Cidade do Vaticano (RV) – Todos os dias somos
bombardeados com informações de todo tipo e interesse. Algumas nos chamam a atenção
por sua espetacularidade, outras pelo sensacionalismo, outras ainda pela dramaticidade;
temos também aquelas notícias que falam das amenidades da vida, dos luxos, riquezas,
dos estilos de vida que “todos sonham”. Nesta última semana uma notícia divulgada
pelas Nações Unidas, ganhou pequenos espaços nos jornais e em algumas televisões nem
sequer teve o direito a 30 segundos de tempo. A notícia: “Um relatório divulgado pela
ONU revela que cerca de 258 mil somalis, metade deles crianças, morreram de fome entre
2010 e 2012”. Somália foi a zona mais atingida pela seca extrema em 2011, que afetou
mais de 13 milhões de pessoas no chamado “Chifre da África”. Como uma notícia
de tal porte possa ter passado despercebida pela consciência daqueles que podem com
suas ações mudar a vida de milhões de pessoas? Certamente para entender o que está
acontecendo nessa parte do mundo esquecida, devemos conhecer algo desta região. A
raiz desse problema endêmico está certamente no conflito que atualmente assola a Somália
e não só piora a crise alimentar, mas também impede ou torna difícil a ajuda humanitária.
Alguém se recorda que existe um conflito armado na Somália? O conflito na Somália
começou em 1991, e tem causado a desestabilização de todo o país, com a fase atual
do conflito vendo uma intensificação das ações do governo contra as forças rebeldes.
Os distúrbios compreendiam inicialmente uma série de confrontos entre diversas facções
tribais, mas desde meados da década de 2000, assumiu um tom islâmico militante. E
quem paga a conta maior é a população inerme, que sofre diariamente, além do conflito,
o drama da fome e da sobrevivência. Já em julho de 2011 Papa Bento XVI alertou
sobre a situação de fome no Chifre da África, afirmando que ninguém pode ficar “indiferente”
perante a ameaça que paira sobre milhões de pessoas. Hoje estamos em maio de 2013,
dois anos se passaram e a ameaça se tornou realidade, ninguém deu ouvidos ao chamado
do Papa. O balanço de 258 mil mortos é o atestado da falência da sociedade atual,
industrializada, rica, poderosa, mas ao mesmo tempo impotente, egoísta, e míope. Míope
porque não consegue ver além da porta de sua casa, das necessidades do seu pequeno
mundo, como se o resto fosse somente resto. Como viver indiferentes à tragédia da
fome e não se deixar se comover pelo sofrimento daquele que não tem pão? O drama na
Somália, no Chifre da África se verifica sem testemunhas, sem as câmaras de TV que
muitas vezes, por alguns momentos, conseguem sacudir as consciências; é um sofrimento
invisível, uma morte que ninguém chora, a não ser a mãe debruçada sobre o corpo esquelético
e inerme de seu filho que muitas vezes não chegou a completar nem um ano de existência.
Será que a dor de uma mãe como essa é diferente da dor das nossas mães? O único pecado
dessa mãe foi ter nascido numa terra onde a morte por fome não é uma exceção, mas
está na ordem do dia, da normalidade. Certamente poderíamos ter feito mais para
ajudar esse povo esquecido, deserdado da sua dignidade. É impensável que num mundo
como o nosso, altamente tecnológico, não tenhamos ainda a receita e a força para acabar
a miséria de milhões de pessoas. Os avisos que começaram já com a seca em 2010 nesta
área não desencadearam uma ação prévia suficiente. Hoje mais de um milhão de somalis
vivem fora do país por causa dos conflitos, da miséria e da fome. Os conflitos internos
prejudicam a distribuição de ajudas humanitárias e isolam grupos enormes de pessoas
que vivem situações desesperadoras. A comunidade internacional tem o dever imperativo
de ajudar este país, esse povo que com as poucas forças que tem ainda, levanta os
braços pedindo, não esmola, mas oportunidade de viver, de reconstruir uma vida, um
país que nos últimos 20 anos produziu luto, dor, miséria e desesperança. É a hora
da esperança, é a hora de dar luz a um túnel onde a escuridão esconde a dor e o desespero
de milhões de pessoas. (Silvonei José)