Prof. Felice: Para o Papa os homens são mais importantes que os sistemas econômicos
Cidade do Vaticano (RV) - “Não resignar-se ao spread (contração) do
bem-estar social, ao mesmo tempo em que se combate o spread da finança”: é
esta uma das passagens mais significativas do discurso que o Papa Bento XVI dirigiu
ontem ao Corpo Diplomático acreditado junto à Santa Sé. O Papa afirmou, além disto,
que a atual crise econômica é derivada de um “aventurar-se sem freios na estrada da
economia financeira, antes do que aquela real”. Especialmente sobre este último aspecto
a Rádio Vaticano conversou com o economista Flavio Felice, diretor da Área de Pesquisa
Internacional “Caritas in Veritate”, da Universidade Lateranense:
"A referência
que Bento XVI faz à crise financeira é muito interessante, pois hoje existem estudos
bastante confiáveis que individuam exatamente esta “‘financeirização” da economia
por causa da crise econômica. O Papa não coloca em contraste, não cria uma oposição
entre economia real e economia financeira, mas sim individua na economia financeira
um instrumento, um meio necessário, mas que necessariamente deve ser limitado, ou
tanto menos, deve ser colocado dentro de uma ordem da economia que veja na finança
um instrumento e não um fim em si mesmo”.
O Papa também destaca, na Mensagem
para a Jornada Mundial da Paz, a importância do trabalho: trabalho para a dignidade
da pessoa....
“Sem dúvida. A tarefa, o objetivo de um instrumento como o
da finança, só pode ser o aumento da produtividade. E é somente o aumento da produtividade
que consente às atividades econômicas de garantir posteriormente um maior número de
postos de trabalho. Os postos de trabalho não nascem do nada, mas de uma ação, de
uma atividade produtiva extremamente eficaz: quanto mais é eficaz, maior é a possibilidade
de gerar mais emprego, e assim, reiniciar todo o ciclo econômico. Portanto, o objetivo
é o trabalho”.
Com uma fórmula eficaz, o Papa, em particular, pede aos
líderes da Europa de “não resignar-se ao spread do bem-estar social enquanto
se combate aquele da finança”. De qualquer maneira, o Papa nos diz que o primeiro
spread é aquele entre pobres e ricos…
“Penso que esta afirmação,
na realidade, possa ser entendida plenamente se lida com uma chave: uma chave que
Bento XVI nos mostra em uma passagem muito interessante, no fim da parte econômica
do seu discurso, quando fala da educação. Ele nos diz que sair da crise significa,
em primeiro lugar, trabalhar para a justiça, e para isto não bastam apenas bons modelos
econômicos. Frequentemente entre os economistas se fala sobre a eficácia dos modelos
econômicos, sobre quais seriam os melhores. Mas a realidade é outra: os sistemas econômicos
são para o homem. Um sistema econômico funciona somente se as pessoas podem sentir
isto, se conseguem percebê-lo como coerente e de acordo com sua dignidade. Só se sai
de uma crise colocando no centro a educação, a justiça, a equidade. Tudo isto significa
pensar em um modelo: não a um novo modelo econômico, mas a um modelo social, a uma
antropologia que torne possível aos modelos econômicos de avaliarem-se, de medirem-se
em um modo coerente e não simplesmente baseados em uma lógica matemática, que pode
até funcionar do ponto de vista puramente lógico, porém acaba se revelando ineficaz”.
(JE)