Juiz de Fora (RV) - Não é a primeira vez que somos convocados a rever a nossa
condição de seguidores e imitadores de Jesus Cristo. Tivemos as propostas do Concílio
Vaticano II; em 1967 o Ano da Fé proclamado por Paulo VI, encerrando o mesmo com uma
belíssima Profissão de Fé do Povo de Deus.
Aconteceram as Conferências Gerais
do Episcopado Latino-americano e Caribenho de Medellín, de Puebla, de Santo Domingo,
de Aparecida, todas elas ricas em conclusões e propostas práticas de renovação eclesial.
Fomos brindados com o Catecismo da Igreja Católica que neste ano comemora 20 anos.
O Catecismo foi querido e promulgado pelo Beato João Paulo II e foi trabalho de fôlego
do Papa Bento XVI, então Prefeito da Congregação da Doutrina da Fé. Os Sínodos trouxeram
para a Igreja propostas atualíssimas. Os Anos Temáticos: do Rosário, da Eucaristia,
Ano Paulino e o Ano Sacerdotal, também com proposições práticas para a caminhada da
Igreja. Cartas e Encíclicas dos últimos Papas não nos faltaram nos momentos oportunos.
Agora temos o ANO DA FÉ.
Um bom exame de consciência: Será que todo esse
acervo de documentação eclesial é conhecido de todos os bispos, presbíteros, diáconos,
religiosos e religiosas, agentes de pastoral, leigos e leigas da própria Igreja Católica
Apostólica Romana? E se são conhecidos são também vivenciados, colocados em prática?
Será que foram suficientemente estudados e refletidos em nossos Seminários, Universidades,
Faculdades e Escolas Católicas?
As motivações são variadas e os apelos de nossos
Papas se fundamentam sempre em princípios semelhantes.
Com relação aos inúmeros
apelos anteriores, será que foram atendidos satisfatoriamente por todos os membros
do Povo de Deus? O que se esperava deste mesmo povo, aconteceu? O que se esperava
da Conferência de Aparecida em 2007, concretizou em nossas Igrejas particulares, em
nossas paróquias, em nossas comunidades eclesiais?
O que o Papa espera com
o Ano da Fé?
O Papa Bento XVI espera que, além da agenda mundial e de seu universal
apelo, que as Igrejas locais se empenhem em promover iniciativas que proporcionem
aos fiéis a possibilidade de confessar a fé no Senhor Ressuscitado.
Há uma
constatação: estamos em mudança de época; vivemos em situações novas; há uma falta
de horizontes e rumos a tomar; enfrentamos novos desafios dos novos tempos e uma grande
crise de fé.
E o que Bento XVI nos pede? “celebrar este Ano de forma digna
e fecunda. Durante o mesmo deverá intensificar-se a reflexão sobre a fé, para ajudar
todos os crentes em Cristo a tornarem mais conscientes e revigorem a sua adesão ao
Evangelho, sobretudo num momento de profunda mudança como este que a humanidade está
vivendo”(PF, 8a).
O próprio Papa, Bento XVI, afirma que hoje ainda é necessário
“redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar com evidência sempre maior as alegrias
se o renovado entusiasmo do encontro com Cristo”(PF n. 2a). Realmente, não teremos
outra alegria maior na vida do que ter encontrado Jesus Cristo em nossa vida e fazer
parte de sua comunidade eclesial. (cf DAp. n. 14).
Quais são as propostas do
Ano da Fé, segundo o Papa?
Dois objetivos principais, interligados entre si,
são evidentes: “A Renovação da Igreja e a Nova Evangelização”
1- Renovação
da Igreja: o Ano da Fé deve ser um “convite para a autêntica e renovada conversão
ao Senhor, único Salvador do mundo”(PF n. 6b) A fé em Jesus Cristo vivo e ressuscitado
deve envolver toda a vida da Igreja, fortalecendo a santidade de todos os seus membros,
purificando e moldando suas vidas segundo a novidade da Ressurreição. 2- Nova Evangelização:
“o amor de Cristo nos impele”(2 Cor.5,14) a esta nova evangelização. "Também hoje
é necessário, diz Bento XVI, um empenho eclesial mais convicto a favor duma nova evangelização,para
descobrir de novo a alegria de crer e reencontrar o entusiasmo de comunicar a fé”
(PF n.7a)
E quais as Ações Fundamentais a serem intensificadas no decorrer
do Ano da Fé para celebrá-lo de forma digna e fecunda?
1- “Intensificar a reflexão
sobre a fé, para ajudar a todos os crentes em Cristo a tornarem mais conscientes e
revigorarem a sua adesão ao Evangelho.
2- Confessar a fé no Senhor Ressuscitado
com renovada convicção, com confiança e esperança, sentindo fortemente a exigência
de conhecê-la melhor e de transmiti-la às gerações futuras.
3- Intensificar
a celebração da fé, redescobrindo a importância da Liturgia, particularmente a centralidade
da Eucaristia, que é “a meta para a qual se encaminha a ação da Igreja e a fonte de
onde promana toda a sua força".
4- Descobrir novamente os conteúdos da fé professada,
celebrada, vivida e rezada e refletir sobre o próprio ato com que se crê é um compromisso
que cada crente deve assumir, sobretudo neste ano” (PF n. 8 e 9), intensificando o
seu testemunho de vida, pautado pela justiça e pela caridade.”
Bento XVI aponta
dois meios importantes para o fortalecimento da nossa fé no decorrer do Ano da Fé:
1-A
redescoberta do Concílio Vaticano II- bússola a seguir (PF n. 5) para orientar os
planos da Igreja, força para a sua renovação.
2-O estudo sistemático dos conteúdos
da fé (Catecismo da Igreja Católica) norma segura para o ensino da fé e, por isso,
instrumento válido e legítimo ao serviço da comunhão eclesial (PF n.11)
Documento
Conciliar: A própria Constituição Pastoral “Gaudium et spes”, documento conciliar,
já nos advertiu há muito sobre a necessidade de formar as mentes e os corações(Nn.
82-83), reeducando nossas mentes. “Nós todos temos de transformar nossos corações
abrindo os olhos sobre o mundo inteiro e aquelas tarefas que, todos juntos, podemos
cumprir, para o feliz progresso da humanidade. Não nos engane a falsa esperança. Bento
XVI continua repetindo a cada um de nós: ”Este é o tempo propício para se converterem
os corações, este é o dia da salvação”.(1 Cor. 6,2).
Documento de Aparecida:
No
próprio Discurso de 13/05/2007, da Sessão inaugural dos trabalhos na V Conferência
Geral de Aparecida, ( n.2) , o Papa nos recorda:” Esta V Conferência Geral se celebra
em continuidade com as outras quatro que a precederam no Rio de Janeiro, Medellín,
Puebla e Santo Domingo. Com o mesmo espírito que as animou, os pastores querem dar
agora um novo impulso à evangelização, a fim de que estes povos continuem crescendo
e amadurecendo em sua fé, para ser luz do mundo e testemunhas de Jesus Cristo com
a própria vida.” E ainda continua:” Depois da IV Conferência Geral, em Santo Domingo,
muitas coisas mudaram na sociedade. A Igreja, que participa dos gozos e esperanças,
das penas e alegrias de seus filhos, quer caminhar a seu lado neste período de tantos
desafios, para infundir-lhes sempre esperança e consolo”(cf GS,1).
“Nas Comunidades
eclesiais da América Latina é notável a maturidade na fé de muitos leigos e leigas
ativos e entregues ao Senhor, junto com a presença de muitos abnegados catequistas,
de tantos jovens, de novos movimentos eclesiais e de recentes Institutos de vida consagrada.
Demonstram-se fundamentais muitas obras católicas educativas, assistenciais e hospitalares.”
No entanto, continua o Papa: "Percebe-se, contudo, um certo enfraquecimento da vida
cristã no conjunto da sociedade e da própria pertença à Igreja Católica, devido ao
secularismo, ao hedonismo, ao indiferentismo e ao proselitismo de numerosas seitas,
de religiões animistas e de novas expressões pseudo-religiosas.”
“Ante a nova
encruzilhada, os fiéis esperam da V Conferência uma renovação e revitalização de sua
fé em Cristo, nosso único Mestre e Salvador, que nos revelou a experiência do Amor
infinito de Deus Pai aos homens. Desta fonte poderão surgir novos caminhos e projetos
pastorais criativos, que infundam uma firme esperança para viver de maneira responsável
e gozosa a fé e irradiá-la assim no próprio ambiente”.
É preciso que não apenas
alguns julguem que outros devem se converter, mas devemos nos incluir nesses outros,
fazendo um bom exame de consciência. Alguns já estão cansados de assumir sozinhos
o que é tarefa de todos, seja em nível de CNBB, de Regional, de Arquidiocese, de Paróquia,
de Comunidade, a começar da própria Família.
Na própria natureza criada, na
obra de Deus, temos muitos exemplos a seguir, entre mesmos os irracionais. Basta considerar
e refletir o que faz a “comunidade” das formigas, das abelhas, etc. Todas realizam
alguma tarefa, de acordo com suas capacidades, mas todas, em conjunto, e não apenas
algumas. Realizam autênticos mutirões, mas todas são envolvidas obedecendo a um comando.
A Palavra de Deus sempre está a nos motivar uma convivência unida, fraterna e harmoniosa.
Por que não nos esforcemos todos, como batizados, católicos, em sermos realmente discípulos
missionários de Jesus Cristo, para que nossos povos nele tenham vida – Eu sou o Caminho
a Verdade e a Vida”(Jo. 14,6)
Bento XVI, finalizando o seu Discurso, fixou
a atenção sobre alguns campos prioritários, como:
-a Família: "Ela é patrimônio
da humanidade, e constitui um dos tesouros mais importantes dos povos latino-americanos.
Que ela seja verdadeiramente uma escola de fé, palestra de valores humanos e cívicos,
lar em que a vida humana nasce e é acolhida generosa e responsavelmente".
-os
Religiosos, Religiosas e Consagrados: para os quais disse o Papa: "A sociedade latino-americana
e caribenha tem necessidade do vosso testemunho, que lembra a todos que o Reino de
Deus chegou; que a justiça e a verdade são possíveis se nos abrirmos à presença amorosa
de Deus, Uno e Trino. Com generosidade e até ao heroísmo, continuem trabalhando para
que na sociedade reine o amor, a justiça, a bondade, o serviço, a solidariedade, conforme
o carisma dos vossos fundadores”.
-os Leigos e as Leigas: "lembro aos leigos
que são também Igreja, assembleia convocada por Cristo para levar o seu testemunho
ao mundo inteiro: todos os batizados devem tomar consciência de que foram configurados
com Cristo Sacerdote, Profeta e Pastor e devem sentir-se co-responsáveis na construção
da sociedade segundo os critérios do Evangelho, com entusiasmo e audácia, em comunhão
com seus Pastores.”
-os Jovens e a Pastoral Vocacional: "que os jovens sejam
amigos de Cristo, discípulos e sentinelas do amanhã. Eles devem se comprometer por
uma constante renovação do mundo à luz de Deus. Mais ainda: cabe-lhes a tarefa de
opor-se às fáceis ilusões da felicidade imediata e dos paraísos enganosos da droga,
do prazer, do álcool, junto com todas as formas de violência.”
-os Sacerdotes:
"os primeiros promotores do discipulado e da missão são aqueles que foram chamados
“para estar com Jesus e ser enviados a pregar” (cf. Mc 3,14),ou seja, os sacerdotes.
Eles devem receber de modo preferencial a atenção e o cuidado paterno dos seus Bispos,
pois, são os primeiros agentes de uma autêntica renovação da vida cristã no povo de
Deus. A eles quero dirigir uma palavra de afeto paterno desejando "que o Senhor seja
parte da sua herança e do seu cálice” (cf. Sl 16,5). Se o sacerdote fizer de Deus
o fundamento e o centro de sua vida, então experimentará a alegria e a fecundidade
da sua vocação. O sacerdote deve ser antes de tudo um “homem de Deus”(1 Tim 6,11);um
homem que conhece a Deus "em primeira mão”, que cultiva uma profunda amizade com Jesus,
que compartilha os “sentimentos de Jesus” (cf. Fil 2,5). Somente assim o sacerdote
será capaz de levar Deus- o Deus encarnado em Jesus Cristo- aos homens, e de, ser
representante do seu amor. Para imprimir a sua altíssima missão deve possuir uma sólida
estrutura espiritual e viver toda a existência animado pela fé, a esperança e a caridade.Tem
de ser, como Jesus, um homem que procure, através da oração, o rosto e a vontade de
Deus, cultivando igualmente sua preparação cultural e intelectual.”
Por que
retomei estas considerações do Documento de Aparecida? Para trazer à nossa memória
recomendações importantes e que, se não forem acolhidas e praticadas, não teremos
os frutos desejados e esperados no Ano da Fé. Não precisamos de outras motivações.
Basta colocar em prática, as orientações que temos, sem medo de nos lançarmos “em
águas mais profundas”. "DUC IN ALTUM”.
Juiz de Fora, 06 de novembro de 2012
Dom Eurico dos Santos Veloso Arcebispo Emérito de Juiz de Fora - MG