2014-02-15 10:45:34

Editorial: Coerência já!


RealAudioMP3 Cidade do Vaticano (RV) – Coerência entre nossa vida e aquilo que professamos.

Esta semana, o Papa Francisco fez duas claras referências para a necessidade de viver dia após dia aquilo que celebramos na Eucaristia.

Na Audiência Geral, o Pontífice aprofundou o aspecto da nossa relação com este Sacramento, questionando por exemplo se vamos à missa simplesmente por se tratar de um rito ou se esta participação realmente nos envolve e nos transforma. Para analisar esta relação, sugeriu como indício justamente o nosso modo de olhar e considerar os outros. Quando participamos da missa, nos encontramos com homens e mulheres de todo gênero: jovens, idosos, crianças, pobres e abastados, originários do lugar ou estrangeiros, sós ou acompanhados.... Celebrando a Eucaristia, devemos então nos perguntar se sentimos todas essas pessoas como irmãos e irmãs, se somos capazes de reconhecer nelas a face de Jesus.

Somos irmãos somente durante a missa? E fora dela, como tratamos o outro? Amamos nossos irmãos como Jesus os amou e como Ele nos pede?, perguntou Francisco, que citou a realidade mais próxima a ele, a cidade de Roma. A capital italiana e suas redondezas viveram dias ininterruptos de chuva. Muitos bairros ficaram alagados, e os prejuízos foram grandes.

O Papa insistiu: eu que vou à missa, me preocupo em ajudar? Em rezar por essas pessoas? Ou na saída da missa me preocupo em fofocar, comentando como a pessoa ao meu lado estava vestida...

Este modo de comunicar de Francisco é muito eficaz, pois fala de uma realidade que diz respeito diretamente ao seu interlocutor. Por exemplo, poderíamos fazer a mesma pergunta mudando de contexto. Na nossa realidade brasileira, um dos desafios mais latentes hoje é a violência. Seguindo o Papa, poderíamos questionar: como eu pretendo que o problema seja resolvido, criando duas sociedades, a dos homens de bem e a dos homens do mal? A dos virtuosos e a dos imprestáveis? Construindo muros cada vez mais altos, condomínios cada vez mais seguros, carros cada vez mais blindados?

O resultado desse tipo de mentalidade maniqueísta é o que o Papa chama de “cultura do descartável”, ou seja, os excluídos do sistema. E diante de um Estado omisso e de uma Justiça ineficiente, há a tentação de fazer justiça com as próprias mãos. E “o marginalzinho preso ao poste” passa a ser uma solução no país mais católico do mundo.

Outra expressão muito utilizada por Francisco é a “globalização da indiferença”. Isto é, o sofrimento do outro não me diz respeito, é perder a capacidade daquilo que desenvolveu Hannah Arendt em meio à experiência do totalitarismo. Vivemos o totalitarismo do eu e perdemos a capacidade de empatia, de entrar na dor do outro.

Talvez chegou a hora de uma análise um pouco mais aprofundada do país que somos e do país que queremos para poder resgatar os valores sobre os quais se deveria fundar uma nação que seja capaz de incluir, e não excluir. E neste processo, nós cristãos somos chamados em causa.

Em seu quase um ano de pontificado, Francisco cunhou inúmeras expressões que dão bem o sentido dos fiéis “de mentirinha”: cristãos de confeitaria, de tinturaria, de salão, cristãos que participam da missa como evento social.

São os mesmos cristãos que defendem a lógica de que “bandido bom é bandido morto”, e de que os verdadeiros criminosos são os defensores dos Direitos Humanos.

É fácil gostar do Papa e do seu sorriso, admirar seu jeito e suas atitudes, um pouco mais empenhativo, porém, é ouvir o que ele tem a dizer, que nada mais é aquilo que Jesus pregou. A coerência entre liturgia e vida é exigente, e requer perseverança, oração e graça. Requer também coragem, de ir avante, sempre. Caminhar mesmo em meio a dificuldades como esta, e superá-las.
(Bianca Fraccalvieri)







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