2013-02-26 11:24:25

Bento XVI – Uma universalidade orientada para a África


Epítetos e qualificativos de todo o tipo saúdam, desde há dias, Bento XVI que renunciou voluntariamente ao papado. A decisão ressoou a nível planetário. Todos se mostram agora unânimes em reconhecer a grande visão de um homem que, no entanto, nunca cessou de recordar aos seus irmãos em humanidade o dever de reconhecimento perante Deus, criador. As suas reflexões, sempre profundas e centradas no homem e no bem autentico da humanidade, falaram à consciência de todos sem exclusão de ninguém.

Mas há um continente para o qual as tomadas de posição do Papa tiveram um eco particular: a África. É por isso que os africanos sentem como que um orgulho legítimo por ter estado no centro do pensamento do Papa Bento XVI. Num mundo em que contam apenas os potentes, em que a economia, os processos democráticos, as tentativas de desenvolvimento e mesmo a história não suscitam o interesse da comunidade internacional a não ser em temos de comparação e avaliações negativas, o Papa representou uma voz amiga para a África.

No entanto, o Continente não teve senão poucas ocasiões de acolher o Soberano Pontífice no seu território. Duas viagens (2009 e 2011); três países visitados (Camarões, Angola, Benin): é pouco, poder-se-ia dizer. Mas quão significativos foram os seus gestos, os seus pronunciamentos amistosos e, por conseguinte, francos! Sem paternalismos camuflados, nem miserabilismos, o Papa falou de África e à África com uma objectividade singular… Numa postura de coerência, Bento XVI viu nessa África por um lado “um pulmão espiritual para uma humanidade que parece estar em crise de fé e de esperança” e por outro o símbolo dum esforço a fazer para que assuma com responsabilidade o seu próprio destino, não obstante as imposições da História. Essa vontade foi manifestada por Bento XVI já no início do seu pontificado, quando confirmou – não era obrigado a fazê-lo! – uma decisão do seu predecessor, João Paulo II: celebrar no Vaticano uma segunda Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a África. Foi em Outubro de 2009, em volta de temas que não cessariam de estar na base dos seus discursos sobre e para os africanos: paz, justiça e reconciliação.
“A perspectiva de Deus não varia. Através dos séculos e dos tumultos da História visa sempre o mesmo objectivo; para aqueles que são violados na própria dignidade de pessoas humanas” - dizia Bento XVI no encerramento dos trabalhos desse segundo Sínodo africano (25 de Outubro de 2009).

Esse discurso orientado tanto para o exterior como para o interior da própria África, será uma constante do pontificado que agora termina. De cada vez que o Papa se detinha com Chefes de Estado africanos, embaixadores, não se contentava em chorar, juntamente com eles, pelas misérias do continente. Exortou a África a manter-se de pé, a fazer uso responsável de todos os seus recursos: uma população jovem, a sua vitalidade, o seu sentido da vida, a sua religiosidade, os sinais promissores da sua Fé num Deus nunca afastado não obstante as contradições e os falsos testemunhos actuais da parte daqueles que outrora lhe levaram o Evangelho.

Disse-o perante a classe política em Angola em 2009: disse-o de maneira mais clara em Cotonou, no Benin, em Novembro de 2011. Tendo ido entregar a exortação apostólica Africae Munus, fruto das conclusões do Sínodo, o Papa dirigiu à classe dirigente africana um discurso que deveria figurar no compendio do seu legado para o continente.

“Desta tribuna, lanço um apelo a todos os responsáveis políticos e económicos dos países africanos (…). Não priveis os vossos povos da esperança! Não os amputeis da seu futuro mutilando o seu presente!” – insistiu o Papa. “Há demasiados escândalos e injustiças, demasiada corrupção e avidez, demasiado desprezo e mentiras” - frisou antes de passar à assinatura da Exortação Apostólica. Uma exortação em que convida a África crente - “boa nova para a Igreja” - a sê-lo também “para o mundo inteiro”.

África global, portanto, mas também uma África aberta à universalidade. África ponto de destinos, juntamente com o Médio Oriente, não muito longe, e um Ocidente ainda mais próximo mas que passa o tempo a tentar sentir-se longe desse continente, mais longe do que a própria geografia a e historia lho permitem. Na viagem ao Líbano, falando aos bispos da África do Norte, o Papa não perdeu a ocasião para recordar, mais uma vez, a tragédia da bacia do mediterrâneo transformado em cemitério para milhares de africanos à procura duma vida melhor, mas rejeitados por aqueles que ontem lhes pregava o Evangelho do Amor, o único capaz de fazer de cada um de nós um verdadeiro cristão.

É certo que o Papa não pode falar senão a favor dos mais pobres e marginalizados. Mas, agora que o respeito unânime se impõe perante a corajosa demissão, seria ilusório pôr no passivo da sua acção a favor da África a sua tomada de posição em Março de 2009 sobre o preservativo. Pois mesmo então, o seu discurso era um convite à vida responsável, não uma incitação ao naufrágio físico e moral… O Papa deu também mais ênfase à presença, ao seu lado, de colaboradores africanos na Cúria romana e em representações pontifícias. Dizer que Bento XVI foi um verdadeiro amigo para a África não é, portanto, uma questão de dados estatísticos. É no profundo do seu coração, lá onde nenhuma contabilidade é possível, que ele, enquanto pastor universal, reservou, sem dúvida alguma, um lugar para nós.

Albert Mianzoukouta – Programa Francês para a África








All the contents on this site are copyrighted ©.