Rio de Janeiro (RV) - Estamos vivendo nestes dias a bela experiência do encontro
de bispos no Curso para Bispos no Centro de Estudos e Formação do Sumaré, aqui no
Rio de Janeiro. A alegria desse momento e a espiritualidade da vivência da oração
em clima de Espiritualidade nos fazem refletir a importância da vida espiritual em
meio a tantas situações pastorais e questões administrativas que temos que enfrentar
no dia a dia. Um dos temas é sobre os Bispos. Nestes dias de reflexão, pensei em alguns
trechos para minha reflexão pessoal, que compartilho abaixo. No bispo deve brilhar
a santidade da Igreja, pela piedade do seu agir pastoral e pela sua vida totalmente
iluminada pela vida de Jesus Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote, o "bom pastor que oferece
a sua vida pelas ovelhas" (Jo 10,11).
Jesus Cristo constitui-se permanente
única fonte da espiritualidade do Bispo. Por isso, o Bispo, santificado no Sacramento
com o dom do Espírito Santo, é chamado a responder à graça recebida por meio da imposição
das mãos, santificando-se e conformando a sua vida pessoal com Cristo no exercício
do ministério apostólico. "O Bispo deve ser uma alma contemplativa, além de homem
de ação, de modo que o seu apostolado seja um 'contemplata aliis tradere'. O Bispo,
convencido de que nada pode fazer sem o 'estar com Cristo', deve ser um apaixonado
do Senhor. Além disso, não esquecerá que o exercício do ministério episcopal para
ser credível precisa da autoridade moral e da respeitabilidade que procedem da santidade
de vida, que sustentam o exercício do poder jurídico" (cf. AS 33).
Por isso,
o Bispo deve ter uma espiritualidade eclesial que gera comunhão, vivenciando-a positivamente,
mantendo unida na caridade a Diocese que lhe é dada como esposa. Santidade vivida
e testemunhada que anime os fiéis e o clero a buscar a santidade como anúncio fundamental
do Reino de Deus.
"A imagem da Igreja nascente que vê Maria, unida aos Apóstolos
e aos discípulos de Jesus na oração unânime e perseverante, na expectativa do Espírito
Santo, exprime o vínculo indissolúvel que liga Nossa Senhora aos Sucessores dos Apóstolos.
Enquanto mãe, dos fiéis como dos pastores, modelo e imagem da Igreja, Maria apóia
o Bispo no seu esforço interior de conformação com Cristo e no seu serviço eclesial.
Na escola de Maria, o Bispo a contemplar a face de Cristo encontra consolação para
realizar a sua missão eclesial e forças para anunciar o Evangelho da Salvação. A materna
intercessão de Maria acompanha a oração confiante do Bispo para mais profundamente
penetrar nas verdades da fé e guardá-la tão íntegra e pura como esteve no coração
de Nossa Senhora, para reavivar a sua confiante esperança que já vê realizada na 'Mãe
de Jesus glorificada no corpo e na alma' e alimentar a sua caridade para que o amor
materno de Maria anime toda a missão apostólica do Bispo” (cf. AS 35). "No altar,
o Bispo fará seu o fiat com que Nossa Senhora se ofereceu a si mesma no feliz momento
da Anunciação e na hora dolorosa aos pés da cruz de seu Filho. Será precisamente a
Eucaristia, 'fonte e apogeu de toda a evangelização', à qual estão intimamente unidos
os Sacramentos” (cf. AS 35).
Realmente é pela oração que o Bispo obtém a luz,
a força e o conforto para as suas atividades pastorais, lembrando da importância da
celebração diária da Santa Missa e da oração da Liturgia das Horas, da adoração Eucarística,
da reza do rosário e da lectio divina como oportunos meios que alimentam a sua fé
e a vida segundo o Espírito, necessária para viver em plenitude a caridade pastoral
no dia a dia do exercício do ministério, na comunhão com Deus e na fidelidade à sua
missão.
"O Bispo, homem de fé, esperança e caridade, regulará a sua vida pelos
conselhos evangélicos e pelas bem-aventuranças (cf. Mt 5, 1-12), para que também ele,
como foi ordenado aos Apóstolos (cf. Act 1, 8), possa ser testemunha de Cristo diante
dos homens, documento verdadeiro e eficaz, fiel e credível da graça divina, da caridade
e das outras realidades sobrenaturais" (cf. AS 37).
Santo Agostinho define
a totalidade deste ministério episcopal como amoris officium. Isto cria a certeza
de que na Igreja nunca virá a faltar a caridade pastoral de Jesus Cristo. A caridade
pastoral do Bispo é a alma do seu apostolado. A principal virtude de quem governa
é ser caridoso: "Inflamado por esta caridade, seja o Bispo conduzido à piedosa contemplação
e imitação de Jesus Cristo e do seu desígnio de salvação. A caridade pastoral une
o Bispo a Jesus Cristo, à Igreja, ao mundo que importa evangelizar, e torna-o apto
a servir de embaixador de Cristo (cf. 2 Cor 5, 20) com decoro e competência, a empenhar-se
todos os dias pelo clero e povo a ele confiados, oferecendo-se como vítima sacrificial
em favor dos irmãos" (cf. AS 38). O Bispo exercerá a sua autoridade no espírito de
serviço e a tomará como uma vocação para servir toda a Igreja com as mesmas disposições
do Senhor.
Nesse sentido, é importante que o Bispo Diocesano ame a todos, particularmente
seus Bispos Auxiliares e Eméritos e o seu presbitério, com todo o povo de Deus confiado
aos seus cuidados pastorais: "O Bispo deverá dar o maior exemplo de caridade fraterna
e de sentido colegial, amando e ajudando espiritual e materialmente o Bispo coadjutor,
auxiliar ou emérito, o presbitério diocesano, os diáconos e os fiéis, sobretudo os
mais pobres e carecidos. A sua casa estará aberta como o estará o seu coração para
acolher, aconselhar, exortar e consolar. A caridade do Bispo estender-se-á aos Pastores
das Dioceses vizinhas, sobretudo as que pertencem à mesma metrópole e aos Bispos que
mais precisem de atenção” (cf. AS 38).
O Bispo deve ser um homem prudente na
arte de governar: "No apascentar do rebanho a si confiado, presta ao Bispo uma ajuda
imensa a virtude da prudência, a qual é sabedoria prática e arte de bom governo, que
requer atos oportunos e adequados à realização do plano divino da salvação e à obtenção
do bem das almas e da Igreja, postergando qualquer consideração meramente humana"
(cf. AS 40). O Bispo deve dialogar e respeitar os direitos dos outros: "Como pastor
prudente, mostre-se o Bispo pronto a assumir as suas responsabilidades e a favorecer
o diálogo com os fiéis; a fazer valer as suas atribuições, mas também a respeitar
os direitos dos outros na Igreja. A prudência fa-lo-á conservar as legítimas tradições
da sua Igreja particular, mas ao mesmo tempo fará dele um promotor do louvável progresso
e um zeloso pesquisador de novas iniciativas, embora salvaguardando a necessária unidade.
Desta forma, a comunidade diocesana seguirá pelo caminho de uma sã continuidade e
de uma devida adaptação às novas legítimas exigências" (cf. AS 40).
O grande
monge São Bernardo ensinou que: "a prudência é mãe da fortaleza – Fortitudinis matrem
esse prudentiam – também se exige ao Bispo o exercício desta. De fato, ele precisa
ser paciente no suportar das adversidades pelo Reino de Deus, como também de ser corajoso
e firme nas decisões tomadas segundo as retas normas" (cf. AS 42).
Ao guiar
os fiéis, o Bispo procure harmonizar o ministério da misericórdia com a autoridade
do governo, a mansidão com a força, o perdão com a justiça, consciente de que "certas
situações de fato não se vencem com a aspereza e a dureza, nem com modos arrogantes,
mas antes com o ensinamento em vez do comando, com a advertência em vez da ameaça"
(cf. AS 42). O Bispo deve cultivar a humildade e a compaixão dos irmãos.
O
Bispo deverá ser e mostrar-se pobre, será infatigavelmente generoso na esmola e levará
uma vida modesta que, sem tirar dignidade à sua função, tenha, porém, em conta as
condições socioeconômicas dos seus filhos. O Bispo procure ser simples na postura,
bem como igualmente procure ser afável com todos e nunca ceda a favoritismos com o
pretexto do patrimônio ou da condição social. O Bispo acolha aos pobres e humildes
como Jesus, e frequente as periferias, os locais de maior complexidade social.
"O
apelo à santidade exige que o Bispo cultive seriamente a vida interior, com os meios
de santificação que são úteis e necessários a qualquer cristão e especialmente a um
homem consagrado pelo Espírito Santo para governar a Igreja e para difundir o Reino
de Deus. Antes de mais nada, procurará cumprir fiel e infatigavelmente os deveres
do seu ministério episcopal, como caminho da sua vocação para a santidade. O Bispo,
como chefe e modelo dos presbíteros e dos fiéis, receberá exemplarmente os sacramentos
que lhe são necessários para alimentar a sua vida espiritual, como o são para qualquer
membro da Igreja" (cf. AS 46).
É oportuno que mensalmente procure reservar
um tempo adequado para o retiro espiritual, e anualmente para os exercícios espirituais.
O
Bispo deve revelar-se cheio de humanidade, como Jesus, que é perfeito homem: uma humanidade
profunda, um espírito bondoso e leal, um caráter constante e sincero, uma inteligência
aberta e clarividente, sensível às alegrias e aos sofrimentos alheios, uma grande
capacidade de autodomínio, delicadeza, tolerância e discrição, uma saudável propensão
para o diálogo e a escuta, uma permanente disposição para o serviço.
No encontro
com os Bispos do CELAM, no Sumaré, aqui no Rio de Janeiro, a parte final do discurso
do Sumo Pontífice foi dedicada precisamente ao que deve ser (e não ser) o Bispo. "Ele
deve guiar, que não é o mesmo que dominar.” O Papa Francisco retomou o que teve ocasião
de dizer aos Núncios Apostólicos, sobre os critérios a seguir ao preparar as listas
dos candidatos ao serviço episcopal: "Os Bispos devem ser Pastores, próximos das pessoas,
pais e irmãos, com grande mansidão: pacientes e misericordiosos. Homens que amem a
pobreza, quer a pobreza interior como liberdade diante do Senhor, quer a pobreza exterior
como simplicidade e austeridade de vida. Homens que não tenham “psicologia de príncipes".
"Homens que não sejam ambiciosos e que sejam esposos de uma Igreja sem viver na expectativa
de outra. Homens capazes de vigiar sobre o rebanho que lhes foi confiado e cuidando
de tudo aquilo que o mantém unido: vigiar sobre o seu povo, atento a eventuais perigos
que o ameacem, mas sobretudo para fazer crescer a esperança (o Bispo tem que cuidar
da esperança do seu povo): que haja sol e luz nos corações. Homens capazes de sustentar
com amor e paciência os passos de Deus em seu povo. E o lugar do Bispo para estar
com o seu povo é triplo: ou à frente para indicar o caminho, ou no meio para mantê-lo
unido e neutralizar as debandadas, ou então atrás para evitar que alguém se atrase,
mas também, e fundamentalmente, porque o próprio rebanho tem o seu faro para encontrar
novos caminhos”.
O Bispo que reza pelos seus presbíteros e pelos seus fiéis
tem a consolação de Cristo, que o constituiu sucessor dos Apóstolos. Sem oração e
intimidade com Deus nossa ação pastoral se transforma em filantropia e não em itinerário
de salvação.
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de
São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ