2013-06-08 08:45:33

Editorial: Sou ladrão do pobre?


Cidade do Vaticano (RV) – RealAudioMP3 “A comida que jogamos fora é roubada da mesa de quem é pobre, de quem tem fome”: palavras do Papa Francisco na última quarta-feira durante a Audiência geral na Praça São Pedro, no Vaticano. Palavras duras que acertam de cheio a nossa consciência e fazem tremer, por assim dizer, as nossas convicções de que “eu não sou culpado pela fome no mundo”. Diante de uma multidão de mais de 70 mil fiéis provenientes de todas as partes do mundo, Papa Francisco aproveitando a comemoração do Dia Mundial do Meio Ambiente celebrado pelas Nações Unidas no mesmo dia, 5 de junho, voltou a pedir que jamais nos esqueçamos de que o valor da vida deve estar sempre acima dos interesses econômicos. O Papa tocou em vários aspectos do respeito pelo meio ambiente, ou seja pela criação, dom de Deus ao homem e à mulher, mas também da essência do valor da pessoa humana; de fato, recordou que “quem morre de frio, sem um abrigo, no meio da rua não faz notícia. Já, ao contrário, quando temos uma queda de 10 pontos na bolsa de valores é uma tragédia”. O valor da vida deveria estar sempre acima dos interesses econômicos, da visão do lucro, que a nossa sociedade atual muitas vezes impõe como normalidade. Nesta ótica, Francisco chama a atenção para aquilo que vemos todos os dias nas ruas de nossas cidades, e não temos a coragem de enfrentar, de nos indignar, como se não fosse de nossa competência, como se não fosse nossa responsabilidade. O homem faminto foi descartado, as pessoas são descartadas como se fossem desperdício. São homens e mulheres, disse o Papa, “sacrificados aos ídolos do lucro e do consumo”. É a cultura do descartável. Vivemos sem profundidade, sem dar importância, tudo passageiro, nos tornamos insensíveis diante de realidades que deveriam nos indignar. Morre-se de fome quando temos mesas abastadas e lixos ainda mais abastados. Lamentável quando em muitas partes do nosso mundo pessoas, principalmente crianças, sofrem de fome e subnutrição. Nos dias passados as Nações Unidas alertaram para o fato de que todos os anos 1 bilhão e 300 milhões de toneladas de alimentos são desperdiçados, ou seja, um terço da comida produzida no mundo vai parar nas lixeiras. Esse desperdício seria suficiente para alimentar 870 milhões de pessoas que passam fome.

O consumismo levou as pessoas a habituarem-se ao supérfluo e ao desperdício diário de alimento. Diante dessa situação que vê o ser humano espezinhado e sacrificado no altar da indiferença, o alerta do Papa Francisco de que a pessoa humana hoje “está em perigo”, por isso é urgente uma “economia humana”: “O perigo é grave porque a causa do problema não é superficial, mas profunda: não é só uma questão de economia, mas de ética e de antropologia”. A Igreja já o sublinhou muitas vezes. Mas o sistema continua igual: o que comanda hoje não é o homem, é o dinheiro.

O homem se modernizou, foi ao espaço, encurtou distâncias, ficou mais veloz, criou bem-estar, mas não aprendeu a partilhar recursos que poderiam salvar vidas e dar dignidade às pessoas. Criou ídolos que o tornam não pessoas livres, mas amarradas, amordaçadas sem a verdadeira liberdade, que somente a solidariedade, filha da caridade pode dar. Tornamo-nos escravos da busca do bem-estar sem levar em consideração a essência de nossas vidas, das nossas esperanças, ou seja, o amor, e a comunhão com Deus e o nosso próximo.

É possível mudar essa situação, é possível erradicar a pobreza, mudando nossas atitudes, nossos comportamentos consumistas e indiferentes. Temos que retomar a cultura da solidariedade – pede o Papa – do encontro, do importa-se com o outro. Temos que retomar a paixão pelo ser humano. Não podemos ser uma “sociedade descartável”, que despreza a vida humana. A pergunta martela na cabeça, somos ladrões do futuro do nosso irmão? É o momento para responder com ações e não somente com palavras, com uma cultura da solidariedade e do encontro. É o momento da “sociedade da partilha”, de saber partilhar o pouco que somos e temos e não nos fecharmos nunca em nós mesmos. (Silvonei José)







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