Belo Horizonte (RV) - Os recados das urnas são difusos e desenham uma diversidade
que tem de tudo. Incluem aspectos contraditórios que merecem análises e debates, não
apenas dos cientistas políticos com suas inestimáveis reflexões. Outros, também, partindo
de seus lugares próprios e do direito à livre manifestação, contribuem muito. Não
é simples e fácil produzir uma síntese dessas mensagens. Até parece ser impossível
tal empreitada. As razões que se entrelaçam, as irracionalidades, o desejo desarvorado
de poder, contradições, motivações importantes, sonhos de melhorias, até mesmo o espírito
de torcida próprio no âmbito dos esportes, desenham aprendizados. É possível constatar,
pelo menos, a lição de que para ser vitorioso é preciso se qualificar melhor, não
andar de “salto alto” e respeitar o adversário.
Na política não é fácil fazer
distinções, nem ter garantias de que o dito é sincero, fundamentado na verdade e com
a única meta de melhorar a vida de todos, particularmente dos mais sofridos. Especificamente
no que diz respeito à política partidária, salvaguardado o sentido de sua importância
e o reconhecimento de sua necessidade, é preciso maior enraizamento da ética e de
um mínimo de moralidade, para que sua tarefa seja cumprida. Sem esses fundamentos,
torna-se difícil alcançar o que é sério e respeitoso para com o bem comum, reverente
com a dignidade de cada pessoa. Continuam particularmente prejudicados aqueles que
sofrem com tratamentos indignos e injustos, cidadãos ignorados por quem esbanja e
usufrui, doentiamente, de benesses, privilégios justificados pela lógica da diferença.
Seguir
essa lógica é contribuir para aumentar sempre mais a brecha entre as pontas do cenário
social e cultural, uma configuração perversa e inaceitável. Ora, a nobreza própria
da política e seu estatuto maior é o bem comum. Isto significa agir sempre a partir
da opção preferencial pelos pobres, em vez de simplesmente se orientar pela superficialidade
e comprometimentos de ideologias partidárias. Estas, não raramente, são medíocres
no que se refere à compreensão da dignidade humana, da cidadania, dos direitos, justiça
e deveres. Geram a insatisfação que pode ser constatada na resposta dada pelo eleitor.
As urnas mandam recados diversos.
É curioso perceber que, de um lado, há um
movimento que pode ser interpretado como clamor por mudanças, que não devem ser adiadas
e nem descansar no “berço esplêndido” das promessas. No entanto, apesar desse desejo,
foram reconduzidos ao poder grupos familiares que não representam inovação política
e indicam apenas o caminho da repetição do que tem sido pouco proveitoso para o bem
comum. Assim, embora importante, principalmente quando se considera a governabilidade,
não é suficiente apenas analisar o número maior de cadeiras conquistadas pelas siglas
partidárias. Os resultados das urnas revelam o recado de que é ainda muito forte o
poder do dinheiro, capaz de eleger quem não tem força própria para ser representante
do povo.
Na listagem das mensagens vindas das eleições, é preciso atentar-se
para a alta percentagem de abstenções e votos anulados, evidências de um grande número
de pessoas em protesto ou ancoradas na indiferença. Trata-se de algo grave em momento
tão decisivo para o futuro da nação. Um fenômeno que merece esforço de todos para
ser compreendido. Certas surpresas indicam a candidatos que não se pode pensar no
eleitorado como massa de manobra que formam “currais eleitorais”. Outras revelam fenômenos
de votação que, lamentavelmente, foram escolhidos não por sua competência e condição
de representar, mas pela simpatia ou mesmo pelo uso estratégico de deboches. As urnas
sinalizam que é preciso operar mudanças urgentes e radicais.
A cidadania exige
um tratamento mais adequado diante das necessidades do povo, com repúdio à deselegância
de ataques pessoais e desconstrução pouco civilizada de adversários. É preciso reconhecer
que o eleitorado pode fazer sua escolha considerando o nome que, para além da sigla
partidária, tem credibilidade e competência. As análises das variadas mensagens das
eleições são interessantes para o amadurecimento cidadão, na indicação de rumos e
metas para candidatos. Trata-se de exercício indispensável na corrida eleitoral de
novo em curso, como investimento na escolha de caminhos capazes de conduzir a sociedade
em novas direções. Embora em terreno contraditório e movediço, vive-se a oportunidade
de aprender importantes lições com os recados das urnas.
Dom Walmor Oliveira
de Azevedo Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte