Bento XVI e a "Deus caritas est", a primeira das três encíclicas de seu Pontificado
Cidade do
Vaticano (RV) - Na série de especiais destes dias dedicada ao Pontificado de Bento
XVI reservamos espaço a uma das heranças mais significativas do alto Magistério de
uma Papa, ou seja, suas Cartas encíclicas.
Em seus quase oito anos de Pontificado,
Bento XVI presenteou-nos três belíssimas encíclicas: Deus caritas est, Spe salvi e
Caritas in veritate.
Na edição de hoje nos dedicaremos à primeira delas. E
considerando o tempo de que dispomos, o faremos de modo breve, a título de apresentação,
em linhas gerais. Naturalmente, ao lançar um olhar sobre cada uma delas nosso objetivo
subjacente é convidar você, amigo ouvinte, a ir à fonte, à leitura de cada encíclica
em questão.
Pois bem, a Deus caritas est (Deus é amor), foi publicada em 25
de dezembro de 2005, à distância de apenas 8 meses do início do Pontificado de Bento
XVI.
Trata-se de um texto breve que apresenta, verdadeiramente, a “essência”
do Cristianismo. O Papa procura apresentar uma “fórmula sintética da existência cristã”:
Deus é amor e os cristãos acreditam nesse amor, fazendo dele a “opção fundamental”
da sua vida.
O texto é estruturado em duas partes. A primeira, mais teórica,
unifica os conceitos de eros (amor entre homem e mulher) e agape (a caridade, o amor
que se doa ao outro); na segunda, centraliza-se na ação caritativa da Igreja, que
se apresenta como mais do que uma mera forma de “assistência social”, mas como uma
parte essencial da sua natureza.
Bento XVI apresenta à Igreja o que considera
essencial sobre a fé cristã, aquilo que muitos dão por adquirido, mas que tantas vezes
esquecem. Apresenta o horizonte do Cristianismo, o programa de Jesus: amar a Deus
e amar o próximo.
A temática do amor é urgente, é eterna, está na origem do
homem e espera-o no fim do seu caminho. Tudo isto é dito pelo Papa, com uma linguagem
onde ressalta a sua sólida formação teológica, filosófica e cultural, com citações
de outros Papas, do Magistério da Igreja, de filósofos da antiguidade e modernos,
de escritores clássicos.
Bento XVI procura responder às perguntas mais profundas
da humanidade sobre a sua existência e o seu destino, lembrando que, no final dos
tempos, será o amor o critério definitivo para decidir sobre “o valor ou a inutilidade
de uma vida”.
Como reconhece o Papa, “num mundo em que ao nome de Deus se associa,
às vezes, a vingança ou mesmo o dever do ódio e da violência”, falar de Deus como
amor “é uma mensagem de grande atualidade e de significado muito concreto”.
Deus
é apresentado, nesta encíclica, como “Criador do Céu e da Terra”, “fonte originária
de todo o ser”, “Deus de todos os homens”, como Deus que “é amor que perdoa” e se
apaixona pelo seu Povo, apontando-lhe o caminho do “verdadeiro humanismo”.
A
encíclica parte de uma citação da I Carta de São João: “Deus é amor, e quem permanece
no amor permanece em Deus e Deus nele” (1 Jo 4,16). Hoje, como lembra o Papa, o amor
é utilizado por tudo e por nada, o que faz com que, na maioria dos casos, estejamos
na presença de caricaturas e não do verdadeiro amor. “O termo «amor» tornou-se hoje
uma das palavras mais usadas e mesmo abusadas, à qual associamos significados completamente
diferentes”, constata.
Por isso, defende no seu documento que é preciso voltar
à origem, “ao amor com que Deus nos cumula e que deve ser comunicado aos outros”.
O
Cristianismo, escreve o Papa, nasce do encontro com um acontecimento, “com uma Pessoa
que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, um rumo decisivo”. Não há, aí, nada
de abstrato e é por isso que Bento XVI dedica a segunda parte da sua encíclica ao
que denomina “A prática do amor pela Igreja, enquanto «comunidade de amor»”.
A
encíclica deixa claro que esta ação não é uma mera assistência social, um “serviço
meramente técnico de distribuição” ou uma forma de ativismo político-ideológico.
“Toda
a atividade da Igreja é manifestação dum amor que procura o bem integral do homem”,
lê-se.
Para o Papa, a atenção para com os mais necessitados é uma resposta
ao amor que vem Deus e exprime uma dimensão fundamental da Igreja, “um dos seus âmbitos
essenciais”, tão intrínseco à sua natureza como a própria celebração dos Sacramentos
ou o anúncio do Evangelho.
Nenhuma destas dimensões pode estar separada uma
da outra, como sublinha o Papa: Se na minha vida negligencio completamente a atenção
ao outro, importando-me apenas com ser « piedoso » e cumprir os meus « deveres religiosos
», então definha também a relação com Deus.
A união com Cristo é, ao mesmo
tempo, união com todos os outros aos quais Ele Se entrega. (Ecclesia/RL)