a morrer de tenra idade, porque as próprias mães não têm condições
para as fazer nascer sãs e garantir o seu são crescimento. A Ásia meridional e a África
sub-sahariana são as áreas do mundo, onde a situação é pior, enquanto que no outro
extremo estão países da Europa como a Dinamarca e a Suécia.
Enfrentou este
tema na rubrica “África. Vozes Femininas” com Marco Guadagnino, membro de “Save the
Children/Itália. Oiça aqui e/ou leia em baixo:
*** Nascidos para morrer é o título de um relatório publicado a semana passada
em Roma pela secção italiana da organização internacional “Save the Children”. Os
dados nele contidos indicam que no mundo morrem por ano cerca de seis milhões e trezentas
mil crianças. Mortes já escritas nos altos factores de risco que envolvem as mães,
como por exemplo a má nutrição, a falta de acesso aos cuidados básicos de saúde durante
a gravidez ou mesmo a maternidade precoce. No mundo verificam-se pelos menos de 7
milhões de gravidezes em adolescentes por ano. A todos esses factores veio agora juntar-se
a emergência do Ébola que agrava ainda mais a situação da mortalidade materno-infantil
em África. Segundo Save the Chindren dois milhões e meio de crianças estão expostas
ao risco de contaminação do vírus na Serra Leoa, Guiné Konacri e Libéria, onde todos
os dias já morriam à volta de cem crianças por dia devido à malária, diarreia e pulmonite
- explica Marco Guadagnino de organização internacional “Save The Children”.
“Ébola
é antes de mais um problema sanitário que envolve também as crianças. São milhares
as crianças que foram infectadas e infelizmente muitas estão a morrer na Libéria,
Guiné Konacri eSerra Leoa. É um problema que está a agravar-se, mas a questão
Ébola no que toca às crianças é uma questão muito complexa que vai para além do aspecto
sanitário; basta pensar que são já milhares as crianças que ficaram órfãs de um ou
de ambos os pais. São muitas as crianças que por ter tido um dos pais ou algum outro
parente infectado vivem num estado de isolamento porque as pessoas à sua volta têm
medo de estar com elas. Basta pensar que neste momento há muitas crianças que vivem
em isolamento e que provavelmente não estão infectadas, mas tiveram contacto com pessoas
doentes e por isso são fechadas em quartos por pelo menos 20 dias e têm necessidade
de tudo. Nós estamos a tentar dar alimentos, roupas, brinquedos… a situação é, portanto,
muito complexa. As escolas estão fechadas. Enfim, Ebola está a criar numa parte da
África, sobretudo ocidental, problemas que se arrastarão por muitos anos, infelizmente.
Antes de Ébola, na Serra Leoa, Libéria e Guiné-Konacri, morriam mais de
100 crianças por dia devido à malária, pulmonite e diarreia… Agora que o sistema sanitário
desmoronou completamente, estamos certos de que o número de crianças que morriam devido
a outras doenças aumentou notavelmente; as mães que devem dar à luz, se antes algumas
delas se dirigiam aos centros de saúde, agora por medo da infecção de Ébola é difícil
que se dirijam aos centros sanitários; a situação é realmente muito difícil. “
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Ainda segundo o relatório “Nascidos para morrer”, os 10 países onde
o risco de mortalidade materno/infantil é mais elevado são Moçambique, Tanzânia, Burkina-Faso,
Rep. Democrática do Congo, Eritreia, Republica Centro-africana, Níger, Etiópia,
Chade e último de todos a Somália.
Para além da África subsahariana, outra
região do mundo onde a situação de risco para mães e nascituros é a Ásia Meridional.
Nestas duas regiões, segundo, concentram-se, Save the Clindren três quartos das mortes
infantis. Mas é a África subsahariana a pagar o preço mais alto: uma criança em cada
11 perde a vida antes dos cinco anos de idade.
A situação de risco é, pelo
contrário, quase inexistente, em países como a Dinamarca e a Suécia, onde há uma baixa
incidência de gravidezes em adolescentes, a má-nutrição crónica nas mães é insignificante
e o acesso aos cuidados básicos de saúde é amplo.
Na Somália, o país onde
a situação é mais grave de todos, 180 crianças em cada mil nascidas vivas morre, enquanto
que na Dinamarca é de cerca de 4 crianças em cada mil. Dados que levam Marco Guadagnino
a afirmar que há que focalizar mais na relação mãe/nascituro para garantir o bem-estar
dos dois e sobretudo da criança que vai nascer…
“Morrem muitas crianças,
mas morrem também muitas mães.Há uma ligação muito estreita entre a saúde
da mãe e a saúde do nascituro. Tem-se feito ainda muito pouco neste âmbito. É necessário
reconhecer a importância de dar também às mães em idade fértil aquela assistência
e os cuidados que lhes podem permitir levar avante a gravidez em boas condições. Isto
permitirá também garantir o desenvolvimento do feto de maneira satisfatória e uma
vez nascida a criança possa viver de forma sã. É necessário ter como alvo a mãe, fazer
com que a hereditariedade que a criança recebe da mãe seja uma hereditariedade positiva;
fazer com que a mãe seja sensibilizada por exemplo ao aleitamento ao seio por pelo
menos seis meses depois da gravidez; é necessário reforçar a relação mãe-filho”.
Recomendações que parecem apenas um desejo para muitas situações em África,
dado que para diminuir a mortalidade materno/infantil depende das políticas nacionais
e internacionais, sobre as quais Save The Children não parece ter muito poder de influencia,
embora trabalhe em sintonia com os Governos e as comunidades - explica ainda Marco
Guadagnino…
“Para além das intervenções directas, há sempre a necessidade
de manter uma ligação muito forte com os governos para fazer uma acção de lobby a
fim de que sejam actuadas medidas que favoreçam curas sanitárias também para as faixas
mais vulneráveis”
A Organização internacional “Save the Clindren, que existe
desde 1919, está presente em diversas partes da África. A secção italiana desta organização
tem três grandes projectos em Moçambique:
“Temos três grandes projectos
de saúde materno/infantil em Moçambique, nas províncias de Gaza, Zambézia e mais ao
Norte do País. Temos podido beneficiar dezenas de milhares de mães e crianças. Fazemos
aquilo que é a nossa missão: sanidade de base, ou seja construção de centros sanitários,
formação de operadores sanitários; apoio às campanhas de vacinação, tudo o que pode
servir para levar a sanidade mesmo aos lugares mais recônditos e difíceis de atingir.”
E nos três países da África Ocidental atingidos pela Ébola, estão também
presentes?
“Estamos presentes também aí com intervenções importantes
e bastante inovativas. Na Libéria, por exemplo, estamos a abrir 10 centros comunitários
que designamos como “centros de resposta ao Ébola”, isto é em vez de pensar só em
grandes centros para o tratamento (aliás, estamos a activar um na Serra Leoa), achamos
também oportuno pilotar uma fase de experiência em que, a nível de aldeias, serão
construídos centros sanitários para permitir, a partir das zonas mais remotas, diagnosticar
e tratar a nível local os doentes de Ébola, porque um dos problemas maiores é que
essas pessoas tendem a dirigir-se à capital do país ou para as grandes cidades para
se curarem. E durante a viagem correm o risco de infectar outras pessoas. A
ideia é mantê-las no centro, diagnosticar rapidamente a doença, porque é importante
que Ébola seja diagnosticado nos primeiros cinco dias para que haja maior possibilidade
de cura.
Outro aspecto fundamental sobre o qual estamos a trabalhar
é procurar dar um pouco de dignidade a essas pessoas porque não é possível que muitas
dessas pessoas à procura de cura e tratamento permaneçam fora das estruturas sanitárias
e morram pelo caminho, longe de parentes e familiares e do lugar onde nasceram. Construir
centros sanitários a nível das aldeias é fundamental. Um desses centros está já activo
e estamos a construir outros nove, um deles estará activo já a partir dos próximos
dias na Libéria. Na Serra Leoa será aberto na próxima semana um Centro muito grande
para tratamento. Terá capacidade para 100 camas. E nos três países estamos a fazer
campanha de sensibilização em relação aos órfãos e tudo o que pode servir para dar
uma ajuda neste momento difícil”.
A organização internacional “Save
the Clindren” (Salvem as crianças) está a levar a cabo em várias cidades italianas
de 9 de Outubro a 16 de Novembro, uma campanha denominada Everyone (Cada um). O símbolo
è um balão vermelho com a escrita “salva-me”, para simbolizar a vida duma criança
que não devemos deixar fugir. O objectivo é sensibilizar, mobilizar e recolher fundos
para salvar a vida de crianças no mundo. Como forma de sensibilização Save the Clindren
instituiu numa das grandes praças de Roma uma aldeia experimental em que convida as
pessoas, adultos e crianças, a ser, simbolicamente, por um dia, operador da organização
na ajuda a crianças necessitadas.