Aparecida: bispos ressaltam "dívida social imensa" do Brasil com os povos indígenas
Aparecida (RV) - “Temos uma dívida social imensa com os povos indígenas pelos
massacres, genocídios, inomináveis crueldades e injustiças praticadas ao longo destes
512 anos de invasão e extermínio”, disse dom Édson Tasquetto Damian, bispo de São
Gabriel da Cachoeira (AM), presidente da celebração eucarística realizada no Santuário
Nacional de Aparecido neste segundo dia da 50a. Assembleia dos Bispos da CNBB.
Dom
Damian é bispo na diocese onde 90% da população é formada por povos indígenas e trabalha
em profunda sintonia com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), um dos organismos
vinculados à CNBB com atuação reconhecida na história recente do Brasil. Ele lembrou
da fundação do Conselho e destacou: “o seu início, é marcada pelo testemunho dos mártires.
Lembro apenas alguns: Pe Rodolfo Lukenbein, Simão Bororo, Pe João Bosco Penido Burnier,
Ângelo Pereira Xavier, cacique Pancaré, Ângelo Kretã, líder dos Kaingang, Marçal Tupã-y,
líder Guarani que saudou o papa João Paulo II quando visitou o Brasil em 1980, Ir
Cleusa Rody Coelho, Pe Ezechiel Ramin, Ir Jesuíta Vicente Cañas. Xicão Xucuru, Galdino
de Jesus, queimado vivo por um bando de jovens em Brasília, Cacique Nísio Gomes Guarani
Kaiowá, o último que foi assassinado, em novembro do ano passado, no Mato Grosso do
Sul”.
O CIMI tem 40 anos de existência que foram comparados por dom Damian,
durante a homilia, como “o tempo em que o povo hebreu andou pelo deserto rumo à Terra
Prometida e ajudam a manter viva a esperança dos povos indígenas que aguardam o processo
de demarcação de 335 territórios e de outros 348 que ainda estão em fase de reivindicação”.
O bispo de São Gabriel da Cachoeira manifestou seu apreço pelas comunidades indígenas
“Sempre me encanto com estes irmãos. Apesar de uma vida dura e penosa nunca perdem
a alegria e a fé que se expressam no sorriso límpido, espontâneo, cativante. Quando
adoecem demoram até uma semana, nas frágeis embarcações com motor de ‘rabeta’, para
serem transportados a São Gabriel, debaixo de sol abrasador ou de chuva torrencial.
Dizia-me um médico que muitos chegam tão debilitados que se torna muito difícil ou
até impossível o tratamento”.
Dom Damian, diante dos mais de 340 bispos reunidos
em Aparecida, compartilhou uma experiência vivida com o Papa Bento XVI. Ele contou
que na visita “ad limina”de 2010, ficou surpreso com duas perguntas feitas pelo Papa.
A primeira: “O povo da sua região está destruindo a floresta?” Dom Damian disse que
teve a alegria de informá-lo “que na bacia do Rio Negro apenas 4% das florestas foram
derrubadas, ao passo que em alguns Estados da Amazônia elas já foram totalmente destruídas
pela ganância avassaladora das madeireiras, do agronegócio e das hidrelétricas. D.
Erwin Kräutler, nosso presidente do CIMI, não se cansa de denunciar a grande destruição
e os minguados resultados da faraônica hidrelétrica de Belo Monte. Os índios são nossos
mestres na preservação ambiental e no desenvolvimento sustentável. “Nossa vida depende
da vida da floresta”, costumava dizer nossa mártir Ir Doroty Stang.
A segunda
pergunta feita por Bento XVI foi: “Os índios são bons católicos. Eles se confessam?”
Dom Damian respondeu: “Todos, se confessam, desde as crianças que há pouco fizeram
a Eucaristia até aos mais idosos. E com um detalhe original. A maioria começa dizendo:
‘Agora vou me confessar na minha língua’. Continua contando dom Damian dizendo que
o Papa reagiu e o indagou: “E você entende todas as línguas?” E o bispo respondeu:
“De que jeito, respondi. São 18 línguas e tão diferentes umas das outras. Mas quem
perdoa é o Pai que criou todos os povos e culturas e Ele se entende muito bom com
seus filhos prediletos. Assim a boa nova das culturas indígenas acolhe a Boa nova
de Jesus”.
Antes de terminar a homilia, o bispo de Sao Gabriel da Cachoeira
fez um agradecimento: “Agradeço, de coração, a todos os que, com generosidade e abnegação,
se dedicam à causa indígena como uma causa do Reino, às missionárias e missionários
do CIMI, às dioceses e seus agentes de pastoral, às congregações religiosas, enfim,
a todos os que vivem ‘em estado de missão inculturada e se empenham para que nossa
Igreja se torne realmente morada de povos irmãos e, assim também, casa dos povos
indígenas”.