2012-12-05 11:13:45

Sanya, o distrito maldito de Tóquio


RealAudioMP3 Tóquio (RV) - É com imensa alegria e forte esperança que saúdo aos ouvintes do Programa Brasileiro.

Parece ser grande e verdadeira a ideia de que a pessoa sábia medita sobre a história para organizar seu presente e projetar seu futuro. Contudo existe também a atitude contrária. `É o caso de Sanya no distrito de Tóquio, que, no passado, foi um grande distrito e hoje não está em nenhum mapa. Para entender o motivo do cancelamento de Sanya no mapa é preciso fazer um retrospecto histórico. Durante o período Edo(1603-1868), que marca a reestruturação do Japão, trabalhadores de couro, caçadores, açougueiros, preparadores de corpos para os funerais e criminosos eram confinados em Sanya. Foram chamados de "burakumin" ou "eta-hinin". Não eram considerados seres humanos. Por isso deviam viver no gueto. Discriminá-los era um dever. Por exercerem trabalhos considerados sujos, deveriam dedicar-se única e exclusivamente a eles. Era uma classe de pessoas intocáveis, sujas e proibidas de se misturar com outras pessoas.

Embora Sanya não apareça em nenhuma indicação de trânsito ou estações de trem, pode-se ler um letreiro "Namidabashi", traduzido, "Ponte das Lágrimas", sobre a qual os condenados à morte acenavam aos familiares, antes de serem levados para o campo de execução, hoje coberto pela malha ferroviária.
A rua principal também tem um nome muito significativo: "Kotsu Dori", ou seja," Rua dos Ossos", fazendo referência à exibição de cabeças humanas enfileiradas depois da execução.

Durante a segunda Guerra Mundial, como a maior parte do Japão, Tóquio foi praticamente destruída. Foi necessária muita mão de obra para reconstruí-la. Acossados pela necessidade, muitos trabalhadores saíram de suas províncias para trabalhar na capital, deixando para trás as famílias. Estas, na sua maioria, não quiseram abrir-lhes as portas quando pretendiam regressar, após terminar os trabalhos, por considerar vergonhoso ter um desempregado na família. Como não havia outros empregos para eles, o destino de muitos homens foi engrossar o gueto de Sanya que se transformou em sua nova família.

Com a intenção de apagar uma história de horrores, faz sessenta e seis anos que Sanya deixou de existir como divisão política. Contudo, ainda permanece o gueto Sanya com seus habitantes excluídos, sem teto, discriminados, sem cidadania. É uma região que destoa completamente dentro da rica Tóquio. É impressionante o número de pessoas que dormem nas ruas, sob as marquises dos edifícios, parques e coberturas. Quem passa procura evitar fazer barulho para que possam dormir tranquilos. Ao contrário do que se poderia pensar em situações como essa, aqui, pobreza não é sinônimo de sujeira. As pessoas recolhem o lixo e mantêm os locais limpos.

Tive a grata experiência de me unir a um dos diversos grupos que, à noite, distribuem comida àqueles que fizeram da "inexistente Sanya" sua casa. Eles mesmos organizam a fila e o sistema para receber a comida. Ninguém passa à frente. Não existe empurra-empurra. Com extrema humildade e gratidão cada pessoa abre sua bolsa para que nela depositemos o pão e o bolo de arroz enquanto, ao lado, lhes é servida uma sopa.

Sanya já não existe para os grandes, mas o fato Sanya está a indicar que o caminho para sentar, fraternalmente, à mesa e partilhar do mesmo pão ainda é longo. A esperança não nos deixa desistir do projeto da fraternidade universal.

Missionário Pe. Olmes Milani CS

Do Japão para a Rádio Vaticano







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