Belo Horizonte (RV) - O compromisso com a promoção e o respeito à dignidade
humana é a possibilidade real de mudanças nos rumos da sociedade contemporânea e nos
cenários que envergonham a humanidade. A primazia da dignidade das pessoas é a meta
mais importante na vivência séria da cidadania. Lamentavelmente, a luminosidade da
inteligência humana contracena e é obscurecida por irracionalidades, que submetem
homens e mulheres a condições degradantes, ofensivas e prejudiciais à liberdade e
autonomia. É preciso promover mudanças e uma nova compreensão capaz de impedir que
a humanidade caminhe para o caos. Vivemos um tempo propício para isso, a Quaresma,
quando a Igreja Católica convida a humanidade para ouvir Deus, fixando o olhar em
Cristo Jesus, o Salvador e Redentor, preparando a celebração da Páscoa.
Exercício
de espiritualidade, o caminho quaresmal é marcado pela experiência de amorosa escuta
da Palavra de Deus. Também caracteriza-se por uma disposição para rever gestos e assumir
atitudes mais condizentes com a dignidade humana. Trata-se de oportunidade singular
para fazer crescer a solidariedade e a fraternidade, promovendo a qualificação pessoal
e comunitária. A conversão do coração possibilita a cada um assumir uma conduta digna,
percebendo todos como filhos e filhas de Deus, irmãos uns dos outros. No itinerário
quaresmal, a Igreja Católica enriquece o horizonte com a promoção da Campanha da Fraternidade
que, neste ano, é iluminada pela Palavra de Deus com o lema “É para liberdade que
Cristo nos libertou”, da Carta de São Paulo aos Gálatas. Assim, convoca todos para
a coragem de reconhecer, compreender e atuar no horizonte da gravíssima situação gerada
pelo tráfico humano.
“Fraternidade e tráfico humano” é o tema da Campanha que
focaliza uma realidade chamada pelo Papa Francisco de “atividade ignóbil, uma vergonha
para nossas sociedades que se dizem civilizadas”. O texto base da Campanha da Fraternidade
2014, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também sublinha o absurdo
desse atentado contra os filhos e filhas de Deus, limitando suas liberdades, desprezando
sua honra, agredindo seu amor próprio pela exploração de sua vulnerabilidade social
e econômica. Os traficantes geralmente são aliciadores que se aproximam das vítimas
e de seus familiares, agindo como se fossem amigos. A pessoa é abordada com uma oferta
irrecusável de trabalho, mas, levada a lugares distantes, é escravizada e torna-se
prisioneira.
Esses aliciamentos se camuflam pelo recrutamento de pessoas para
atividades diversas, a partir da promessa de um futuro promissor em diferentes carreiras,
como as de modelo, jogador de futebol, enfermeiras, babás, garçonetes, cortador de
cana, dançarinas, pedreiro e tantas outras. As vítimas são homens e mulheres, crianças
e adolescentes. São reais as histórias de jovens aliciadas por redes de prostituição,
levadas para lugares distantes de suas famílias, com a promessa de altos salários
semanais, mas que são mantidas em cativeiro, em péssimas condições.
É hora
de colocar cotidianamente na pauta de nossas ações a questão do tráfico humano, dedicando
maior atenção aos acontecimentos para efetivamente oferecermos nossa contribuição
cidadã aos organismos estatais. Também é preciso maior cooperação entre países na
tarefa de se investir na solução desse grave problema. Torna-se cada vez mais urgente
a união de esforços para fortalecer o enfrentamento dessas organizações criminosas
que, entrelaçadas, se tornam sempre mais eficientes. O passo importante nesse enfrentamento
será sempre o crescimento da consciência da primazia da dignidade humana.
Dom
Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte