Bento XVI na inauguração do Ano Judiciário do Tribunal da Rota Romana: "somente abrindo-se
à verdade de Deus é possível compreender e realizar, na realidade da vida matrimonial
e familiar, a verdade do homem como filho de Deus!"
Cidade do Vaticano (RV) - O Papa Bento XVI recebeu na Sala Clementina, neste
sábado, os membros do Tribunal da Rota Romana, para a inauguração do ano judiciário.
No
seu discurso, o Santo Padre refletiu de modo particular, sobre alguns aspectos da
relação entre fé e matrimônio, observando que “a atual crise de fé em várias partes
do mundo traz consigo uma crise da união conjugal, com toda a carga de sofrimento
e mal-estar que recai também sobre os filhos”. E recordou o Código Canônico que designa
a realidade natural do matrimônio, como um pacto irrevogável entre um homem e uma
mulher.
Prosseguindo sua meditação sobre o matrimônio, Bento XVI ressaltou
que “no plano teológico, a relação entre fé e matrimônio adquire um significado ainda
mais profundo. O vínculo matrimonial, de fato, embora realidade natural, entre os
batizados foi elevado por Cristo à dignidade de Sacramento”.
“O pacto de indissolubilidade
entre homem e mulher, não exige, para fins de sacramentalidade, a fé pessoal dos esposos;
aquilo que se requer, como condição mínima necessária, é a intenção de fazer aquilo
que a Igreja faz. Mas é importante não confundir o problema da intenção com aquele
da fé dos pretendentes. Porém, não é possível separar isto totalmente”.
Referindo-se
ao pronunciamento do beato João Paulo II ao mesmo tribunal, há 10 anos, Bento XVI
precisou que “uma atitude do noivos que não leva em consideração a dimensão sobrenatural
do casamento pode torná-lo inválido somente se isso afeta a validade no plano natural
no qual é colocado o mesmo sinal sacramental”.
Bento XVI advertiu que “a cultura
contemporânea, marcada por um acentuado subjetivismo e relativismo ético e religioso,
coloca a pessoa e a família diante de prementes desafios. Em primeiro lugar em relação
à capacidade de um ser humano de unir-se, e se é possível que essa união dure toda
uma vida e se isto corresponde realmente à natureza humana, ou mesmo, se esta união
não estaria em contraste com a liberdade humana e com a sua auto-realização. Isto
faz parte – prossegue o pontífice - de uma mentalidade muito difundida de que a pessoa
se torna ela mesmo, permanecendo autônoma e entrando com contato com o outro somente
através de relações que podem ser interrompidas a qualquer momento”.
A esta
questão o Santo Padre responde – fazendo referência ao Evangelho de João 15, 5 <<
Quem permanece em mim e eu nele, este dá muito fruto, porque sem mim, nada podeis
fazer >> - que “somente abrindo-se à verdade de Deus é possível compreender e realizar,
na realidade da vida conjugal e familiar, a verdade do homem como filho, regenerado
pelo Batismo”. E adverte que “a recusa da proposta divina conduz a um profundo desequilíbrio
em todas as relações humanas”, “levando a uma falsa compreensão da liberdade e da
auto-realização, que unida à fuga diante de sofrimentos que exigem paciência, condena
o homem a fechar-se no seu egocentrismo”.
Bento XVI recorda em seguida, que
“a fé em Deus, sustentada pela graça divina, é um elemento muito importante para viver
a mútua dedicação e a fidelidade conjugal. “Não se pretende com isto afirmar que a
fidelidade, como as outras propriedades, não seja possível no matrimônio natural,
contrato entre não batizados. Este, de fato, não é privado dos bens que provém de
Deus Criador e se inserem em modo intrínseco no amor esponsal que une Cristo à Igreja”.
Referindo-se
à célebre “Carta à mulher”, de Tertuliano, o Pontífice explica que ele “escreve que
os cônjuges cristãos são verdadeiramente uma só carne e onde a carne é única, único
também é o espírito. Juntos rezam, juntos se prostram e juntos jejuam; um admoesta
o outro, um honra o outro, um apóia o outro”.
E usando o exemplo dos santos
que viveram a união matrimonial e familiar numa perspectiva cristã, Bento XVI recorda
que “conseguiram superar também as situações mais adversas, alcançando muitas vezes,
a santificação do cônjuge e dos filhos com um amor sempre mais reforçado por uma sólida
confiança em Deus, de uma sincera piedade religiosa e de uma intensa vida sacramental”.
“Estas experiências marcadas pela fé – continuou o Santo Padre – fazem compreender
como, ainda hoje, é precioso o sacrifício oferecido pelo cônjuge abandonado ou que
tenha sofrido o divórcio, se - reconhecendo a indissolubilidade do vínculo matrimonial
válido , consegue não deixar-se <>”.
A seguir o Papa reflete a importância da fé no matrimônio
cristão, destacando que ela “é importante na realização do autêntico bem conjugal,
que consiste simplesmente no querer sempre o bem do outro” e “que esta faz crescer
e frutificar o amor dos esposos, dando espaço à presença do Deus Trinitário”.
Concluindo
seu discurso aos juízes da Rota Romana, o Pontífice afirmou que “com as presentes
considerações, não pretendo certamente sugerir algum fácil automatismo entre carência
de fé e nulidade da união matrimonial, mas antes, individuar como tal carência possa,
embora não necessariamente, ferir também os bens dos matrimônio, a partir do momento
que a referência à ordem natural desejada por Deus seja inerente ao pacto conjugal”.
(JE)