Rio de Janeiro - (RV) - A Quaresma, que tem como finalidade não só preparar
a Igreja para a Páscoa, mas fazer com que o mistério da Páscoa seja vivido já na sua
primeira vertente de paixão, pode ser considerada, sob a guia dos textos litúrgicos,
como subida com Cristo para Jerusalém, a fim de partilhar o seu mistério pascal. Nos
textos bíblicos deste tempo litúrgico volta, mais uma vez, este aspecto fascinante. “Caminhar
a Jerusalém” não significa, para Jesus, apenas uma peregrinação à cidade santa, mas
tem um preciso significado messiânico e teológico, que os evangelistas, com diferentes
acentos, colocam em relevo. Jesus vai a Jerusalém para aí cumprir a vontade do Pai.
Em Jerusalém, acontecerá o encontro decisivo entre Jesus e o sinédrio judaico, totalmente
incapaz de se abrir à luz do evangelho, porque obcecado pelo formalismo religioso
e pela paixão. Por isso, decidirá “matar Jesus” (Jo 11,53). Os apóstolos têm dificuldade
para compreender o significado desse acontecimento repetidamente anunciado por Jesus.
Também eles estão impregnados de messianismo terreno e pensam nos primeiros lugares
do Reino. Jesus, então, durante a viagem para Jerusalém, vai iniciando-os gradualmente
no mistério da cruz, com o ensinamento e a experiência da transfiguração. A sua palavra
ilumina o significado do evento, a transfiguração antecipa a experiência pascal. Também
para a comunidade cristã, a Quaresma constitui-se em peregrinação a Jerusalém, isto
é, a morte e ressurreição de Cristo. A Quaresma, portanto, é um novo êxodo, um retorno
do exílio para Jerusalém, isto é, para a Páscoa de Cristo, que nos edifica como Igreja. Seguindo
este itinerário, chega-se com fé mais iluminada à Semana Santa ou “grande semana”.
São dias em que a liturgia celebra, passo a passo, os últimos acontecimentos da vida
terrena de Jesus. Por isso, diremos com Paulo VI: “se há uma liturgia, deveria encontrar-nos
juntos, atentos, solícitos e unidos para uma participação plena, digna, piedosa e
amorosa, esta é a liturgia da grande semana. Por um motivo claro e profundo: o mistério
pascal, que encontra na Semana Santa a sua mais alta e comovida celebração, não é
simplesmente um momento do ano litúrgico; ele é a fonte de todas as outras celebrações
do próprio ano litúrgico, porque todas se referem ao mistério da nossa redenção, isto
é, ao mistério pascal”. Por isso, é impensável que um católico não “faça a Páscoa”,
não celebre a Páscoa, a não ser por razões de dificuldades de locomoção ou falta de
celebração local. Somos chamados a viver intensamente esses dias. A Semana Santa,
chamada popularmente de “semana maior”, começa com o Domingo de Ramos da Paixão do
Senhor. É a semana em que recordamos a Paixão, a Morte e a Ressurreição de Nosso Senhor
Jesus Cristo, ato supremo da redenção da humanidade. Domingo de Ramos: Neste
domingo, aclamamos Jesus como o Messias que vem realizar as promessas dos profetas
e instaurar definitivamente o Reino de Deus, da paz, da fraternidade e do amor. Vem
nos salvar. Jesus, humildemente, entra em Jerusalém montado em um manso jumentinho,
pois ele é o príncipe da paz. Não entra com cavalaria de guerra, pois o cavalo é
instrumento bélico, expressão da força e do poderio militar da época. Foi aclamado
e reconhecido, por muitos, como o rei dos reis. Os ramos são sinais e testemunho da
fé em Cristo e na sua vitória pascal. Neste domingo é feita a coleta do gesto concreto
da Campanha da Fraternidade, a ser entregue nas paróquias. Esta coleta é fruto da
penitência quaresmal. Tríduo Pascal (Quinta, Sexta e Sábado): O Tríduo Pascal
da Paixão e Ressurreição do Senhor começa com a Missa vespertina da Última Ceia, possui
o seu centro na Vigília Pascal, “a mãe de todas as vigílias (S. Agostinho)” e encerra-se
com as Vésperas do Domingo da Ressurreição. Missa da Ceia do Senhor (Quinta-feira
Santa): Recorda-nos a Ceia do Senhor, a última ceia, quando Ele prediz sua Paixão
e Morte, e despede-se dos apóstolos. Neste dia, Jesus instituiu a o sacramento da
Eucaristia. Na celebração, o sacerdote lava os pés de doze pessoas convidadas, na
tradicional cerimônia chamada “Missa do Lava-pés”, recordando o gesto de Jesus de
lavar os pés de seus discípulos e a dizer: “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei”,
significando que devemos servir uns aos outros com total humildade, gratuidade e amor.
Ao final da missa se faz a Transladação do Santíssimo Sacramento e, em seguida, a
Adoração. Paixão do Senhor (Sexta-feira Santa.): Neste dia a Igreja recomenda
o jejum e abstinência total de carne, e acompanha em silêncio os passos de Jesus em
seu sofrimento e condenação até sua entrega total com a morte na cruz. Não se celebra
missa ou qualquer sacramento e os fiéis comungam as sagradas hóstias consagradas na
Quinta-feira Santa. A celebração central deste dia é a das 15 horas, quando, segundo
a tradição, Jesus morreu. Esta celebração se divide em quatro partes: Liturgia da
Palavra, Oração Universal, Adoração do Senhor na Cruz e Comunhão. É dia de total silêncio
e reflexão. Vigília Pascal (Sábado Santo): Celebramos a Vigília Pascal no
sábado à noite. A Ressurreição de Jesus é o milagre do começo da vida, vida nova a
partir da morte. A ressurreição, além de realizar as promessas das Escrituras Sagradas,
é prova definitiva de que Jesus é Deus. O Círio Pascal, aceso com o fogo novo,
luz que surge das trevas, representa Cristo ressuscitado, vitorioso sobre a morte
e Senhor da história, luz que ilumina o mundo. Na vela, estão gravadas as letras gregas
Alfa e Ômega, que querem dizer: “Deus é o princípio e o fim de tudo”. A rica celebração
da Palavra reaviva em nós a história da salvação, e o rito do Batismo nos faz renovar
as promessas batismais. A Eucaristia festiva coroa essa grande vigília. Domingo
da Páscoa do Senhor: Páscoa significa passagem. A Páscoa de Cristo é sua passagem
da morte na cruz para a ressurreição. É sua vitória plena e definitiva sobre a morte
e todos os males. Desse modo, a ressurreição de Jesus mudou totalmente a história
da humanidade e de cada ser humano. A páscoa cristã é a vida nova em Cristo ressuscitado.
Portanto, busquemos esta vida nova – vida reconciliada com Deus e com o próximo. Busquemos
também nesta semana intensificar ainda mais a nossa oração e a nossa participação
dos eventos centrais na vida de Jesus: Paixão, Morte e Ressurreição. É o grande grito
que nos faz cumprimentar a todos: Cristo Ressuscitou! “Verdadeiramente ressuscitou”. Convido
todos os meus diocesanos a viverem intensamente a Semana Santa. Serão momentos de
passagem de mortificação, de associação de nosso coração à morte de Cristo, para que,
celebrando a Sua Gloriosa Ressurreição, o centro de nossa fé, podermos dizer como
a Sagrada Escritura: “Se com Cristo nós morremos, com Ele nós ressuscitaremos!”. Abençoada
Semana Santa para todos e que vivamos de maneira pura e graciosa os mistérios do Senhor
Jesus! Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ