Homilia do Papa Francisco na Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo
Cidade do Vaticano (RV) - Segue, na íntegra, a homilia do Papa Francisco na
missa celebrada na tarde desta quinta-feira, 19 de junho, Solenidade do Santíssimo
Corpo e Sangue de Cristo, na Basílica Papal de São João de Latrão, em Roma.
"O
Senhor, teu Deus, (...) te alimentou com o maná, que tu não conhecias" (Dt 8,3).
Estas
palavras de Moisés fazem referência à história de Israel, que Deus fez sair do Egito,
da condição de escravidão, e por quarenta anos o guiou no deserto para a terra prometida.
Uma vez estabelecido na terra, o povo eleito atingiu uma autonomia, um bem-estar,
e correu o risco de esquecer as tristes vicissitudes do passado, superadas graças
à intervenção de Deus e à sua infinita bondade. Então as Escrituras exortam a recordar,
a fazer memória de todo o caminho feito no deserto, no tempo da penúria e do desconforto.
O convite de Moisés é o de voltar ao essencial, à experiência de total dependência
de Deus, quando a sobrevivência foi colocada em suas mãos, para que o homem compreendesse
que "não vive apenas de pão, mas de tudo aquilo que procede da boca do Senhor" (Dt
8,3).
Além da fome material o homem leva consigo outra fome, uma fome que não
pode ser saciada com comida comum. É a fome de vida, fome de amor, fome de eternidade.
O sinal do maná – como toda experiência do êxodo – continha em si também esta dimensão:
era figura de uma comida que sacia esta fome mais profunda que existe no homem. Jesus
nos dá este alimento, assim, é Ele mesmo o pão vivo que dá vida ao mundo. Seu Corpo
é verdadeira comida sob a espécie de pão; seu Sangue é verdadeira bebida sob a espécie
de vinho. Não é um simples alimento com o qual sacia nossos corpos, como o maná; o
Corpo de Cristo é o pão dos últimos tempos, capaz de dar vida, e vida eterna, porque
a substancia deste pão é Amor.
Na Eucaristia se comunica o amor do Senhor por
nós: um amor tão grande que nos nutre com Si mesmo; um amor gratuito, sempre à disposição
de todos os famintos e necessitados de restaurar as próprias forças. Viver a experiência
da fé significa deixar-se alimentar pelo Senhor e construir a própria existência não
sobre bens materiais, mas sobre a realidade que não perece: os dons de Deus, sua Palavra
e seu Corpo.
Se olharmos ao nosso redor, daremos conta de que existem tantas
ofertas de alimento que não vem do Senhor e que aparentemente satisfazem mais. Alguns
se nutrem com o dinheiro, outros com o sucesso e com a vaidade, outros com o poder
e com o orgulho. Mas a comida que nos alimenta verdadeiramente e que nos sacia é somente
aquela que nos dá o Senhor! O alimento que nos oferece o Senhor é diferente dos outros
e talvez não nos pareça assim saboroso como certas iguarias que nos oferecem o mundo.
Agora sonhamos com outros alimentos, como os hebreus no deserto que choravam a carne
e as cebolas que comiam no Egito, mas esqueciam que aqueles alimentos eram comidos
na mesa da escravidão. Eles, naqueles momentos de tentação, tinham memória, mas uma
memória doente, uma memória seletiva. Cada um de nós, hoje, pode se perguntar:
e eu? Onde quero comer? Em que mesa quero me alimentar? Na mesa do Senhor? Desejo
comer comidas gostosas, mas na escravidão? Qual é minha memória? Aquela do Senhor
que me salva ou a do alho e das cebolas da escravidão? Com que lembrança eu satisfaço
minha alma?
O Pai nos diz: "Te alimentei com o maná que tu não conhecias".
Recuperemos a memória e aprendamos a reconhecer o pão falso que ilude e corrompe,
porque fruto do egoísmo, da auto-suficiência e do pecado.
Daqui a pouco, na
procissão, seguiremos Jesus realmente presente na Eucaristia. A Hóstia é nosso maná,
mediante o qual o Senhor nos dá a si mesmo. A Ele nos dirigimos com fé: Jesus, defende-nos
das tentações do alimento mundano que nos faz escravos; purifica nossa memória, para
que não se torne prisioneira da seletividade egoísta e mundana, mas seja memória viva
da tua presença ao longo da história do teu povo, memória que faz "memorial" do teu
gesto de amor redentor. Amém. (CAS)