2011-11-25 10:18:50

Realidade e Miragem


Jales (RV) - Com este domingo, iniciamos um novo tempo litúrgico, que vai nos levar à celebração do Natal. Na verdade, para a liturgia, começa um novo ano, ao longo do qual celebramos os diferentes enfoques do mistério de Cristo.

Na passagem de um ano para o outro, aparece com insistência o enfoque relativo ao fim dos tempos, culminando com a aparição gloriosa do Senhor julgando as nações de toda a terra.

Como as cenas se referem a um tempo meta-histórico, para se referir a elas se usa um gênero literário próprio, denominado “escatológico”, pois trata dos “últimos tempos”, como sugere a palavra grega “éscaton”.

Aí reside o desafio. Mesmo usando uma linguagem com evidente carga de fantasia, resulta uma descrição muito semelhante aos fatos reais, que a história pode comprovar. Então, precisamos discernir o que tem consistência histórica, e o que é “escatológico”, usado intencionalmente para se referir a fatos que não cabem dentro do contexto da realidade humana.

Um exemplo bem claro encontramos nos evangelhos, quando trazem as profecias de Cristo sobre o fim do mundo. Usam a destruição histórica de Jerusalém, acontecida no ano 70 de nossa era, para com ela descrever, de maneira aproximada, a destruição final do mundo.

Assim, um fato histórico, a destruição de Jerusalém por Tito, serve de moldura para imaginar o fim do mundo. O que devemos fazer? Separar os fatos das fantasias.

Quando o evangelho relata o cerco de Jerusalém, se refere a fatos da história: “Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, ficai sabendo que sua destruição está próxima.. Então, os que estiverem na Judéia, fujam para as montanhas, os que estiverem na cidade, afastem-se dela” (Lucas, 21, 20...). Esta parte tem clara conotação histórica, e aconteceu de fato, quando o exército romano devastou complemente a cidade de Jerusalém. .

Mas logo em seguida, o evangelho envereda para o gênero literário escatológico, ao advertir que “haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas...(Lc 21, 25..). Aí já é fantasia. Por mais que imaginemos o bonito espetáculo da ciranda das estrelas dançando com o sol e a lua como prelúdio do fim do mundo, sabemos que é uma linguagem figurada, aliás muito solene e bonita, mas que remete para uma realidade que não conseguimos expressar adequadamente por palavras humanas.

Talvez ajude uma comparação. Quando olhamos para uma cadeia de montanhas, as primeiras à nossa frente podem ser bem dimensionadas em seu tamanho real. As que estão no fundo, podem até parecer menores, mas se sobressaem às primeiras, é porque são maiores do que elas.

Para falar de um assunto maior, usamos realidades menores.

Como o assunto é tão recorrente nestes dias, até o fim do mundo nos ajuda a situar melhor as questões relativas ao Código Florestal. Há algumas “montanhas” à nossa frente, isto é, algumas constatações evidentes, que precisamos dimensionar bem, para termos uma idéia mais aproximada do tamanho da questão. Por exemplo: as terras usadas para agricultura, no Brasil, representam só 38% do território nacional. Portanto, 62% do território nacional nem é atingido pela agricultura! E mais: dos 38% das terras agricultáveis, só 27% são usadas pelos pequenos agricultores, que representam 88% dos estabelecimentos rurais. 12% das propriedades, neste país de histórica concentração fundiária, ocupam 73% das terras agricultáveis.

Os que insistem em achar que provocamos o fim do mundo se o Código Florestal garante aos pequenos agricultores uma proteção especial, para viabilizar sua importante função de proteger o meio ambiente e de produzir alimentos, não está se dando conta da finalidade do Código Florestal, e demonstra não distinguir a realidade da fantasia.

A sobrevivência dos pequenos agricultores não é um risco para o meio ambiente, mas uma garantia de que a natureza será bem cuidada, e a terra será fecunda para a vida de todos.

D. Demetrio Valentini
Jales (SP)








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