A crise e o futuro: Editorial Europeu (de Salvatore Sabatino)
A Europa olha para o novo ano com uma carga de problemas de não fácil solução. A pobreza,
em primeiro lugar, que só no Velho Continente afeta quase 120 milhões de pessoas –
um em cada quatro cidadãos, para os quais a vida quotidiana é feita de dificuldades
e renúncias. O desemprego, em segundo lugar, com todas as suas consequências sociais
devastadoras: desde 2008 perderam-se mais de 26 milhões de empregos, e nalguns países
mais de 50% dos jovens não têm emprego. Entretanto, aumenta o número dos desalojados
que, de fenómeno de marginalização extrema, se está a tornar cada vez mais frequente
e possível, até porque a capacidade da família – verdadeiro porto seguro onde atracar
em caso de necessidade - é cada vez mais posta em dura dificuldade Mas um novo modelo
económico e social é possível, como observa, no editorial europeu desta semana, o
colega italiano, Salvatore Sabatino.
"Eu sou Europa, nós somos Europa".
Mais do que um slogan, uma ideia de convivência, solidariedade e partilha, susceptível
de ser posta em discussão pela vaga crescente da crise que arrastou consigo os princípios
europeus dos Pais Fundadores. O que dita a agenda hoje não é o sentido da união, mas
a crise, que se tornou a palavra mais frequente, não só entre as pessoas, mas sobretudo
entre as Instituições. Porque a crise não é um conceito, mas uma realidade que tem
impacto sobre a vida diária de mais de 500 milhões de cidadãos europeus. Mesmo
assim, a Europa reagiu, embora lentamente, colocando no campo as suas melhores forças
e construindo uma barreira de intervenções, embora porventura demasiadamente centrada
numa arrojada visão "puramente" económica. Tudo isto à custa dos cidadãos, sobre os
quais a crise se repercute como um terramoto, criando gravíssimas consequências sociais.
Isto transforma-se em falta de equidade, e numa crise que, mais do que económica,
se torna crise de confiança, com o risco de uma progressiva separação entre Instituições
e cidadãos. E o maior perigo é que o próprio sistema social europeu, verdadeiro modelo
para o mundo inteiro, corre o risco de morrer. Onde estão os direitos básicos? Onde
foi parar o sentido de solidariedade? O que será feito da Europa? Os analistas
estão quase todos concentrados nos dados económicos. 2013 constituirá o ano da mudança;
só a partir de 2014 se começará a crescer novamente. Por outro lado, crescem os projectos
de "micro-crédito", para financiar iniciativas de pequena escala capazes de relançar
a base. Aposta-se no intercâmbio de bens para permutar géneros de primeira necessidade.
Acontece sobretudo na Grécia, mas também noutros países, como a Espanha, Eslováquia,
Itália, e mesmo, recentemente, na França. Métodos de intervenção em linha
com o que se disse também na COMECE - as Conferências Episcopais da Europa, que propõe
como receita para a crise um "modelo europeu de economia social de mercado", para
oferecer uma protecção eficaz aos mais vulneráveis. E isto porque a crise é também
ético - cultural, e portanto antropológica. Quem o diz é o Conselho das Conferências
Episcopais da Europa, segundo o qual não se pode pensar em dialogar com o mundo apenas
abordando os problemas; há que enfrentar também os pressupostos culturais dos mesmos
problemas. Estas intervenções indicam as necessárias raízes de solidariedade; raízes
que estão interligadas com outras raízes, as raízes cristãs, que uma Europa distraída
deixou sem água e agora correm o risco de morrer. Ah, se os europeus tivessem assumido
como própria a mensagem emersa da Encíclica "Caritas in Veritate"! Nela, Bento XVI
lançou uma luz muito além do limite do horizonte, sublinhando com forte ênfase que
há que procurar a verdade e exprimi-la na "economia" da caridade, mas esta por sua
vez deve ser compreendida, valorizada e praticada à luz da verdade. A Europa pode
recomeçar a partir deste conceito. E todos nós poderíamos dizer com orgulho: "Eu sou
Europa, nós somos Europa." Salvatore Sabatino