2012-01-31 12:42:20

Seca no RS: as dificuldades dos pequenos agricultores


Porto Alegre (RV) - Um Estado com forte vocação agrícola, onde grandes e pequenos produtores têm um papel importante na economia. As terras férteis do Rio Grande do Sul, aliado ao clima favorável, sempre produziram safras recordes de produção. Mas nos últimos meses, os fenômenos meteorológicos “La Ninã” e a “Zona de Convergência do Atlântico Sul” passaram a influenciar este cenário.

O primeiro, que é o esfriamento das águas do Oceano Pacífico, intensificou o segundo; o calor e a umidade da floresta amazônica provocam o aumento do volume de chuvas nas regiões Centro-Oeste e Sudeste do Brasil. E como explica o meteorologista Alexandre Nascimento, em entrevista ao site Climatempo, a consequência é a ausência de chuva para os gaúchos.

Não é a primeira vez que a estiagem atinge de forma tão grave a região. Na passagem de 2004 para 2005 a seca causou grandes prejuízos imediatos na agropecuária, e em médio prazo também provocou uma desaceleração econômica no setor industrial e comercial, com o aumento do desemprego no estado. Seis anos depois, tudo parece se repetir.

Mas a seca para os gaúchos é um pouco diferente daquela vivida quase constantemente no Nordeste brasileiro, como testemunha o economista Dilson Trennepohl, da Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul (Unijuí). Ele avalia que a diferença básica é a irregularidade do fenômeno na região. “Vivi por dois anos na Paraíba e conheci bem o que significa a seca por lá. Aqui no Rio Grande do Sul, as estiagens perduram por 60, 80 ou 90 dias, quando ocorrem apenas pancadas de chuva localizadas”. Hoje vivendo na cidade de Ijuí, ele avalia que é exatamente por isso que a estiagem na região sempre é considerada inesperada.

De acordo com a Defesa Civil, mais de 60% dos municípios do estado decretaram situação de emergência. Em algumas cidades, foi necessário o racionamento de água. Em pequenos municípios onde represas e açudes secaram, foi preciso fazer o abastecimento por meio de caminhões-pipa. A água, que era armazenada no período de chuva, acabou rápido. “Como as estiagens são pouco previsíveis, não existe o hábito de consumir menos água durante o período de seca” - lembra Trennepohl.

Na região de Bagé (RS), nos 47 hectares onde estão assentadas mais de duas mil famílias, a seca foi muito grave. O drama humano surge do fracasso da colheita. “A alternativa é a busca de empregos temporários longe de casa para sustentar a família neste período crítico” - conta Frei Wilson Zanata, que reside em um assentamento no município de Hulha Negra.

Ele destaca que a seca deste ano é mais grave, uma vez que a safra anterior também foi comprometida com a estiagem. “A falta de chuva normalmente acontece na época do plantio, início de novembro até fevereiro. O começo de 2011 foi mais grave, pois a seca se prorrogou até o final do mês de março”. O religioso recorda que foram cinco meses em que tudo se perdeu.

Frei Zanatta integra uma comunidade intercongregacional, com franciscanos, capuchinhos e carlistas, inserida neste assentamento. A preocupação agora vai além da falta de chuva, mas na busca por alternativas para minimizar efeitos em uma próxima estiagem. “Estudamos a possibilidade concreta de construção de açudes, barragens, pois esta região é muito chuvosa no período de inverno” - explica o religioso, que completa: “O que está faltando é investimento dos governos para os agricultores poderem irrigar a terra. As terras são férteis, falta apenas água para se ter boa produção”.

Com a experiência da seca de 2005 e 2011, muitos agricultores já estavam preparados para uma nova estiagem, explica Trennepohl. “Houve quem fez a reorganização de suas unidades de produção, diversificando atividades, construindo sistemas comunitários de abastecimento de água”. Ele avalia que as obras de maior impacto não foram executadas, e que se criou certa mistificação quanto à possibilidade de combater a seca. “Ideias mirabolantes como armazenar a água do período de chuvas para irrigar as lavouras durante a estiagem continuam encantando certas lideranças, embora não tenham viabilidade técnica ou econômica” - avalia.

Ele explica que existem mecanismos de proteção para os produtores rurais, em relação a possíveis perdas na safra. “O programa de seguro agrícola cobre as perdas das lavouras atingidas e serve para quitar os financiamentos realizados”. Mas como não é comum a seca na região, muitos agricultores optam por não pagar o prêmio do seguro – o que lhes reduz o custo nos anos de boa colheita – e ficam sem cobertura nos imprevisíveis anos ruins, de quebra de safra. Porém, o economista lembra que os grandes produtores estão bem capitalizados, pois os últimos anos foram de boas safras em toda a região.

Realidade distinta, porém, é a dos pequenos produtores assentados em Hulha Negra. Frei Zanatta relata que os pequenos agricultores estão impossibilitados de saldar as suas dívidas com os bancos, uma vez que as dívidas foram aumentando e o crédito foi desaparecendo. Ele afirma que a maior parte dos assentados está sem poder financiar há mais de cinco anos. “Agora, parece surgir uma luz no fim do túnel, com as negociações das dívidas, para poder voltar novamente a financiar e viabilizar a agricultura familiar”, afirma o religioso, preocupado com os pequenos produtores. “Quem possui dois, três hectares de terra, perde tudo na estiagem e agora não tem como se sustentar. E isso está na nossa pauta de conversa com o governo”.

O Ministério da Integração Nacional acena com o repasse de R$ 8,6 milhões para implementar o Plano Estadual de Irrigação, em parceria com o governo do estado. Para a Emater (RS), os prejuízos com a seca já estão em torno de R$ 2,89 bilhões. Já a previsão do tempo é de que as chuvas devem continuar abaixo da média, até o final de março. (DJ-CNBB)








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