"Outra Europa é possível": representante vaticano reflete, num livro, sobre os maiores
desafios para o Velho Continente
Cidade do Vaticano (RV) - "Outra Europa é possível": esse é o título do livro
do observador permanente da Santa Sé junto ao Conselho da Europa, Mons. Aldo Giordano,
publicado pela editora São Paulo.
Trata-se de um livro-entrevista em que o
representante vaticano reflete sobre os maiores desafios para o Velho Continente e
conta a sua experiência vivida nos anos em que esteve como secretário-geral do Conselho
das Conferências Episcopais Européias (1995-2008), e depois, a partir de 2008, como
observador permanente em Estrasburgo, na França, onde se encontra a sede do Conselho
da Europa.
Entrevistado pela Rádio Vaticano, Mons. Giordano nos diz, em primeiro
lugar, qual Europa é possível:
Mons. Aldo Giordano:- "A questão central
parece-me ser a da liberdade. A Europa amadureceu, ao longo dos séculos e nas últimas
décadas, um grande amor pela liberdade: porém, hoje, vemos que a liberdade que se
consolida em nossos caminhos é uma liberdade fortemente individualista, que está centralizada
num "eu" que se agiganta cada vez mais. Então, creio que devemos retomar e aprofundar
o conceito de liberdade, até descobrir que, na realidade, a liberdade é o lugar da
relação com o outro, o lugar da relação também com o totalmente Outro e, portanto,
a relação com a nossa origem e com Deus. Consequentemente, devemos superar uma Europa
que se fecha em si mesma em nível cultural, onde o "eu" quer decidir tudo, inclusive
decidir o próprio sexo, decidir como fazer os filhos, decidir sobre todos os valores.
Ao invés, deve redescobrir que a liberdade é um lugar que é constituído pela relação
com um Pai, pela relação com o outro e pela relação com valores existentes em si mesmos.
Não cabe a nós decidir o valor da vida, mas devemos descobrir o mistério da vida;
não cabe a nós inventar-nos a bondade ou inventar-nos a verdade, devemos descobrir
que existe uma verdade, que existe uma bondade e que existe uma beleza."
RV:
Mons. Giordano, nos últimos anos muito se tem falado sobre crise econômica: e isso
é necessário, sobretudo, porque são os cidadãos que pagam o preço. Como se pode ter
um olhar que não seja limitado também sobre temas econômicos?
Mons. Aldo
Giordano:- "Creio que para o aspecto econômico os novos elementos são o da
justiça, o elemento ético, o elemento da solidariedade e o da gratuidade. A Europa
teve um grande papel em nível econômico, hoje, porém, parece que nos encontramos frágeis
também sobre isso e, então, creio que somente uma economia que redescubra a solidariedade
e que tenha a coragem da solidariedade, poderia tornar a Europa capaz de verdadeiramente
voltar a dizer algo à humanidade."
RV: O Papa Francisco conseguiu mexer
com as consciências naquilo que nos ensinou a definir a "globalização da indiferença".
O senhor, que há anos vive no coração da Europa, o que pode dizer-nos sobre como se
vive no coração das instituições a sacudida que o Papa Francisco está dando ao mundo?
Uma surpresa iniciada com o anúncio do nome escolhido – Francisco:
Mons.
Aldo Giordano:- "Vejo em minha experiência, inclusive junto às instituições
europeias, um grande interesse e uma grande simpatia pela figura e pela proposta que
vem do Papa Francisco. Diante de uma Europa e diante de um mundo que parece não encontrar
caminhos de novidade, a figura do Papa apresenta-se hoje sempre mais uma figura de
referência e também um sinal de esperança, porque é a esperança que muitas vezes falta
em nossos caminhos. Transmite a intuição de que a humanidade pode fazer outros percursos:
não somos sempre obrigados a caminhar por certas estradas; não se é obrigado a resolver
o problema entre os povos com a violência; não somos obrigados a estabelecer relações
entre os povos baseadas no comércio de armas; não somos obrigados a deixar populações
inteiras morrer de fome. Intui-se em sua mensagem que se o homem volta à sua raiz
mais profunda e também a Igreja retorna a redescobrir verdadeiramente a sua vocação
mais bonita e mais profunda, isso é uma novidade. Dias atrás, no Comitê dos ministros
do Conselho da Europa, houve um debate sobre migrações e o Papa foi citado por suas
palavras sobre o primado da pessoa. Foi recordada sua visita a Lampedusa (ilha situada
no extremo-sul da Itália, ndr), na qual o Papa afirmou que a pessoa tem a prioridade
e que, portanto, tudo o mais deve girar em torno dessa prioridade. Creio que isso
cria novidade política e cria novidade também para as economias." (RL)