Rio de Janeiro (RV) - Em nossa Assembleia Geral dos Bispos do Brasil, realizada
em Aparecida e concluída no dia 9 de maio p.p., entre tantas decisões e manifestações
tivemos uma muito importante: foi proclamado que teremos o Ano da Paz! A proposta
de iniciar no Advento deste ano e concluindo no Natal de 2015 é para que se tenha
mais tempo de preparar. Mas muitos bispos e arcebispos se manifestaram para que essa
atividade começasse logo devido ao clima de intensa violência e intolerância que grassa
no mundo, e, consequentemente em nosso país. O nosso regional Leste 1 teve essa
iniciativa quando convidou a todos para que durante a Sexta-feira Santa o clima de
penitência, oração e jejum fosse uma ocasião de pedir ao Senhor para que o sacrifício
redentor de Jesus na Cruz fosse acolhido pelas pessoas de boa vontade e assim tivessem,
com os corações transformados, oportunidade de serem arautos da paz. É claro
que não se pensa em uma paz que nos tire da realidade, como uma alienação ou que não
se preocupe com os direitos da pessoa. É justamente nessa direção que caminhamos.
Porém, a sociedade violenta está colocando as pessoas desconfiadas umas das outras.
Basta ver as chacinas que ocorrem e linchamentos vários de inocentes levados pela
intolerância. O mundo violento que nos chega através de fotos de cristãos crucificados
ou chacinados, e com fome, que mata em tantas partes do planeta, assim como a fuga
de suas pátrias por perseguições políticas, religiosas ou culturais deve nos fazer
pensar sobre que tipo de sociedade estamos construindo e onde queremos chegar. A situação
de pobres e de pessoas que os manipulam clama aos céus pelas injustiças e maldades. Será
que não temos solução para esses problemas e situações? A liberdade da pessoa e o
seu ir e vir, assim como o direito às manifestações pacíficas fazem parte de nosso
progresso político. Embora em algumas partes do mundo isso não exista. Este tempo
de tantas controvérsias e tantos questionamentos (a famosa mudança de época) deve
nos encontrar muito unidos em nossa caminhada e responsáveis pela nossa missão. É
justamente neste tempo que somos chamados a ser testemunhas que a fé nos faz viver
com muito mais responsabilidade a vida de cada dia, acolhendo as dores das pessoas
que estão ao nosso lado. Sermos testemunhas de que é possível viver a unidade
em meio à diversidade e, ao mesmo tempo, amar-nos uns aos outros como Jesus nos pediu
pode fazer a diferença. Nesses dias, a liturgia pascal nos tem questionado com relação
a isso. Sabemos que um “reino dividido” não subsiste e, portanto, também não
transforma. Por isso mesmo Jesus pediu que “fôssemos um” para que o mundo creia. O
carinho do relacionamento, mesmo entre questões de que discordamos, é um sinal que
as pessoas percebem. Quando Jesus pergunta se, ao seu retorno, ainda haverá fé
sobre a terra, podemos nos perguntar se também estaremos unidos na caridade. O Papa
Francisco, em seu discurso aqui no Rio de Janeiro aos Bispos do Brasil, perguntou
se a nossa Igreja ainda tinha capacidade de “aquecer os corações”. E constatamos que
tinha! Vimos isso com nossos olhos! Eis agora um momento novo em que isso pode
acontecer. Eis agora a oportunidade de testemunharmos que em Cristo “somos um” e estamos
a serviço da construção de um “mundo novo” alicerçados na ressurreição de Jesus. Essa
é a força que vêm da ação Espírito Santo em nossas vidas: a comunhão entre nós. É
justamente no momento da crise profunda ou das grandes provações pelas quais passamos
que somos provados, como “ouro no cadinho”, para saber as mais profundas intenções
que temos no coração. São momentos importantes, em que se projetam o nosso futuro
e o da sociedade. Tenho plena certeza de que, diante de momentos tão críticos
da sociedade, e olhando o exemplo do Papa Francisco, nós iremos adiante com coragem
e ânimos renovados, cumprindo com carinho nossa missão e unidos em todos os momentos. É
a oportunidade que temos, como discípulos missionários, de anunciar, sem medo, a alegria
do Evangelho que transforma. Que Nossa Senhora de Fátima, cuja festa celebramos
na semana que passou, interceda por nós e nos inspire uma vida de oração intensa pela
paz no mundo, partindo da paz em nossos corações desarmados do ódio e dos rancores. Embora
haja uma época para celebrar o Ano da Paz, ela existe para lembrar que todos os dias
é tempo de construí-la com a graça de Deus em nossas vidas e em nossa sociedade. Eis
o desafio deste tempo de mudança de época! Eis o tempo oportuno! Lancemos as redes
em águas profundas obedecendo ao Senhor que assim nos manda fazê-lo. Como Pedro no
Evangelho, eu também conclamo a todos: vou pescar. Gostaria de ouvir a resposta apostólica:
“vamos contigo”!
Orani João, Cardeal Tempesta, O.Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ