Durante uma entrevista concedida ao Portal África 21, o diplomata timorense, José
Ramos Horta, actual representante do Secretário Geral da ONU na Guiné-Bissau, disse
estar ciente das dificuldades da sua missão, mas acredita que desta vez, com maior
implicação da comunidade internacional, o país poderá virar a página da violência
e da instabilidade. Com a condição das elites políticas guineenses se entenderem e
aceitarem a ideia de um Governo inclusivo após as eleições gerais. “A chave do
futuro do país está nas mãos do povo e dos seus líderes. Hoje têm uma oportunidade
única de ultrapassar os erros do passado e de procederem a um virar de página. Estou
relativamente otimista, que com mais diálogo, com mais concertação com a ONU e desta
com os outros parceiros internacionais, encontraremos uma estratégia comum para retirar
a Guiné do ciclo de violência e de instabilidade. A situação guineense não é assim
tão complicada, comparada com o Mali e a Somália. Depois da minha primeira semana
de encontros em Bissau, em todas as capitais onde a seguir estive para harmonizar
posições com os outros parceiros, constatei uma real vontade de apoiar a Guiné-Bissau.
O secretário-geral das Nações Unidas, mesmo com as sérias preocupações relativas ao
Afeganistão, Síria, Mali e à RD do Congo, ainda arranja tempo para procurar uma solução
para a crise guineense. Tenho a sensação que os principais atores da crise, a classe
política e os militares, parecem cansados e desgastados por estes constantes problemas.
Assim, creio que a Guiné-Bissau possui um grande potencial para se tornar um oásis
de paz e de prosperidade na sub-região. É certo que as suas Forças Armadas são pobres
e desorganizadas e que o Estado é frágil e minado pelo narcotráfico, mas não enfrenta
um conflito étnico-religioso nem a violência existente na Líbia ou no Mali. Vamos
intensificar o diálogo e pensamos lançar os fóruns SRSG, isto é, debates temáticos
promovidos pelo representante especial do secretário-geral das Nações Unidas sobre
questões como a reforma e modernização das forças de Defesa e Segurança ou o papel
da sociedade civil na democracia. Tencionamos ainda propor uma sessão aberta, em que
queremos desafiar os guineenses a encontrarem um tema da sua escolha, algo nobre,
consensual e com capacidade mobilizadora, como foi a luta de libertação nacional.
Cabe agora aos intelectuais refletirem sobre esta proposta. Em relação à difícil
relação entre a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e os actuais dirigentes
do país, Ramos Horta disse que se a comunidade lusófona for coerente com a preocupação
que manifesta com a crise e quiser ser solidária com o país, convinha de facto ter
alguém no país. Por exemplo, uma personalidade de elevado perfil, ex-governante ou
um general na reserva, disponível para assistir o país até à sua estabilização. Apesar
da atual tensão com a Guiné-Bissau, a CPLP tem uma simpatia genuína pela Guiné-Bissau
e alguns dos seus membros, como Brasil, Angola e Moçambique, têm recursos suficientes
para sustentar este posto. Eu é que convidei o embaixador Murargy para vir tomar parte
na reunião de reflexão e de concertação dos parceiros, incluindo os bilaterais, como
Espanha, China e Rússia, a fim de adotarmos uma posição conjunta sobre o calendário
político da transição, designadamente a questão da formação do Governo alargado. Cada
parceiro identificará a área em que focalizará o seu apoio.