Rio de Janeiro (RV) - Velada pelas montanhas dos Apeninos e banhada pelas águas
do rio Tibre, encontramo-nos em território italiano, num lugar que, sem dúvida, podemos
considerar um berço de grandes santos: Úmbria de tantas belezas naturais é, também,
um lugar de beleza da fé! Do coração da Itália, ainda hoje, ressoam no mundo católico
as vozes e o exemplo de seus grandes filhos: Ângela de Foligno, José de Leonissa,
Bento de Núrsia, Escolástica sua irmã, Clara e Francisco de Assis, da Úmbria e do
mundo!
Porém, Deus, em sua infinita bondade, quis acrescentar à história de
fé da Úmbria ainda uma mulher que, desde muito cedo apontava sinais de santidade e
que foi gerada em meio a tantas orações e súplicas a Deus, tendo em vista que seus
pais, já de idade avançada, não tinham constituído herdeiros. Assim, no ano de 1381,
a vila de Roca Porena, escondida entre os montes, viu nascer aquela que seria mais
tarde a grande Santa Rita.
Filha de pais pobres, Rita não teve tantas oportunidades
como tiveram alguns conterrâneos seus, porém seus pais levaram a filhinha à riqueza
inapreciável de uma boa educação, fundada nos princípios da fé e da moral cristã.
Desde
criança, a menina Rita demonstrava que a vida é só uma e por isso não pode ser desperdiçada
em busca de tesouros que as traças corroem e a ferrugem destrói. Seu modo de viver
apontava-nos um caminho que deveria ser a regra de todo aquele que foi enxertado na
Videira Verdadeira: nossa vida deve estar a serviço exclusivo de Deus para alcançarmos
o céu!
Se o grande Redentor, um dia ousou resumir toda a lei em apenas um mandamento:
“Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”, não precisaria outra
regra para direcionar a sua vida. Por esta razão, Rita procurava até mesmo fazer,
dos trabalhos domésticos e da obediência aos seus pais, uma expressão de retribuição
ao amor de Deus e, consequentemente, um caminho de amor concreto para com o próximo.
Apesar
de os pais de Rita ficarem felizes pelo modo de vida que esta levava em busca da santidade,
grande foi a contrariedade quando descobriram que sua filha desejava ingressar na
vida religiosa junto às Agostinianas. Por diversos motivos, porém, antes que Rita
viesse a fazer parte da família Agostiniana, muitos sofrimentos, ainda, teria que
passar.
Para fazer a vontade dos pais, contraiu núpcias com o jovem Paulo Ferdinando.
Este, porém, tornou-se um grande algoz, que espancava barbaramente a jovem Rita. Dessa
união nasceram dois filhos que foram praticamente educados só pela mãe, pois o pai
havia sido assassinado quando eles tinham apenas dois anos. Aos quatorze anos de
idade morrem também os filhos, após calorosas súplicas feitas pela mãe, que preferia
perdê-los a vê-los vingar a morte do pai e sujar as mãos com sangue.
A Terra
é com razão chamada de “Vale de lágrimas!” Para todos, a vida é uma luta, é mesmo
“um combate!” Quem poderá contestar que a vida de Rita foi um espinhal de sofrimentos
desde a sua mocidade, a violência sofrida no lar, e o assassinato do esposo, a morte
dos filhos, a recusa inicial de ingressar no Convento após a sua viuvez etc. E mesmo
no Convento, muitos sofrimentos próprios do novo estado de vida que abraçou foram
modelando aquela que se tornaria um dia um dos grandes nomes da Vila de Roca Porena.
Até mesmo a ferida aberta pelo espinho cravado em sua testa foi motivo de grande sofrimento,
tendo em vista o odor desagradável que dele exalava e que, consequentemente, afastava
as pessoas.
O sem fé sofre estoicamente, ou em sua impotência levanta-se contra
o seu destino. Não assim o cristão! Este se acostuma a conhecer a mão de Deus em todos
os lances de sua vida, e mesmo quando não os compreende e por vezes não desejaria
viver, prefere abandonar-se todo inteiro nas mãos do Senhor. Na vida de Rita esse
foi o grande diferencial: abandonar-se nas mãos do Senhor! Com Jesus, a Terra deixa
de ser um vale de lágrimas sem sentido e passa a ser caminho de “conformação da própria
vida com a vida de Cristo crucificado”.
Após percorrer a sua via dolorosa,
aos 22 de maio de 1457, o Senhor quis colher do jardim, que é a Igreja, a sua preciosa
rosa. O Monastério de Santa Maria Madalena, em Cássia, entregava a Deus e ao mundo
uma das suas mais belas flores – Rita de Cássia agora pertencia ao mundo!
A
devoção à bem-aventurada da Vila de Cássia rapidamente se estendeu sobre toda a Itália,
chegando posteriormente a Portugal e Espanha, onde, por causa dos milagres obtidos
por sua intercessão, o povo lhe deu o nome de “Santa das causas impossíveis”. Sua
beatificação se deu em 1628, pelo papa Urbano VIII, e foi, enfim, canonizada em maio
de 1900, pelo Papa Leão XIII.
No Brasil, tendo em vista o grande patrimônio
religioso herdado dos portugueses, a devoção a Santa Rita chegou muito cedo. Por meio
de um indulto do Papa Bento XIII, antes mesmo da canonização e 99 anos após a beatificação,
construiu-se o primeiro templo dedicado à Bem-Aventurada no Rio de Janeiro, o primeiro
das Américas. Hoje, são inúmeros os santuários, paróquias, comunidades dedicadas a
Santa Rita em solo brasileiro, uma expressão da grande popularidade, amor e devoção
da irmãzinha de Cássia que subiu à honra dos altares.
Enfim, o que fez essa
mulher para se tornar tão amada por uma numerosa multidão de pessoas nas mais diferentes
épocas e nações? O que podemos aprender com Santa Rita? Rita abandonou-se em Deus
e Ele fez “o tudo” nela. Sua vida de entrega a Deus apontou para todos nós o caminho
para o céu. Caminho este que é o da oração, jejum, mortificação dos próprios desejos,
confiança em Deus, amor à Virgem Maria que desde criança Rita nutria, busca dos sacramentos
e contemplação da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas não uma contemplação passiva
como quem observa de fora, mas uma contemplação vivencial de quem quer trilhar a vida
junto a Jesus.
Não perder de vista o Cristo Crucificado é o grande ensinamento
de Santa Rita para todos nós. Que todos nós possamos, no matrimônio ou na vida religiosa,
caminhar sempre ir com Cristo, pois Ele jamais nos decepciona.
Santa Rita
de Cássia, rogai por nós!
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ