Falecido cardeal Araújo Sales, arcebispo emérito do Rio de Janeiro (1971-2001), figura
histórica da Igreja brasileira e da resistência à ditadura
(10/07/2012) No Brasil, faleceu na noite passada, com 91 anos, o cardeal Eugénio de
Araújo Sales, arcebispo emérito do Rio de Janeiro. Nomeado bispo pelo Papa Pio XII,
em 1954, como auxiliar da arquidiocese de Natal, passando em 1962 a arcebispo titular.
Em 1968 passou a arcebispo de São Salvador da Baía. A partir de 1971, e por trinta
anos, foi arcebispo do Rio de Janeiro. Foi Paulo VI a criá-lo cardeal, em 1969. Participou
no Concílio Vaticano II, tendo sido membro da Comissão para o Apostolado dos Leigos
e da Comissão mista que elaborou o esquema da Constituição Pastoral “Gaudium et Spes”.
Em 2003, a colega brasileira da RV, Cristiane Murray, entrevistou Dom Eugénio.
Ouçamos um extrato desse material de arquivo, em que o purpurado fala sobretudo da
sua profunda relação com Paulo VI e da importância de intervir na vida política sempre
na qualidade de pastor… “Tomar posição
diante do fato político, mas com uma postura religiosa, foi para mim o grande alicerce.
Para isto, Paulo VI tratou de muitos trabalhos que tive no sindicato rurais, a fundação
dos sindicatos rurais em Natal, quando estive lá; todas as reuniões com políticos
em que havia muita liberdade de tratar. No Rio tive sistematicamente muitas reuniões
sobre isto e nunca o governo interferiu, porque eu apresentava as posições não como
político mas como pastor, fundamentalmente. Mas o que me deu segurança foi exatamente
a leitura da orientação do Papa, dos documentos, e também as consultas que fazia para
saber com precisão qual a posição de Igreja diante do fato político, não posição política,
mas abordagem pastoral. Aqui está a grande diferença, que foi muito importante na
minha vida. Eu sempre defendo as coisas da Igreja, agrade ou desagrade. Durante
o regime militar, para muitos, eu passava por ser do regime. Muita gente veio perguntar
por que não sabia, porque eu agia como bispo; não fazia comício, mas muita gente foi
atendida porque quando eu, como pastor, e o Presidente da República tratávamos de
assuntos vários, eu dizia com liberdade total, mas se eu fosse dizer isso aos jornais,
não conseguiria o que queria, que não era promoção pessoal, mas era que quem estava
preso ser solto. Estavam sendo torturados. Quem estar preso quer a liberdade, mas
quem vai protestar nem sempre consegue, começa a irritar e indispõe as pessoas. Nós
falamos muito em diálogo mas nem sempre falamos em diálogo com todos, falamos de diálogo
com as pessoas que concordam conosco. Se soubessem, eu não teria feito o bem a muitas
pessoas”.
Com a morte do cardeal Araújo Sales, permanecem apenas dois
cardeais criados por Paulo VI: o brasileiro Paulo Evaristo Arns, 90 anos, arcebispo
emérito de São Paulo; e William Baum, 85 anos, dos Estados Unidos, arcebispo emérito
de Washington. O Colégio Cardinalício compõe-se agora de 208 purpurados, dos quais
121 eleitores e 87 que completaram já 80 anos.