Papa em visita à comunidade de Varginha: promover solidariedade, justiça social e
dimensão espiritual
Rio de Janeiro (RV) - O Santo Padre acabou de realizar um de seus compromissos
mais aguardados desta sua primeira viagem apostólica internacional: a visita, no complexo
de Manguinhos, à comunidade de Varginha, uma favela hoje pacificada. A seguir, propomos,
na íntegra, o discurso que dirigiu na ocasião:
"Queridos irmãos
e irmãs, Que bom poder estar com vocês aqui! Desde o início, quando planejava a
minha visita ao Brasil, o meu desejo era poder visitar todos os bairros deste País.
Queria bater em cada porta, dizer “bom dia”, pedir um copo de água fresca, beber um
"cafezinho", falar como a amigos de casa, ouvir o coração de cada um, dos pais,
dos filhos, dos avós... Mas o Brasil é tão grande! Não é possível bater em todas as
portas! Então escolhi vir aqui, visitar a Comunidade de vocês que hoje representa
todos os bairros do Brasil. Como é bom ser bem acolhido, com amor, generosidade, alegria!
Basta ver como vocês decoraram as ruas da Comunidade; isso é também um sinal do carinho
que nasce do coração de vocês, do coração dos brasileiros, que está em festa! Muito
obrigado a cada um de vocês pela linda acolhida! Agradeço a Dom Orani Tempesta e ao
casal Rangler e Joana pelas suas belas palavras. 1. Desde o primeiro instante
em que toquei as terras brasileiras e também aqui junto de vocês, me sinto acolhido.
E é importante saber acolher; é algo mais bonito que qualquer enfeite ou decoração.
Isso é assim porque quando somos generosos acolhendo uma pessoa e partilhamos algo
com ela – um pouco de comida, um lugar na nossa casa, o nosso tempo - não ficamos
mais pobres, mas enriquecemos. Sei bem que quando alguém que precisa comer bate na
sua porta, vocês sempre dão um jeito de compartilhar a comida: como diz o ditado,
sempre se pode “colocar mais água no feijão”! E vocês fazem isto com amor, mostrando
que a verdadeira riqueza não está nas coisas, mas no coração! E povo brasileiro,
sobretudo as pessoas mais simples, pode dar para o mundo uma grande lição de solidariedade,
que é uma palavra frequentemente esquecida ou silenciada, porque é incômoda. Queria
lançar um apelo a todos os que possuem mais recursos, às autoridades públicas e a
todas as pessoas de boa vontade comprometidas com a justiça social: Não se cansem
de trabalhar por um mundo mais justo e mais solidário! Ninguém pode permanecer insensível
às desigualdades que ainda existem no mundo! Cada um, na medida das próprias possibilidades
e responsabilidades, saiba dar a sua contribuição para acabar com tantas injustiças
sociais! Não é a cultura do egoísmo, do individualismo, que frequentemente regula
a nossa sociedade, aquela que constrói e conduz a um mundo mais habitável, mas sim
a cultura da solidariedade; ver no outro não um concorrente ou um número, mas um irmão. Quero
encorajar os esforços que a sociedade brasileira tem feito para integrar todas as
partes do seu corpo, incluindo as mais sofridas e necessitadas, através do combate
à fome e à miséria. Nenhum esforço de “pacificação” será duradouro, não haverá harmonia
e felicidade para uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia
parte de si mesma. Uma sociedade assim simplesmente empobrece a si mesma; antes, perde
algo de essencial para si mesma. Lembremo-nos sempre: somente quando se é capaz de
compartilhar é que se enriquece de verdade; tudo aquilo que se compartilha se multiplica!
A medida da grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como esta trata os mais necessitados,
quem não tem outra coisa senão a sua pobreza! 2. Queria dizer-lhes também que
a Igreja, «advogada da justiça e defensora dos pobres diante das intoleráveis desigualdades
sociais e econômicas, que clamam ao céu» (Documento de Aparecida, 395), deseja
oferecer a sua colaboração em todas as iniciativas que signifiquem um autêntico desenvolvimento
do homem todo e de todo o homem. Queridos amigos, certamente é necessário dar o pão
a quem tem fome; é um ato de justiça. Mas existe também uma fome mais profunda, a
fome de uma felicidade que só Deus pode saciar. Não existe verdadeira promoção do
bem-comum, nem verdadeiro desenvolvimento do homem, quando se ignoram os pilares fundamentais
que sustentam uma nação, os seus bens imateriais: a vida, que é dom de Deus,
um valor que deve ser sempre tutelado e promovido; a família, fundamento da
convivência e remédio contra a desagregação social; a educaçãointegral,
que não se reduz a uma simples transmissão de informações com o fim de gerar lucro;
a saúde, que deve buscar o bem-estar integral da pessoa, incluindo a dimensão
espiritual, que é essencial para o equilíbrio humano e uma convivência saudável; a
segurança, na convicção de que a violência só pode ser vencida a partir da
mudança do coração humano. 3. Queria dizer uma última coisa. Aqui, como em todo
o Brasil, há muitos jovens. Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial
frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção,
com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício. Também
para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança,
não deixem que se apague a esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar.
Procurem ser vocês os primeiros a praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas
a vencê-lo. A Igreja está ao lado de vocês, trazendo-lhes o bem precioso da fé, de
Jesus Cristo, que veio «para que todos tenham vida, e vida em abundância» (Jo
10,10). Hoje a todos vocês, especialmente aos moradores dessa Comunidade de Varginha,
quero dizer: Vocês não estão sozinhos, a Igreja está com vocês, o Papa está com vocês.
Levo a cada um no meu coração e faço minhas as intenções que vocês carregam no seu
íntimo: os agradecimentos pelas alegrias, os pedidos de ajuda nas dificuldades, o
desejo de consolação nos momentos de tristeza e sofrimento. Tudo isso confio à intercessão
de Nossa Senhora Aparecida, Mãe de todos os pobres do Brasil, e com grande carinho
lhes concedo a minha Bênção."