2014-10-22 20:36:20

Padre Lombardi: Discurso final do Papa deu a chave de leitura do Sínodo


Cidade do Vaticano (RV) - Nunca no passado um Sínodo havia chamado tanto a atenção como o da Família, realizado nos dias passados no Vaticano. Também foi intenso o debate desencadeado entre as comunidades locais de fiéis sobre o tema que, evidentemente, apaixona pois é visto como fundamental na vida de todos. O nosso colega Alessandro Gisotti, do Programa Italiano, entrevistou o Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé sobre os trabalhos do Sínodo, o modo como foi vivido pelo Papa Francisco e o aspecto da comunicação nos trabalhos da assembléia sinodal:


Pe. Lombardi: “Me pareceu realmente uma experiência muito particular e muito diferente daquela dos Sínodos precedentes, porque – como foi dito e repetido e como o Papa Francisco explicou - esta vez tratou-se de uma etapa de um caminho que não constituiu um Sínodo fechado em si mesmo, um episódio concluído, mas um momento de um longo e aprofundado discernimento da Igreja como comunidade a caminho. E isto foi vivido intensamente. Entre outras coisas, o Papa escolheu justamente este itinerário complexo, porque aqui se trata de enfrentar temas muitos difíceis, muito apaixonantes, ligados à vida, à experiência da comunidade da Igreja em toda a sua dimensão: o Povo de Deus, os fiéis, os leigos e também os pastores como responsáveis por este caminho. Portanto se tratava de temas não especificamente doutrinais por assim dizer, mas doutrinais e pastorais conjuntamente. E isto tornou este Sínodo particularmente envolvente e particularmente seguido. Alguém fez inclusive um paralelo com o Concílio Vaticano II e este não é um paralelo fora da realidade. Como João XXIII, com o Concílio, colocou em caminho a Igreja universal, naturalmente, em horizontes muito mais amplos, que dizem respeito à sua vida em todas as suas dimensões; o Papa Francisco colocou em caminho a Igreja universal sobre um tema mais específico como o da família, que porém é extremamente envolvente. E o fez conseguindo envolver, graças também a este método complexo e articulado, a comunidade da Igreja em todos os seus níveis: começou com a consulta nas comunidades; depois envolveu o Colégio Cardinalício no Consistório; após todos os Presidentes das Conferências Episcopais com este Sínodo; depois se relança por parte das Conferências Episcopais nas comunidades em todo o mundo; e depois se retorna em um Sínodo Ordinário e portanto, com uma representação ampliada dos bispos e provavelmente também de observadores, de ouvintes que representam o conjunto da comunidade da Igreja. Portanto, um envolvimento da comunidade em caminho, em busca de temas que há muito tempo não conhecemos – não que tenham sido improvisados, foi bem outra coisa – mas que realmente pediam uma reflexão mais sistemática, mais aprofundada e comunitárias sobre sua natureza pastoral e doutrinal”.


RV: Este é o primeiro Sínodo de Francisco como Papa, obviamente como Cardeal havia participado de outros sínodos e também com papeis importantes. Como o senhor viu o Santo Padre neste Sínodo? O senhor teve, de algum modo, a possibilidade de trocar algumas palavras com ele sobre os andamentos dos trabalhos?


Pe. Lombardi:O Papa, neste Sínodo, seguiu uma linha muito precisa, que havia previsto, e que foi a de se pronunciar com a homilia de abertura, na Missa de abertura, e na primeira Congregação, e depois escutar. Quis escutar por todo o tempo, sem interferir pessoalmente, justamente para deixar o espaço da liberdade de expressão que ele muito, muito encorajou com o seu breve e forte pronunciamento na primeira Congregação Geral, convidando realmente todos a falar com total clareza, com total liberdade, sem ter a mínima preocupação daquilo que ele mesmo poderia pensar ou sentir. Quis garantir uma plena liberdade e isto foi muito, muito apreciado e se refletiu efetivamente sobre a dinâmica do Sínodo. Depois, ficou em silêncio até o discurso final de sábado à noite, em que tirou um pouco a linha da experiência espiritual do Sínodo como evento eclesial e espiritual. O fez com uma autoridade extraordinária. Acredito que efetivamente sem este discurso final do Papa de sábado à noite, e a homilia após na Beatificação de Paulo VI, mas sobretudo no discurso final de sábado à noite, o Sínodo teria ficado um pouco incompleto e não lido na chave da fé, que é aquela que verdadeiramente o inspirou e motivou na mente de Papa. Portanto, o Papa interveio no início e no fim: durante não interferiu. Porém, todos aqueles que tiveram que tratar com ele, sempre o encontraram extremamente sereno, mesmo nos momentos em que podia parecer que houvesse tensão ou discussão dentro do Sínodo. Isto nunca o perturbou. Ele sempre se manteve extremamente confiante na guia do Espírito – digamos assim – e portanto, na capacidade da comunidade da Igreja e do Sínodo em particular, de participar de uma busca espiritual, de uma busca do bem da Igreja, que no final, teria encontrado a sua orientação numa perspectiva correta e não em uma perspectiva simplesmente humana ou de tensões internas, mas seria reconduzido ao seu sentido, à sua natureza espiritual verdadeira pela ajuda do Senhor e ele, o Papa como guia, repropôs com autoridade a sua responsabilidade justamente pela condução, segundo a vontade de Deus, do caminho da Igreja. Este tema do discernimento espiritual, que tocou com profundidade no último discurso, permanece extremamente importante também para a continuação do processo do Sínodo. Esta é a verdadeira chave de leitura de todo o processo do Sínodo, e o Papa, que é um homem de fé, o vive nesta perspectiva e nesta chave. Por isto podemos ter a confiança de que o Sínodo alcançará, em todo o seu caminho, a uma meta positiva para a Igreja”.


RV: Qual é o seu parecer sobre a forma como foi acompanhado de fora o Sínodo, que despertou grande interesse mundial?


Pe. Lombardi: “O problema, do meu ponto de vista, é sempre aquele da profundidade com que se compreende o que esteja acontecendo e qual é o caminho da Igreja. O que geralmente falta é uma insuficiente compreensão a nível de fé, o que para a Igreja é essencial. O discurso final do Papa ajudou e deveria ajudar a todos a entrar neste nível de profundidade. Não se trata de avaliar o Sínodo do ponto de vista dos alinhamentos, do ponto de vista também do governo da Igreja por parte do Papa como um problema de caráter estratégico humano, mas se trata de entender que o Papa desejou que a Igreja se colocasse em caminho e a Igreja efetivamente colocou-se em um caminho de busca da vontade de Deus, à luz do Evangelho e à luz da fé, para encontrar respostas às questões mais vivas da família e em um certo sentido também da antropologia, da condição do homem e da mulher no mundo de hoje. Se colocou em caminho com uma liberdade e com uma capacidade de escuta recíproca muito, muito grande e também com uma grande confiança, sem temor. O peregrino que caminha buscando a vontade de Deus, num certo sentido, não sabe onde chegará – como Abraão que caminha guiado pelo Senhor – mas sabe que o Senhor o acompanha e portanto está confiante; sabe que irá na direção justa se continua a seguir confiantemente as indicações do Senhor com uma busca espiritual conduzida comunitariamente, mas sob a luz do Evangelho. Isto é aquilo que geralmente em uma visão externa vem a faltar, enquanto é extremamente importante que nós o tenhamos muito presente e que este seja justamente o espírito com o qual, agora, o caminho continue, com o qual o caminho sinodal continua entre um Sínodo e o outro, entre o Extraordinário e o Ordinário. Eu observaria também que agora, graças ao fato de que todos os Presidentes das Conferências Episcopais participaram deste Sínodo Extraordinário e que estiveram, portanto, também envolvidos pessoalmente nesta experiência tão intensa, é muito provável que o relançar da reflexão seja profundo, seja eficaz, seja realmente articulado em todas as conferências episcopais guiadas por pessoas que foram tocadas pessoalmente por esta experiência, e que portanto, se chegue, com uma experiência comunitária muito mais ampla e profunda, ao próximo Sínodo Ordinário do ano vindouro, como o Papa deseja”. (JE)








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