A eleição dos Pontífices desde os primeiros séculos
Cidade do Vaticano (RV) – “Aumentando cada dia o número de seguidores em Jerusalém,
os Apóstolos convocaram a multidão dos fiéis e disseram: ‘Procurai, irmãos, entre
vós, sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais confiaremos
este encargo’ “ (Atos dos Apóstolos 6,3).
Assim, desde o início da Igreja,
este foi um costume que vigorou por muito tempo na eleição dos bispos. A eleição contemplava
a participação da comunidade dos fiéis, do clero local e dos bispos da vizinhança.
Roma não foi exceção. Mesmo o Papa, como bispo de Roma, por mais de 1.000 anos foi
eleito desta forma.
É difícil estabelecer exatamente o papel desempenhado por
cada grupo de participantes, como os fiéis, o clero ou os bispos. Provavelmente os
fiéis expressavam os seus desejos, faziam propostas; o clero avaliava os candidatos
e os bispos elegiam, mas sobretudo, consagravam o escolhido. Daqui vem a expressão
‘o povo aclama, o clero designa, os bispos elegem”.
Enquanto o número de fiéis
era pequeno e o clero era reduzido, apesar das dificuldades da Igreja nascente, a
eleição do Pontífice, que previa a unanimidade dos eleitores, não encontrou grandes
obstáculos. Assim que foi dada liberdade ao cristianismo e a Igreja começou a se expandir,
ganhando prestígio e influência, as coisas começaram a mudar.
A importância
do cargo de Papa no seio da comunidade cristã e civil e a falta de uma clara e precisa
definição das competências dos vários componentes eleitorais deu lugar a abusos. As
grandes assembleias que se reuniam para proceder à eleição, degeneravam em brigas
e tensões que perturbavam o bom andamento do processo. Para agitar ainda mais o ambiente,
influências políticas tentavam influenciar as eleições. As autoridades civis, sob
o pretexto de garantir a realização das mesmas e a ordem pública, acabavam por cercear
o processo.
Do século IV ao XI, influências do poder temporal nas eleições
do Papa eram sempre mais preocupantes. Os imperadores romanos, os reis, os imperadores
do Oriente, os carolíngios, as famílias feudais, e por fim, os imperadores alemães,
tentaram de várias formas, controlar as eleições do Papa. A ingerência do poder temporal
se manifestava de várias formas, desde aprovação e confirmação do eleito até mesmo
à nomeação efetiva do Pontífice mediante pressões exercidas de várias formas sobre
os eleitores, que poderiam chegar ao constrangimento com uso de violência e ameaças.
A
situação tornou-se intolerável. Era urgente uma reforma profunda que tirasse a eleição
do Papa da influência e violência do poder civil e político e das facções populares.
O protagonista de todo o movimento de reforma que pretendia restituir exclusivamente
à Igreja a tarefa de eleger os seus bispos, e sobretudo o Pontífice, foi Gregório
VII. Inicialmente como conselheiro de diversos pontífices e posteriormente como Papa,
ele idealizou e promoveu uma grande transformação.
Em 1059, Nicolau II, num
Concílio realizado em Latrão com a participação de 112 bispos italianos, promulgou
a Bula “In nomine Domini” que modificava radicalmente os procedimentos para
eleger o Pontífice. O documento reservava a eleição do Papa exclusivamente aos Cardeais
bispos. Aos outros membros do clero e do povo, em observância a antigas tradições,
era concedida exclusivamente a tarefa de aderir à eleição já realizada. Se por causa
de tumultos a eleição não pudesse ser realizada em Roma, os Cardeais-bispos eram autorizados
a reunirem-se em qualquer outro local ou cidade que achassem conveniente.
A
Bula definia enfim que não a consagração ou a entronização, mas sim a eleição conferia
a dignidade de Pontífice. Ao imperador era reconhecida simplesmente a honra de ser
informado do resultado da eleição e concedido o privilégio de confirmá-la.
A
Bula de Nicolau II abriu um novo período na história da eleição do Pontífice. Os cismas,
criados pela criação de anti-papas, se tornam cada vez mais raros. A eleição do Pontífice
assume um ritmo sempre mais normal. O movimento de reforma, idealizado e promovido
por Gregório VII, culminou na Constituição "Licet de vitanda",promulgada
por Alexandre III, em 1179. Com esta constituição, era definitivamente estabelecido
que a eleição do Pontífice cabia unicamente aos Cardeais e que os Cardeais das três
ordens (bispos, presbíteros e diáconos) eram todos igualmente eleitores do Papa e
que era exigida a maioria de 2/3 dos votos.
Em virtude desta Constituição os
cardeais-bispos, os cardeais-presbíteros e os cardeais-diáconos congregam para formar
um corpo único, um verdadeiro e próprio organismo específico, recebendo posteriormente
o nome de Sacro Colegio, pois são investidos de uma idêntica e específica tarefa,
justo pela qualificação de ‘cardeal’ que recebem, ou seja, eleger o Papa, a atribuição
que têm até os dias de hoje. (JE)