2013-08-15 09:36:44

Papa Francisco, no Brasil, fala aos Bispos do seu perfil e missão pastoral


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Como sabemos, neste mês de agosto, o Santo Padre não realiza a audiência geral das quartas-feiras e estão praticamente suspensas todas as suas actividades públicas (à excepção do Angelus nos domingos e dias santos).
Por isso, nesta rubrica das quartas-feiras, “A Semana do Papa” – destinada a evocar os principais pronunciamentos do Santo Padre nos últimos oito dias – também hoje, como fizemos já nas duas últimas semanas, vamos recordar intervenções papais na recente viagem ao Brasil. Se há oito dias evocávamos as palavras dirigidas, pouco antes do regresso a Roma, aos Bispos mais responsáveis do CELAM – Conselho Episcopal Latino-americano, hoje prosseguimos na mesma ordem de ideias, vendo o que o Papa Francisco disse, nessas e noutras circunstâncias, sobre o perfil e estilo pastoral dos Bispos…
E começamos, como tínhamos concluído na semana passada, pelo encontro com a direcção do CELAM… A parte final do seu discurso foi dedicado precisamente ao que deve ser (e não ser) o Bispo… "Ele deve guiar, que não é o mesmo que dominar. "

O Papa Francisco retomou o que teve ocasião de dizer, há dois meses, em Roma, aos Núncios Apostólicos, sobre os critérios a seguir ao preparar as listas dos candidatos ao serviço episcopal…

“Os Bispos devem ser Pastores, próximos das pessoas, pais e irmãos, com grande mansidão: pacientes e misericordiosos. Homens que amem a pobreza, quer a pobreza interior como liberdade diante do Senhor, quer a pobreza exterior como simplicidade e austeridade de vida. Homens que não tenham “psicologia de príncipes”.
Homens que não sejam ambiciosos e que sejam esposos de uma Igreja sem viver na expectativa de outra (O fenómeno dos Bispos polígamos não existe… Risos… Estão casados com uma (Igreja, mas) vendo quando é que vai chegar a… promoção…). Homens capazes de vigiar sobre o rebanho que lhes foi confiado e cuidando de tudo aquilo que o mantém unido: vigiar sobre o seu povo, atento a eventuais perigos que o ameacem, mas sobretudo para fazer crescer a esperança (o Bispo tem que cuidar da esperança do seu povo): que haja sol e luz nos corações. Homens capazes de sustentar com amor e paciência os passos de Deus em seu povo. E o lugar do Bispo para estar com o seu povo é triplo: ou à frente para indicar o caminho, ou no meio para mantê-lo unido e neutralizar as debandadas, ou então atrás para evitar que alguém se atrase mas também, e fundamentalmente, porque o próprio rebanho tem o seu faro para encontrar novos caminhos.”

O Santo Padre concluiu considerando existir um grande atraso na conversão pastoral… dos Bispos todos... incluindo-se ele próprio nesta autocrítica…

Sempre no Rio de Janeiro, mas no encontro tido, no sábado 27 de julho, com o conjunto dos Bispos Brasileiros – a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), é interessante ver o que lhes disse o Papa Francisco. Este encontro foi de carácter privado, pelo que não existe uma gravação das suas palavras. Mas temos o texto integral da sua intervenção.
Depois de comentar longamente o episódio dos discípulos de Emaús, que Jesus – incógnito – acompanhou ao longo do caminho, aquecendo-lhes o coração com a explicação das Escrituras e ajudando-os a reencontrar a fé e a esperança, o Santo Padre falou dos “desafios” que “a amada Igreja que está no Brasil” tem que enfrentar, indicando como máxima prioridade a formação de todos – Bispos, padres, religiosos, leigos. Afirmou o Papa:

“Queridos irmãos, se não formarmos ministros capazes de aquecer o coração das pessoas, de caminhar na noite com elas, de dialogarem com as suas ilusões e desilusões, de recompor as suas desintegrações, o que poderemos esperar para o caminho presente e futuro? Não é verdade que Deus se tenha obscurecido nelas. Aprendamos a olhar mais profundamente: falta quem lhes aqueça o coração, como sucedeu com os discípulos de Emaús (cf. Lc 24,32). Por isso, é importante promover e cuidar uma formação qualificada que crie pessoas capazes de descer na noite sem ser invadidas pela escuridão e perder-se; capazes de ouvir a ilusão de muitos, sem se deixar seduzir; capazes de acolher as desilusões, sem desesperar-se nem precipitar na amargura; capazes de tocar a desintegração alheia, sem se deixar dissolver e decompor na sua própria identidade.”
Outra prioridade, para além da formação de todos – prosseguiu o Papa Francisco – é a colegialidade e solidariedade no interior da Conferência Episcopal de todos os bispos do Brasil, com uma rede de testemunhas que (citamos) “falando a mesma linguagem, assegurem em todos os lugares, não a unanimidade, mas a verdadeira unidade na riqueza da diversidade”. “A comunhão – observou ainda – é “uma teia” – uma rede de fios entrelaçados – “a tecer com paciência e perseverança”.
“Quanto à missão, há que lembrar que a urgência deriva de sua motivação interna, isto é, trata-se de transmitir uma herança… Para transmitir uma herança é preciso entregá-la pessoalmente, tocar a pessoa a quem se quer doar, transmitir a herança.
Quanto à conversão pastoral (concluiu finalmente o Papa), quero lembrar que «pastoral» nada mais é que o exercício da maternidade da Igreja. Ela gera, amamenta, faz crescer, corrige, alimenta, conduz pela mão... Por isso, faz falta uma Igreja capaz de redescobrir as entranhas maternas da misericórdia. Sem a misericórdia, poucas possibilidades temos hoje de inserir-nos em um mundo de «feridos», que têm necessidade de compreensão, de perdão, de amor.”
… O canto que estávamos a ouvir, situa-nos noutro momento vivido pelo Papa Francisco no Rio de Janeiro, no sábado 27 de julho… Referimo-nos à Missa que concelebrou na catedral, com muitos dos bispos e padres que participavam na JMJ, assim como religiosos, religiosas e seminaristas. Na homilia, o Papa reflectiu sobre três aspectos da vocação a pastores ou consagrados: - chamados por Deus, - chamados a anunciar o Evangelho, - chamados a promover a cultura do encontro…
Recordando antes de mais a vocação pessoalmente recebida por cada um dos padres, bispos e religiosos, o Papa sublinhou a importância de ter bem presente e viva esta união pessoal com Cristo que chama:
“Não a criatividade, por mais pastoral que seja, não são os encontros ou as planificações que asseguram os frutos, que aliás ajudam e muito, mas o que assegura o fruto é sermos fiéis a Jesus, que nos diz com insistência: Permanecei em mim como eu permaneço em vós. E sabemos muito bem o que isso significa: contemplá-lo, adorá-lo e abraçá-lo no nosso encontro diário com Ele na Eucaristia, na nossa vida de oração, nos nossos momentos de adoração, e também reconhecê-lo presente e abraçá-lo nas pessoas mais necessitadas”.
Em relação ao segundo ponto – Chamados a anunciar o Evangelho, referindo-se às Jornadas Mundiais da Juventude, que a todos reunia no Rio de Janeiro, o Papa Francisco pediu aos bispos e padres para darem tempo aos jovens… “Eles precisam de ser escutados – insistiu. Para escutar os seus sucessos ou dificuldades, há que estar sentado, ouvindo porventura o mesmo disco… mas sempre com música diferentes, com identidades diversas…
“A paciência de escutar! Peço-vos isso de todo o coração. No confessionário, na direcção espiritual, no acompanhamento. Saibamos perder tempo com eles. Semear custa, e cansa, cansa muitíssimo! E é muito mais gratificante gozar da colheita! Está claro! Todos nós gozamos mais com a colheita. Mas Jesus pede-nos que semeemos a sério!”
Finalmente, “promover a cultura do encontro”…Papa Francisco falou mais uma vez de algo que lhe está muito a peito: denunciar o “humanismo economicista que se impôs” no mundo, com “uma cultura da exclusão, a cultura do deitar fora”. Acaba por não haver lugar para o idoso nem para o filho não desejado. Não há tempo para parar com o pobre da rua… Há que contrariar esta tendência, ir contra corrente….
“Tenham a coragem de ir contra corrente em relação a esta cultura da eficiência, esta cultura da exclusão. O encontro e o acolhimento de todos, a solidariedade (uma palavra que estão escondendo nesta cultura, como se fosse uma palavra inconveniente), a solidariedade e a fraternidade são elementos que fazem a nossa civilização verdadeiramente humana.
Sermos servidores da comunhão e da cultura do encontro. Quereria que fôsseis como que obsessionados neste sentido… Mas fazê-lo sem sermos presunçosos, sem impor a nossa verdade, antes guiados pela certeza humilde e feliz de quem foi encontrado, alcançado e transformado pela Verdade que é Cristo, e não pode deixar de a proclamar”.

(PG)








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