Trabalho escravo, realidade ainda presente no Brasil
Cidade
do Vaticano (RV) - Sábado, dia 28, o Brasil comemora o Dia de Combate ao Trabalho
Escravo, data que recorda o assassinato de quatro funcionários do Ministério do Trabalho,
quando, em 2004, apuravam denúncia de trabalho escravo na zona rural de Unaí (MG).
A data foi oficializada em 2009, no entanto, essa luta é mais antiga. Desde
o início da década de ‘70, a Igreja no Brasil, com Dom Pedro Casaldaliga, e a Comissão
Pastoral da Terra (CPT), tem denunciado a utilização do trabalho escravo na abertura
das novas fronteiras agrícolas do país.
A CPT foi pioneira no combate ao trabalho
escravo e levou a denúncia até a Organização das Nações Unidas (ONU), o que permitiu
que o Governo fosse, de certa forma, réu, em um processo sobre a existência de trabalho
escravo. Com isso, o Estado se comprometeu em criar uma estrutura de combate a esse
crime em território brasileiro.
O assessor da Comissão Episcopal Pastoral
para o Serviço da Caridade, Justiça e da Paz, Padre Ari Antônio dos Reis, conta que
em 2009, houve uma reunião de entidades da sociedade civil, governamentais e da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), onde se discutiram mecanismos para potencializar
o combate e a prevenção do trabalho escravo, traçando estratégias de inclusão social,
em condições de trabalho dignas, dos trabalhadores vitimados.
Publicada em
1967, a Carta encíclica ‘Populorum progressio’ do Papa Paulo VI sobre o desenvolvimento
dos povos traz a seguinte definição de trabalho:
“Deus, que dotou o
homem de inteligência, de imaginação e de sensibilidade, deu-lhe assim o meio para
completar, de certo modo, a sua obra: ou seja artista ou artífice, empreendedor, operário
ou camponês, todo o trabalhador é um criador. Debruçado sobre uma matéria que lhe
resiste, o trabalhador imprime-lhe o seu cunho, enquanto para si adquire tenacidade,
engenho e espírito de invenção. Mais ainda, vivido em comum, na esperança, no sofrimento,
na aspiração e na alegria partilhada, o trabalho une as vontades, aproxima os espíritos
e solda os corações: realizando-o, os homens descobrem que são irmãos”.
Para
o atual representante do Vaticano na Organização Internacional do Trabalho (OIT),
arcebispo Silvano Tomasi, a ideia de trabalho digno leva a pensar nas pessoas não
suficientemente qualificadas para acompanhar o “trem da globalização”: dezenas de
milhões de imigrantes sem documentos que trabalham na agricultura, nas fábricas, no
serviço doméstico; mulheres da indústria têxtil, que trabalham em condições insalubres
por míseros salários; trabalhadores etiquetados pela raça, casta ou credo, relegados
a trabalhos marginais da sociedade”.
Já de acordo com a Organização Internacional
do Trabalho (OIT), condições precárias como falta de alojamento, água potável e sanitários,
a condição de muitos trabalhadores de assumir dívidas crescentes e intermináveis definem
a situação de “trabalho escravo”.
No Brasil, a Proposta de Emenda Constitucional
(PEC) 438 é considerada um dos projetos mais importantes de combate à escravidão,
tanto pelo forte instrumento de repressão que pode criar, como pelo seu simbolismo,
pois revigora a importância da função social da terra, já prevista na Constituição.
Entretanto,
persistem alguns desafios para o Estado, a Igreja e a sociedade civil, voltados na
perspectiva de enfrentamento e superação desta situação. Destacam-se a fiscalização
eficiente, a mobilização social contra esta prática, a reforma agrária, superação
da miséria. A impunidade, ainda constante, precisa ser combatida.
Outra
organização internacional é o Conselho Econômico e Social, com sede em Nova Iorque.
Lá, o arcebispo Celestino Migliore, em nome da Santa Sé, defende que uma boa sociedade
é aquela na qual todos se beneficiam do bem comum e ninguém é deixado de fora do interesse
comum. Políticas econômicas que ajudam as pessoas trabalhadoras de baixa renda a viver
dignamente, ter vidas dignas, deveria ser uma prioridade de qualquer boa sociedade
digna do nome.
Todos estes aspectos são essenciais na resposta às necessidades
das pessoas que buscam um emprego digno e oportunidades para saírem da pobreza e evitarem
a marginalização, a exploração e a desintegração social.
Voltando à Encíclica
Populorum Progressio, “o trabalho só é humano na medida em que permanecer inteligente
e livre”.