Missão na África: as experiências de um bispo brasileiro
Cidade
do Vaticano (RV) – África. Guiné-Bissau. País-irmão do Brasil. Bafatá, interior
do país que, oficialmente, é um dos que falam a língua portuguesa mas nem sempre é
fácil de entender. E este é só um dos inúmeros desafios de ser missionário por lá,
como relata o bispo brasileiro Dom Cláudio Zilli.
– Para o missionário que
chega, sem dúvida a língua é o primeiro desafio. Aí, alguém no Brasil diz: mas você
é brasileiro! Sim, saber o português não é pouco, mas depois é preciso estudar o crioulo
– que é parecido – mas não é o português. Existem ainda as línguas étnicas que são
muito difíceis de aprender mesmo já que nada têm a ver com o português ou com o crioulo.
Por isso, a comunicação é uma coisa difícil. São culturas diferentes. Na verdade,
Brasil e África têm muita coisa em comum por causa da história, dos africanos que
foram para o Brasil, mas mesmo assim há muitas diferenças culturais, sensibilidades
diferentes de uma pessoa que chega mas, também, mesmo entre as pessoas de lá, uma
etnia é um pouco diferente da outra. Mas essa questão cultural, que é uma beleza,
é uma grande riqueza também traz consigo algumas dificuldades. Outra dificuldade é
a economia. Eu sempre digo que na Guiné-Bissau as nossas crianças não são como aquelas
que aparecem na TV, magrinhas, tem também, claro, mas é a pobreza o maior desafio. É
quase habitual chegar uma pessoa às 4 da tarde e dizer: “hoje eu não comi porquê não
tinha nada para comer”. Ou faltam medicamentos e não há dinheiro, pedem ajuda. A questão
econômica é muito séria. É importante que, como Igreja, temos procurado trabalhar
dentro dos nossos limites. E têm os próprios limites internos da Igreja: muitas pessoas
procuram o Batismo, querem ser batizadas. Mas, depois, como acontece um pouco por
toda a parte, às vezes vivem um cristianismo um pouco superficial e nem sempre conseguimos
um aprofundamento. Mas é claro que também existem muitas riquezas, apesar de todos
os desafios.
Faz muitos anos que Dom Zilli está longe de casa. Mas para o missionário,
o que significa “casa”?
– Eu cheguei na Guiné-Bissau como missionário do PIME
(Pontíficio Instituto para as Missões Estrangeiras) em 1985. Como bispo na Diocese
de Bafatá, desde 2001, quando foi criada. Mas o lugar em que a pessoa nasceu, onde
a pessoa tem uma família, restará sempre uma referência. Isso, sem dúvida. E quando
vou ao Brasil eu me sinto bem, verdadeiramente me sinto em casa. Procuro acompanhar,
principalmente agora com a internet, aquilo que está acontecendo no Brasil, na política,
na sociedade, na Igreja. E quando vou, gosto muito de estar lá. Mas quando faltam
três dias para voltar para a Guiné eu sinto que é tão difícil deixar a casa, a mãe,
o pai e os familiares mas eu me encontro muito bem na Guiné-Bissau, afinal já quase
metade da minha vida é guineense. E quando volto para a Guiné, mesmo vindo do Brasil,
tenho o sentimento de estar voltando para casa. Aliás, quando eu fui nomeado bispo
em 2001 eu estava no Brasil. Eu fiquei na Guiné de 1985 até 1998. E quando eu voltei
uma senhora de Bafatá me disse uma coisa tão bonita: “é um filho que torna a casa”.
E aquilo me fez tão bem e me faz tão bem ainda hoje. Nunca me senti tão em família
depois daquela frase daquela senhora. É bom estar no Brasil, mas também é bom estar
na Guiné-Bissau!