2012-09-23 10:03:41

Servir na Sabedoria e na Paz


Rio de Janeiro (RV) - *A cada domingo, a Palavra de Deus nos ilumina para que possamos entrar numa séria vida de conversão para que, acolhendo a graça de Deus, sermos sinais da vitória do Ressuscitado. Também neste XXV Domingo do Tempo Comum. “A sabedoria que vem do alto é, antes de tudo, pura, depois pacifica, é modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento” (Tg 3, 16).
Quem ouve e reza a Palavra de Deus sabe reconhecer em Jesus Cristo o verdadeiro servidor dos mais necessitados. Este ensinamento Ele nos deixa como legado, ou seja: servir. E nós temos a missão de proclamar que a Igreja é serviço em todos os âmbitos. O cristão não deve ficar disputando lugares ou honrarias. O fiel batizado deve ser o último e não atropelar pessoas e/ou etapas para ser o primeiro. A competição deve ser convertida em doação total de si – serviço: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos”. (Mc 9, 35)
Na Primeira Leitura deste domingo, o livro da Sabedoria, (Sb 2, 12.17-20) dá uma resposta aos “materialistas” da época e de hoje, que podemos encontrar em Isaías 22, 13: “comamos e bebamos, porque amanhã morreremos!” Esta expressão continua sendo repetida desde o tempo de Isaías até os nossos dias. Trata-se da cultura do materialismo, que prega em seus pseudo-dogmas a negação da religião, de Deus e da vida futura. Pelo fato de os israelitas serem fiéis à própria lei, eram perseguidos e zombados por não compactuarem com o estilo materialista daquela região.
Os materialistas consideram um absurdo acreditar em religião, em Deus e na vida futura. Para eles isso é algo ultrapassado. Para eles, o fato de existir um grupo de israelitas fiéis à própria lei, os incomodava. Portanto, perseguiam seus próprios irmãos.
Os “ímpios” não conseguem se adaptar na convivência com o “justo”. Daí decidem: “Armemos ciladas contra o justo... provemo-lo por ultrajes e torturas... condenemo-lo a uma morte infame”. São palavras dirigidas aos israelitas que viviam em Alexandria, no Egito. Por isso, um olhar hermenêutico já nos mostra no horizonte o que acontecerá com Jesus Cristo. Ele também sofreu perseguição pelos próprios irmãos na fé. O que aconteceu naquela época se repete ainda hoje com todos que são transparentes em sua justiça e bondade.
Já a Segunda Leitura deste domingo (Tg 3, 16 - 4,3) nos convida a um olhar clarividente e meditativo sobre a “sabedoria que vem do alto”, diferente da dos homens, muitas vezes sustentada pela inveja, calúnia e desejo de alimentar as próprias vaidades. A sabedoria divina se manifesta no homem que ama, acolhe, é misericordioso, se compadece, que compreende e constrói a paz.
São Tiago, na segunda parte desta perícope, apresenta os motivos, as causas que trazem tantas discórdias tanto entre pessoas como entre as comunidades. Ele denuncia a ganância, o acúmulo dos bens materiais, que leva à divisão e amargura. Daí nasce a cultura da dominação e competição, causando uma corrida como que uma maratona para conquistar os primeiros lugares. Mas os que seguem a “sabedoria que vem do alto” conseguem eliminar pela raiz a causa de tantas disputas e guerras mesquinhas.
O final do texto mostra a vaidade humana. O homem pede a Deus para que capriche nos seus interesses particulares: isto é egoísmo. Devemos pedir a Deus a sabedoria e o discernimento para perceber que nossa maior riqueza é o serviço aos irmãos.
O Evangelho que a liturgia nos convida a refletir neste XXV domingo (Mc 9, 30-37) traz uma continuidade com o que refletimos no domingo passado: a identidade de Jesus. Jesus sabia que seus próprios discípulos tinham dificuldade em compreendê-lo. Portanto, ele insiste por três vezes em tratar de sua verdadeira identidade. É algo sério esta repetição. A de hoje é a segunda vez. Ele anuncia seu sofrimento, perseguição e morte, porém anuncia também sua ressurreição. Ao mesmo tempo tenta fazer com que os discípulos se sintam inseridos neste roteiro, a fim de dar suas próprias vidas.
Os discípulos “não entendiam estas palavras e tinham medo de pedir-lhe explicações” (vv. 30-32). Isso porque talvez eles imaginassem um Messias com poder temporal. Como, então, aceitar o que Jesus diz: perseguição e morte! Isto é uma derrota! Eles nem sequer tinham coragem de questionar Jesus sobre os fatos futuros.
Por isso, a segunda parte do Evangelho mostra a pequenez do pensamento dos discípulos que ficam presos a discussões mesquinhas, disputando qual deles seria o primeiro. Jesus sabe muito bem o que se passa na mente deles e declara a posição de cada um: “Se alguém quer ser o primeiro, seja o último de todos e o servo de todos” (v. 35)
Na nossa cultura hodierna, também vemos o culto aos privilégios, títulos honoríficos, a existência de diferentes classes, a disputa pelas honrarias e primeiros lugares. Para adquirir uma verdadeira identidade cristã é necessário despojar-se e viver na simplicidade como uma criança. A comunidade cristã é o “campo” do amor, da acolhida, da solidariedade e da paz!
Jesus sempre demonstrou muita ternura pelas crianças. “Quem acolhe um destes pequeninos em meu nome, a mim acolhe” (vv. 36-37). Naquele tempo as mães apresentavam seus filhos para que Jesus os acariciasse: “Deixai que as crianças venham a mim e não queirais impedi-las, porque o reino do céu pertence a quem for semelhante a elas”. Com isso Jesus mostra que as crianças são como que um símbolo dos valores do Reino. Todos, portanto, devem se abrir à cultura da “leveza”, compreendendo a fragilidade que cerca o ser humano. Com este gesto significativo de Jesus, Ele ensina aos discípulos a cultura da acolhida aos mais frágeis e marginalizados e também os sentimentos de simplicidade com que devemos estar revestidos.
Sabemos que uma criança é alguém que depende completamente dos outros, sejam os pais, irmãos ou quem guarda custódia sobre ela. Daí a ideia de simplicidade.
Ser simples para que, seguindo Jesus saibamos nos colocar sempre como servidores, tendo um coração de paz que a semeie por onde passa. Isso nos faz sábios e testemunhas do Cristo. Perseguições sempre tivemos e teremos, o que demonstra estarmos no caminho do Senhor.
Eis os tempos que supõem de nós o aprofundamento da fé para uma nova evangelização de nossa sociedade em mudança.
*† Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ








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