Belo Horizonte (RV) - O centenário de nascimento de um ícone da mais alta relevância
no cenário religioso, cultural, político e social de Minas Gerais é celebrado em 2013.
Frei Rosário Joffily, que morreu em 2000, frade dominicano, sacerdote, eremita, construtor,
referência de cultura, desenhista de horizontes largos e ricos, era um defensor extraordinário
da Serra da Piedade, sentinela imortal do Santuário Nossa Senhora da Piedade, a Padroeira
de Minas Gerais. Nasceu no dia 6 de janeiro de 1913 e dedicou meio século de sua vida
na defesa, promoção e consolidação do conjunto paisagístico, arquitetônico, religioso,
histórico e cultural da Serra da Piedade.
Frei Rosário chegou ao Santuário
nos idos de 1950, convidado pelo Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, um filho
apaixonado desta terra mineira. Dedicando sua vida à defesa do Santuário e da Serra
da Piedade, frei Rosário fortaleceu a chama do seu amor por esta dádiva de Deus, herança
nossa que vamos sempre preservar e defender. Premiada a Arquidiocese de Belo Horizonte
com a tarefa de ser guardiã desse território sagrado, está sempre atenta a ouvir
a voz de frei Rosário para fortalecer o compromisso com a proteção do Santuário da
Padroeira de Minas e da Serra da Piedade. Ouvi-lo é reconhecer e assumir seu legado
na defesa desse território sagrado.
Fala, frei Rosário, desta etapa nova do
Santuário Nossa Senhora da Piedade, um processo irreversível de ocupação dos corações
de todos os mineiros, fazendo de cada um seus defensores e vigilantes. Fala com voz
forte e determinante, maior mesmo que de instâncias judiciais e governamentais, devendo
estas, e outras todas, escutar a voz do povo, particularmente dos mineiros, sensibilizados
e conscientes defensores das áreas de preservação.
Fala, frei Rosário, com
sua autoridade imortal e na celebração do centenário de seu nascimento, de sua luta
incansável contra voracidades das mineradoras, de seu empenho para construir um exército
de defensores, que reúne organizações não governamentais, homens e mulheres de boa
vontade, todos amigos da Serra da Piedade. Um trabalho que conquistou, já em 26
de setembro de 1956, o tombamento do conjunto arquitetônico e paisagístico da Serra
da Piedade pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
O
zelo e defensoria do frei Rosário, em escritos, entendimentos, posicionamentos firmes
e inequívocos, consolidação da devoção dos peregrinos, especialmente dos mais humildes,
que sobem a Serra da Piedade em oração rumo ao Santuário, se desdobraram em luta árdua
dos que proporcionaram lucidez ao Governo do Estado de Minas Gerais. Em 16 de junho
de 2004, o Governo sancionou a Lei 15.178/04, definindo os limites de conservação
da Serra da Piedade, de acordo com Diretrizes do Instituto Estadual do Patrimônio
Histórico e Artístico (Iepha), considerada Área de Proteção Ambiental, em cumprimento
do Artigo 84 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de
Minas. Um passo inteligente, em confirmação ao que determina a Constituição do Estado,
que define a Serra da Piedade como Unidade de Conservação Estadual na Categoria de
Monumento Natural. Importantíssimo ainda foi o tombamento do Conjunto Cultural, Arquitetônico,
Paisagístico e Natural da Serra da Piedade pelo município de Caeté, a partir do Decreto
2.067/04.
A história do Santuário Nossa Senhora da Piedade, a Serra e seu entorno,
a partir da segunda metade do século 20 - inclusive destes últimos 13 anos - arregimentou
instâncias governamentais, instituições, organizações não governamentais, devotos
e amigos, todos os que sabem da urgência e delicadeza do compromisso de salvaguardar
o meio ambiente. Assim, não se pode admitir que uma única instância, mesmo na sua
validade jurídica institucional, determine o destino desse território sagrado.
O
processo de recuperação do estrago, chaga no entorno da Serra da Piedade, verdadeira
abominação da desolação, deve ser amplamente discutido, não apenas em escritórios
de interesses particulares. Mesmo as instâncias judiciais devem estar abertas a escutas
e ponderações da maioria absoluta, principalmente dos que defendem a natureza, a sua
recuperação natural, sem lhe ferir ainda mais, com a justificativa de que é o meio
para a recuperação. A Arquidiocese de Belo Horizonte, aguerrida guardiã da Serra da
Piedade, inarredável na trilha de frei Rosário, vem adquirindo territórios para melhor
lutar por sua preservação. No final de 2011, readquiriu um terreno, passado a terceiros,
mais de vinte anos atrás, pelo próprio frei Rosário, que na sua lucidez o trocou por
outro para garantir, na época, o futuro do Santuário.
O terreno recuperado
em 2011, com água corrente, hoje é denominado Retiro da Piedade. Ele representa a
reconquista da inteireza do território do Santuário, na luta por sua preservação e
condição intocável. Neste ano do centenário de nascimento de frei Rosário, na sua
permanente escuta e inspiração por sua luta admirável, é hora de intensificar a movimentação
em defesa e preservação da Serra da Piedade, lutando com toda a garra e empenhos,
contando com a fidelidade à palavra dada em leis, por parte das instituições governamentais.
Todos devem cultivar a coragem aguerrida pelo sentido adequado de salvaguarda do meio
ambiente, com a respeitosa e consolidada presença da Igreja Católica e das confissões
religiosas que incluem na sua vivência de fé o compromisso com a natureza. Estamos
em batalha, defendendo a Serra da Piedade e seu entorno, contra intervenções inoportunas,
no horizonte indelével da fala do frei Rosário. Vença nesta luta a verdade, o bom
senso e o respeito ao meio ambiente.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo
metropolitano de Belo Horizonte