Cidade
do Vaticano (RV) - No âmbito da semana que marca o início do VII Encontro Mundial
das Famílias, o Programa Brasileiro prossegue sua série de aprofundamentos abrangendo
os desafios que a instituição familiar encontra na realidade japonesa. Com o nosso
colaborador Pe. Olmes Milani, analisamos a questão a partir do ponto de vista de um
missionário escalabriniano que vive de perto as carências espirituais e as lacunas
da Igreja no Japão. Para ouvi-lo, clique acima.
“Amigos e amigas ouvintes
do Programa Brasileiro, tenho o prazer de saudá-los esperando que minhas palavras
os encontrem felizes em suas famílias. Em todas as culturas, o grupo familiar é o
pilar tanto do desenvolvimento individual quanto coletivo. A coesão dos membros de
uma família é a garantia de sucesso na concretização dos planos econômicos e fonte
de satisfação humana. Jantar com pais, improvisar um passeio familiar, inventar uma
festinha surpresa, atualmente, são atividades cada vez mais raras.
Há 22 anos
iniciava o fenômeno dekassegui, com milhares de brasileiros descendentes de imigrantes
japoneses rumo ao Japão, à terra de seus antepassados. No início vinham os homens
sozinhos, com a ideia de trabalhar muito, ganhar uma boa soma de dinheiro para dar
mais conforto às famílias que os esperavam no Brasil. O tempo foi passando e muitos
resolveram trazer também a esposa e filhos. Em muitos casos, foi uma solução, enquanto
em outros comprometeu a coesão familiar. A sociedade industrial e a falta de preparação
para viver nela ocasionaram a desestruturação familiar não só no grupo dos brasileiros,
mas também nos trabalhadores de outras nacionalidades. Enquanto o dinheiro chegava
em abundância durante a bolha econômica, a família passou a ocupar o segundo lugar
nas atenções das pessoas do arquipélago. Na sociedade industrial, voltada para a exportação,
com extensas jornadas de trabalho, venda dos dias de folga, casais trabalhando em
turnos trocados, nas poucas horas livres numa semana, pais e filhos se dispersaram.
O deslumbramento pelo dinheiro levou muitos imigrantes a aceitarem de trabalhar longas
horas extras, caindo vítimas de estresse. As atividades em família ficaram cada vez
mais raras. Nem mesmo os japoneses saíram ilesos. Os bispos da Ásia fizeram uma constatação
de dupla pobreza e afirmaram: “enquanto nos demais países asiáticos as famílias são
pobres de bens materiais, as famílias japonesas se caracterizam pela pobreza espiritual”.
O
sistema de trabalho e escolar não leva em conta os grupos familiares e suas necessidades
de encontro. Os dias de livres são rotativos e nem sempre existe coincidência das
folgas dos cônjuges. Os filhos por sua parte, ao chegar ao Ensino Médio, não podem
estar com a família nos fins de semana por conta da obrigação de participar nas atividades
extraescolares. O tempo para o convívio e partilha em família é mínimo.
Existe
concordância da necessidade de diálogo e o direito ao lazer e descanso em família
para que os pais possam se comunicar com os filhos, explicando sua ausência no lar.
A
experiência de um cônjuge estar aqui e outro no Brasil, ou os dois no Japão e os filhos
no Brasil, foi desastrosa para muitas famílias. As distâncias têm sido a fonte de
discórdias, desconfiança, separações com a consequente interrupção de projetos familiares.
Com tristeza constatamos que muitas famílias de brasileiros e outras nacionalidades
latinas se desfizeram. Além disso, viram a ruína das finanças que haviam sido o motivo
para migrar, causando uma frustração dupla: familiar e financeira.
As igrejas
poderiam exercer um papel muito importante para iluminar a população sobre essa situação.
Como na Ásia, em geral, existe uma grande carência das pastorais, entre elas a Pastoral
Familiar, não vemos muitas ações organizadas para apoiar as famílias. Os missionários,
por iniciativa e sensibilidade próprias, têm organizado encontros de famílias e de
casais, usando suas pregações, boletins e páginas eletrônicas para orientar e conscientizar
as comunidades sobre a família e seus desafios. Através desses meios ressalta-se que
os migrantes saem de suas terras para ganhar dinheiro, mas que é necessário estabelecer
um equilíbrio entre as prioridades, com tempo para a família. Todos desejam uma família
unida, mas com dinheiro apenas, não se consegue.
Por ser a instituição que
forma as consciências e a personalidade, a família deve ser o centro da atenção de
todas as forças da sociedade, inclusive a Igreja.