2014-08-22 20:00:09

Pe. Samir: "O Islã não é isto!"


Beirute (RV) - A exasperação dos conflitos na Síria e no Iraque em nome do Califado Islâmico, com episódios de particular crueldade publicizados e espetacularizados, como a decapitação do jornalista estadunidense. Mas também o crescimento das violências em países africanos como a Nigéria, perpetradas contra quem não adere à Sharia’. A expansão da ideologia extremista islâmica tem levantado inúmeros questionamentos e causado apreensão em todos o mundo. A Rádio Vaticano conversou sobre isto com o Padre jesuíta egípcio Samir Khalil Samir, Docente de História da Cultura Árabe e islamologia na Universidade Saint Joseph, de Beirute:

Pe. Samir: “Hoje, o problema é político. A guerra na Síria, no início, era uma guerra dos sírios que protestavam contra um regime ditatorial; mas logo após, cerca de dois meses, entraram pessoas de todo o mundo islâmico, em particular vindas da península arábica, para fazer guerra porque os governantes eram xiitas e alauítas. O problema, portanto, é dentro do Islã, inicialmente, porque existe uma coisa que sempre volta, o fato dogmático de dizer: “Quem não pertence à autenticidade islâmica deve ser eliminado”, o “kafir”. “Kafir” era uma palavra que se aplicava aos não-crentes em Deus, mas depois se ampliou; e declarar o outro “kafir” – em árabe se diz ‘takfír’ - é uma das pragas do Islã moderno, isto é, o fato de dizer que o outro não é um autêntico muçulmano e por isto deve ser eliminado”.

RV: Mas como se explica este agravamento do fundamentalismo, do extremismo deste pensamento islâmico? Digamos que em qualquer modo, ocorrendo menos um processo cultural, houve este renascimento da violência, do desejo de poder?

Pe. Samir: “Sim! Cultural e político. A crise é abrangente: tem a pobreza, a ignorância... ao mesmo tempo em que existe uma crise de civilização no Ocidente, que toma, porém, a forma de um neo-paganismo...porém, é outro problema...”.

RV: Hoje, talvez, também seja uma época em que se está conhecendo um momento baixo da humanidade: teríamos necessidade, realmente, de um novo humanismo....

Pe. Samir: “Sim, atingimos a bestialidade mais feroz na história do Islã. Nunca havíamos chegado a este ponto de barbárie. A pergunta é: isto é o Islã? Ou é um desvio? Certamente, tem origem na tradição islâmica. Mas por outro lado, certamente não se pode dizer que o Islã seja isto. Isto é, é um desvio do Islã: pensam em realizar o “califado”, a época famosa do IX-X século até o XIII, e é um erro. Muitos muçulmanos dizem isto, repetem; os grandes pensadores são contrários a isto. O drama é que os muçulmanos não ousam fazer uma autocrítica: isto é, o povo segue em silêncio. Não vi aquilo que também o Comitê para o Diálogo Inter-religioso do Vaticano, no seu documento, na página que escreveu na terça-feira, 12 de agosto, diz: existem coisas inadmissíveis! Citam 11 pontos contrários aos direitos humanos e se expressam em termos muito fortes! É o documento mais claro que conheci, que não faz uso de expressões diplomáticas: é muito equilibrado, mas forte. E diz: até quando vocês calarão? Que os Imames falem! E não somente os Imames: a multidão, o povo muçulmano vai para as ruas quando se trata de uma “coisinha” política dos outros, contra os outros; mas quando se trata destas questões islâmicas, pensam que não está bem, mas não vão as ruas por isto”.

RV: Qual pode ser o caminho para sair de tudo isto?

Pe. Samir: “Uma colaboração com o mundo ocidental; ajudá-los a dar um passo em direção a uma visão mais universal. Por exemplo, quais são os direitos do homem? Se pudéssemos aplicá-la realmente, já seria uma maravilha! Acredito que se possa fazer, mas se deve proceder – para usar uma expressão espiritual – a uma conversão quer no Ocidente, quer no mundo islâmico. No Ocidente, para ser menos materialista, porque o que guia todo o sistema é o dinheiro, o poder, o domínio. Uma visão comum, humanística – serão necessários decênios para se chegar a isto..”. (JE)








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