"Redes sociais: portais de verdade e de fé": leia Mensagem de Bento XVI
Cidade do Vaticano (RV) – No dia em que a Igreja celebra S. Francisco de Sales,
padroeiro dos jornalistas, a Sala de Imprensa da Santa Sé apresentou na manhã desta
quinta-feira a Mensagem de Bento XVI para o Dia Mundial das Comunicações Sociais,
que será celebrado em 12 de maio.
“Redes sociais: portais de verdade e de fé;
novos espaços de evangelização” é o título da Mensagem, que publicamos a seguir:
Amados
irmãos e irmãs,
Encontrando-se próximo o Dia Mundial das Comunicações Sociais
de 2013, desejo oferecer-vos algumas reflexões sobre uma realidade cada vez mais importante
que diz respeito à maneira como as pessoas comunicam atualmente entre si; concretamente
quero deter-me a considerar o desenvolvimento das redes sociais digitais que estão
a contribuir para a aparição duma nova ágora, duma praça pública e aberta onde as
pessoas partilham ideias, informações, opiniões e podem ainda ganhar vida novas relações
e formas de comunidade.
Estes espaços, quando bem e equilibradamente valorizados,
contribuem para favorecer formas de diálogo e debate que, se realizadas com respeito
e cuidado pela privacidade, com responsabilidade e empenho pela verdade, podem reforçar
os laços de unidade entre as pessoas e promover eficazmente a harmonia da família
humana. A troca de informações pode transformar-se numa verdadeira comunicação, os
contatos podem amadurecer em amizade, as conexões podem facilitar a comunhão. Se as
redes sociais são chamadas a concretizar este grande potencial, as pessoas que nelas
participam devem esforçar-se por serem autênticas, porque nestes espaços não se partilham
apenas ideias e informações, mas em última instância a pessoa comunica-se a si mesma.
O
desenvolvimento das redes sociais requer dedicação: as pessoas envolvem-se nelas para
construir relações e encontrar amizade, buscar respostas para as suas questões, divertir-se,
mas também para ser estimuladas intelectualmente e partilhar competências e conhecimentos.
Assim as redes sociais tornam-se cada vez mais parte do próprio tecido da sociedade
enquanto unem as pessoas na base destas necessidades fundamentais. Por isso, as redes
sociais são alimentadas por aspirações radicadas no coração do homem.
A cultura
das redes sociais e as mudanças nas formas e estilos da comunicação colocam sérios
desafios àqueles que querem falar de verdades e valores. Muitas vezes, como acontece
também com outros meios de comunicação social, o significado e a eficácia das diferentes
formas de expressão parecem determinados mais pela sua popularidade do que pela sua
importância intrínseca e validade. E frequentemente a popularidade está mais ligada
com a celebridade ou com estratégias de persuasão do que com a lógica da argumentação.
Às vezes, a voz discreta da razão pode ser abafada pelo rumor de excessivas informações,
e não consegue atrair a atenção que, ao contrário, é dada a quantos se expressam de
forma mais persuasiva. Por conseguinte os meios de comunicação social precisam do
compromisso de todos aqueles que estão cientes do valor do diálogo, do debate fundamentado,
da argumentação lógica; precisam de pessoas que procurem cultivar formas de discurso
e expressão que façam apelo às aspirações mais nobres de quem está envolvido no processo
de comunicação. Tal diálogo e debate podem florescer e crescer mesmo quando se conversa
e toma a sério aqueles que têm ideias diferentes das nossas. «Constatada a diversidade
cultural, é preciso fazer com que as pessoas não só aceitem a existência da cultura
do outro, mas aspirem também a receber um enriquecimento da mesma e a dar-lhe aquilo
que se possui de bem, de verdade e de beleza» (Discurso no Encontro com o mundo da
cultura, Belém, Lisboa, 12 de Maio de 2010).
O desafio, que as redes sociais
têm de enfrentar, é o de serem verdadeiramente abrangentes: então beneficiarão da
plena participação dos fiéis que desejam partilhar a Mensagem de Jesus e os valores
da dignidade humana que a sua doutrina promove. Na realidade, os fiéis dão-se conta
cada vez mais de que, se a Boa Nova não for dada a conhecer também no ambiente digital,
poderá ficar fora do alcance da experiência de muitos que consideram importante este
espaço existencial. O ambiente digital não é um mundo paralelo ou puramente virtual,
mas faz parte da realidade quotidiana de muitas pessoas, especialmente dos mais jovens.
As redes sociais são o fruto da interação humana, mas, por sua vez, dão formas novas
às dinâmicas da comunicação que cria relações: por isso uma solícita compreensão por
este ambiente é o pré-requisito para uma presença significativa dentro do mesmo.
A
capacidade de utilizar as novas linguagens requer-se não tanto para estar em sintonia
com os tempos, como sobretudo para permitir que a riqueza infinita do Evangelho encontre
formas de expressão que sejam capazes de alcançar a mente e o coração de todos. No
ambiente digital, a palavra escrita aparece muitas vezes acompanhada por imagens e
sons. Uma comunicação eficaz, como as parábolas de Jesus, necessita do envolvimento
da imaginação e da sensibilidade afetiva daqueles que queremos convidar para um encontro
com o mistério do amor de Deus. Aliás sabemos que a tradição cristã sempre foi rica
de sinais e símbolos: penso, por exemplo, na cruz, nos ícones, nas imagens da Virgem
Maria, no presépio, nos vitrais e nos quadros das igrejas. Uma parte consistente do
património artístico da humanidade foi realizado por artistas e músicos que procuraram
exprimir as verdades da fé.
A autenticidade dos fiéis, nas redes sociais, é
posta em evidência pela partilha da fonte profunda da sua esperança e da sua alegria:
a fé em Deus, rico de misericórdia e amor, revelado em Jesus Cristo. Tal partilha
consiste não apenas na expressão de fé explícita, mas também no testemunho, isto é,
no modo como se comunicam «escolhas, preferências, juízos que sejam profundamente
coerentes com o Evangelho, mesmo quando não se fala explicitamente dele» (Mensagem
para o Dia Mundial das Comunicações Sociais de 2011). Um modo particularmente significativo
de dar testemunho é a vontade de se doar a si mesmo aos outros através da disponibilidade
para se deixar envolver, pacientemente e com respeito, nas suas questões e nas suas
dúvidas, no caminho de busca da verdade e do sentido da existência humana. A aparição
nas redes sociais do diálogo acerca da fé e do acreditar confirma a importância e
a relevância da religião no debate público e social.
Para aqueles que acolheram
de coração aberto o dom da fé, a resposta mais radical às questões do homem sobre
o amor, a verdade e o sentido da vida – questões estas que não estão de modo algum
ausentes das redes sociais – encontra-se na pessoa de Jesus Cristo. É natural que
a pessoa que possui a fé deseje, com respeito e tacto, partilhá-la com aqueles que
encontra no ambiente digital. Entretanto, se a nossa partilha do Evangelho é capaz
de dar bons frutos, fá-lo em última análise pela força que a própria Palavra de Deus
tem de tocar os corações, e não tanto por qualquer esforço nosso. A confiança no poder
da ação de Deus deve ser sempre superior a toda e qualquer segurança que possamos
colocar na utilização dos recursos humanos. Mesmo no ambiente digital, onde é fácil
que se ergam vozes de tons demasiado acesos e conflituosos e onde, por vezes, há o
risco de que o sensacionalismo prevaleça, somos chamados a um cuidadoso discernimento.
A propósito, recordemo-nos de que Elias reconheceu a voz de Deus não no vento impetuoso
e forte, nem no tremor de terra ou no fogo, mas no «murmúrio de uma brisa suave» (1
Rs 19, 11-12). Devemos confiar no facto de que os anseios fundamentais que a pessoa
humana tem de amar e ser amada, de encontrar um significado e verdade que o próprio
Deus colocou no coração do ser humano, permanecem também nos homens e mulheres do
nosso tempo abertos, sempre e em todo o caso, para aquilo que o Beato Cardeal Newman
chamava a «luz gentil» da fé.
As redes sociais, para além de instrumento de
evangelização, podem ser um fator de desenvolvimento humano. Por exemplo, em alguns
contextos geográficos e culturais onde os cristãos se sentem isolados, as redes sociais
podem reforçar o sentido da sua unidade efetiva com a comunidade universal dos fiéis.
As redes facilitam a partilha dos recursos espirituais e litúrgicos, tornando as pessoas
capazes de rezar com um revigorado sentido de proximidade àqueles que professam a
sua fé. O envolvimento autêntico e interativo com as questões e as dúvidas daqueles
que estão longe da fé, deve-nos fazer sentir a necessidade de alimentar, através da
oração e da reflexão, a nossa fé na presença de Deus e também a nossa caridade operante:
«Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como
um bronze que soa ou um címbalo que retine» (1 Cor 13, 1).
No ambiente digital,
existem redes sociais que oferecem ao homem atual oportunidades de oração, meditação
ou partilha da Palavra de Deus. Mas estas redes podem também abrir as portas a outras
dimensões da fé. Na realidade, muitas pessoas estão a descobrir – graças precisamente
a um contato inicial feito on line – a importância do encontro direto, de experiências
de comunidade ou mesmo de peregrinação, que são elementos sempre importantes no caminho
da fé. Procurando tornar o Evangelho presente no ambiente digital, podemos convidar
as pessoas a viverem encontros de oração ou celebrações litúrgicas em lugares concretos
como igrejas ou capelas. Não deveria haver falta de coerência ou unidade entre a expressão
da nossa fé e o nosso testemunho do Evangelho na realidade onde somos chamados a viver,
seja ela física ou digital. Sempre e de qualquer modo que nos encontremos com os outros,
somos chamados a dar a conhecer o amor de Deus até aos confins da terra.
Enquanto
de coração vos abençoo a todos, peço ao Espírito de Deus que sempre vos acompanhe
e ilumine para poderdes ser verdadeiramente arautos e testemunhas do Evangelho. «Ide
pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura» (Mc 16, 15).
Vaticano,
24 de Janeiro – Festa de São Francisco de Sales – do ano 2013.