Homilia da Missa final da viagem à Coreia (Seul - 18 agosto)
Queridos irmãos e irmãs!
A minha estadia na Coreia está a chegar ao fim e
não posso deixar de agradecer a Deus pelas muitas bênçãos que concedeu a este amado
país e, de maneira particular, à Igreja na Coreia. De entre tais bênçãos, conservo
de modo especial a experiência, que vivemos juntos nestes últimos dias, da presença
de tantos jovens peregrinos originários de todas as partes da Ásia. O seu amor por
Jesus e o seu entusiasmo pela propagação do seu Reino foram uma inspiração para todos.
A minha visita culmina agora nesta celebração da Santa Missa, em que imploramos
de Deus a graça da paz e da reconciliação. Esta oração reveste-se de particular ressonância
na Península Coreana. A Missa de hoje é, sobretudo e principalmente, uma oração pela
reconciliação nesta família coreana. Jesus diz-nos, no Evangelho, como é poderosa
a nossa oração, quando dois ou três se reúnem em seu nome para pedir qualquer coisa
(cf. Mt 18, 19-20). Muito mais o será, quando um povo inteiro eleva a sua instante
súplica ao céu!
A primeira leitura apresenta a promessa feita por Deus de
restaurar na unidade e na prosperidade um povo disperso pela desgraça e a divisão.
Para nós, como para o povo de Israel, é uma promessa cheia de esperança: indica um
futuro que Deus está desde já a preparar para nós. Mas esta promessa está inseparavelmente
ligada com um mandamento: o mandamento de retornar a Deus e obedecer de todo o coração
à sua lei (cf. Dt 30, 2-3). O dom divino da reconciliação, da unidade e da paz está
inseparavelmente ligado à graça da conversão: trata-se de uma transformação do coração,
que pode mudar o curso da nossa vida e da nossa história, como indivíduos e como povo.
Nesta Missa, naturalmente escutamos essa promessa no contexto da experiência
histórica do povo coreano, uma experiência de divisão e conflito que já dura há mais
de 60 anos. Mas o premente convite de Deus à conversão chama também os seguidores
de Cristo na Coreia a examinarem-se sobre a qualidade da sua contribuição para a construção
duma sociedade justa e humana. Chama cada um de vós a reflectir sobre o testemunho
que dá, como indivíduo e como comunidade, de compromisso evangélico com os desfavorecidos,
os marginalizados, com aqueles que não têm emprego ou estão excluídos da prosperidade
que muitos usufruem. Chama-vos, como cristãos e como coreanos, a repelir com firmeza
uma mentalidade fundada sobre a suspeita, a confrontação e a competição, optando antes
por favorecer uma cultura plasmada pelo ensinamento do Evangelho e pelos mais nobres
valores tradicionais do povo coreano.
No Evangelho de hoje, Pedro pergunta
ao Senhor: «Quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?»
O Senhor responde: «Digo-te, não até sete vezes, mas até setenta vezes sete» (Mt 18,
21-22). Estas palavras tocam o coração da mensagem de reconciliação e de paz indicada
por Jesus. Obedientes ao seu mandamento, pedimos diariamente ao nosso Pai do Céu que
perdoe os nossos pecados, «assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido». Mas,
se não estivéssemos prontos a fazer o mesmo, como poderíamos honestamente rezar pela
paz e a reconciliação?
Jesus pede-nos para acreditar que o perdão é a porta
que leva à reconciliação. Quando nos manda perdoar aos nossos irmãos sem qualquer
reserva, pede-nos para fazer algo de totalmente radical, mas dá-nos também a graça
de o cumprir. Aquilo que, visto duma perspectiva humana, parece ser impossível, impraticável
e às vezes até repugnante, Jesus torna-o possível e frutuoso com a força infinita
da sua cruz. A cruz de Cristo revela o poder que Deus tem de superar toda a divisão,
curar toda a ferida e restaurar os vínculos originais de amor fraterno.
Assim,
a mensagem que vos deixo no final da minha visita a Coreia é esta: tende confiança
na força da cruz de Cristo; acolhei nos vossos corações a sua graça reconciliadora
e partilhai-a com os outros. Peço-vos que deis um testemunho convincente da mensagem
reconciliadora de Cristo nas vossas casas, nas vossas comunidade e em todas as esferas
da vida nacional. Estou confiante que vós, num espírito de amizade e cooperação com
os outros cristãos, com os seguidores de outras religiões e com todos os homens e
mulheres de boa vontade que têm a peito o futuro da sociedade coreana, sereis fermento
do Reino de Deus nesta terra. Então as nossas orações pela paz e a reconciliação subirão
até Deus de corações mais puros e, pelo dom da sua graça, hão-de alcançar aquele bem
precioso por que todos suspiramos. Por isso, rezemos pelo aparecimento de novas
oportunidades de diálogo, encontro e superação das diferenças, por uma incessante
generosidade na prestação de assistência humanitária aos necessitados, e por um reconhecimento
sempre mais vasto de que todos os coreanos são irmãos e irmãs, membros duma única
família e dum único povo.
Antes de deixar a Coreia, quero agradecer à Senhora
Presidente da República, às Autoridades civis e eclesiásticas e a todos aqueles que
de alguma forma ajudaram a tornar possível esta visita. De modo especial, quero dirigir
uma palavra de gratidão pessoal aos sacerdotes da Coreia, que diariamente se empenham
no serviço do Evangelho e na edificação da fé, da esperança e da caridade do Povo
de Deus. A vós, como embaixadores de Cristo e ministros do seu amor de reconciliação
(cf. 2 Cor 5, 18-20), peço que continueis a construir laços de respeito, confiança
e cooperação harmoniosa nas vossas paróquias, entre vós e com os vossos Bispos. O
vosso exemplo de um amor sem reservas ao Senhor, a vossa fidelidade e dedicação ao
ministério, bem como o vosso empenhamento caritativo com os necessitados contribuem
enormemente para a obra de reconciliação e paz neste país.
Queridos irmãos
e irmãs, Deus chama-nos a voltar para Ele e a escutar a sua voz, e promete estabelecer-nos
sobre a terra numa paz e prosperidade maiores, como os nossos antepassados nunca conheceram.
Possam os seguidores de Cristo na Coreia preparar a alvorada daquele dia novo em que
esta terra do calmo amanhecer gozará das mais ricas bênçãos divinas de harmonia e
de paz! Ámen